15 de mar. de 2015

Avó de José Saramago



Tu estavas, avó, sentada na soleira da tua porta, aberta para a noite estrelada e imensa, para o céu de que nada sabias e por onde nunca viajarias, para o silêncio dos campos e das árvores assombradas, e disseste, com a serenidade dos teus noventa anos e o fogo de uma adolescência nunca perdida: «O mundo é tão bonito e eu tenho tanta pena de morrer.» Assim mesmo. Eu estava lá.
[...]
Entre os bacorinhos acabados de nascer aparecia de vez em quando um ou outro mais débil que inevitavelmente sofreria com o frio da noite, sobretudo se era Inverno, que poderia ser-lhe fatal. No entanto, que eu saiba, nenhum desses animais morreu. Todas as noites, meu avô e minha avó iam buscar às pocilgas os três ou quatro bácoros mais fracos, limpavam-lhes as patas e deitavam- nos na sua própria cama. Aí dormiriam juntos, as mesmas mantas e os mesmos lençóis que cobririam os humanos cobririam também os animais, minha avó de um lado da cama, meu avô no outro, e, entre eles, três ou quatro bacorinhos que certamente julgariam estar no reino dos céus.
[...]

José Saramago em As pequenas Memórias

Ivan Rabuzin (1921 – 2008) Kljuc, Croatia

Árvore verde,  
Meu pensamento 
Em ti se perde. 
Ver é dormir 
Neste momento.

Fernando Pessoa 










14 de mar. de 2015

Marcelo Chechik




























Vitória-régia :: Clarice Lispector

Walter Hood Fitch circa 1847
Vitória-régia está no Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Enorme até quase dois metros de diâmetro. Aquáticas, é de se morrer delas. Elas são o amazônico dinossauro das flores. Espalham grande tranquilidade.
A um tempo majestosas e simples. E apesar de viverem no nível das águas elas dão sombras.
In: Água viva. 

13 de mar. de 2015

Violeta del Carmen Parra (4 de outubro 1917 (San Fabián de Alico, en el sur de Chile - 5 de fevereiro de 1967)









Obrigada à vida
que me deu tanto
Deu-me a risada
e deu-me o pranto
assim distingo
felicidade de fraqueza
os dois materiais que formam meu canto
o canto de todos que é mesmo canto
o canto de todos que é meu próprio canto
Obrigada à vida!
........................
Gracias a la vida que me ha dado tanto
Me ha dado la risa y me ha dado el llanto
Así yo distingo dicha de quebranto
Los dos materiales que forman mi canto
Y el canto de ustedes que es el mismo canto
Y el canto de todos que es mi propio canto
Gracias a la vida, gracias a la vida

Uma imagem de prazer :: Clarice Lispector

     Conheço em mim uma imagem muito boa, e cada vez que eu quero eu a tenho, e cada vez que ela vem ela aparece toda. É a visão de uma flor...