11 de set. de 2016

Amar :: Carlos Drummond de Andrade



Que pode uma criatura senão,

Entre criaturas, amar?

Amar e esquecer, amar e malamar,

Amar, desamar, amar?

Sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,

Sozinho, em rotação universal, senão

Rodar também, e amar?

Amar o que o mar traz à praia,

O que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,

É sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,

O que é entrega ou adoração expectante,

E amar o inóspito, o áspero,

Um vaso sem flor, um chão de ferro,

E o peito inerte, e a rua vista em sonho,

E uma ave de rapina.

Este o nosso destino: Amor sem conta,

Distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,

Doação ilimitada a uma completa ingratidão,

E na concha vazia do amor à procura medrosa,

Paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor,

E na secura nossa, amar a água implícita,

E o beijo tácito, e a sede infinita.

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