7 de abr. de 2012

Ciranda da Bailarina de Chico Buarque


Antonio Canova (1757–1822) 


Procurando bem

Todo mundo tem pereba

Marca de bexiga ou vacina
E tem piriri, tem lombriga, tem ameba
Só a bailarina que não tem
E não tem coceira
Verruga nem frieira
Nem falta de maneira
Ela não tem

Futucando bem

Todo mundo tem piolho

Ou tem cheiro de creolina
Todo mundo tem um irmão meio zarolho
Só a bailarina que não tem
Nem unha encardida
Nem dente com comida
Nem casca de ferida
Ela não tem

Não livra ninguém

Todo mundo tem remela

Quando acorda às seis da matina
Teve escarlatina
Ou tem febre amarela
Só a bailarina que não tem
Medo de subir, gente
Medo de cair, gente
Medo de vertigem
Quem não tem

Confessando bem

Todo mundo faz pecado

Logo assim que a missa termina
Todo mundo tem um primeiro namorado
Só a bailarina que não tem
Sujo atrás da orelha
Bigode de groselha
Calcinha um pouco velha
Ela não tem

O padre também

Pode até ficar vermelho

Se o vento levanta a batina
Reparando bem, todo mundo tem pentelho
Só a bailarina que não tem
Sala sem mobília
Goteira na vasilha
Problema na família
Quem não tem

Procurando bem

Todo mundo tem...

6 de abr. de 2012

Dez



Pequenas ternuras de Paulo Mendes de Campos


“Quem coleciona selos para o sobrinho; quem acorda de madrugada e estremece no desgosto de si mesmo ao lembrar que há muitos anos feriu a quem amava; quem chora no cinema ao ver o reencontro de pai e filho; quem segura sem temor uma largatixa e lhe faz com os dedos uma carícia; quem se se detém no caminho para contemplar a flor silvestre; quem se ri das próprias rugas ou de já não agüentar subir uma escada como antigamente; quem decide aplicar-se ao estudo de uma língua morta depois de um fracasso amoroso; quem procura numa cidade os traços da cidade que passou, quando o que é velho era frescor e novidade; quem se deixa tocar pelo símbolo da porta fechada; quem costura roupas para os lázaros; quem envia bonecas às filhas dos lázaros; quem diz a uma visita pouco familiar, já quebrando a cerimônia com um início de sentimento: " Meu pai só gostava de sentar-se nessa cadeira”; quem manda livros para os presidiários; quem ajuda a fundar um asilo de órfãos; quem se comove ao ver passar de cabeça branca aquele ou aquela, mestre ou mestra, que foi a fera do colégio; quem compra na venda verdura fresca para o canário; quem se lembra todos os dias de um amigo morto; quem jamais negligencia os ritos da amizade; quem guarda, se lhe derem de presente, a caneta e o isqueiro que não mais funcionam; quem, não tendo o hábito de beber, liga o telefone internacional no segundo uísque para brincar com amigo ou amiga distante; quem coleciona pedras, garrafas e folhas ressequidas; quem passa mais de quinze minutos a fazer mágicas para as crianças; quem guarda as cartas do noivado com uma fita; quem sabe construir uma boa fogueira; quem entra em ligeiro e misterioso transe diante dos velhos troncos, dos musgos e dos liquens; quem procura decifrar no desenho da madeira o hieróglifo da existência; quem não se envergonha da beleza do pôr-do-sol ou da perfeição de uma concha; quem se desata em riso à visão de uma cascata; quem não se fecha à flor que se abriu de manhã; quem se impressiona com as águas nascentes, com os transatlânticos que passam, com os olhos dos animais ferozes; quem se perturba com o crepúsculo; quem visita sozinho os lugares onde já foi feliz ou infeliz; quem de repente liberta os pássaros do viveiro; quem sente a pena da pessoa amada e não sabe explicar o motivo; quem julga perceber o “pensamento” do boi e do cavalo; todos eles são presidiários da ternura e, mesmo aparentemente livres como os outros, andarão por toda parte acorrentados, atados aos pequenos amores da grande armadilha terrestre”.

Paulo Mendes Campos. “O amor acaba” – crônicas líricas e existenciais. RJ, Civilização Brasileira, 2001.

4 de abr. de 2012

Philippe Halsman, fotógrafo

 Audrey Hepburn, 1955

Brigitte Bardot, 1951

 Grace Kelly, 1959


 Janet Leigh, 1951

 Lena Horne, 1954

 Marilyn Monroe and Philippe Halsman, 1954

                                                                                          Sophia Loren, 1959


                                                                                                 Edward Villela, 1961

Philippe Halsman nasceu na Letonia em 1906, e começou sua carreira fotográfica em Paris no início dos anos 30. Emigrou para Nova York, no outono de 1940. Logo se tornou um dos fotógrafos mais importantes da América. Morreu em 1979.

Da nossa semelhança com os deuses - Fernando Pessoa ( Ricardo Reis )

Por nosso bem tiremos
Julgarmo-nos deidades exiladas
E possuindo a Vida
Por uma autoridade primitiva
E coeva de Jove.
Altivamente donos de nós-mesmos,
Usemos a existência
Como a vila que os deuses nos concedem
Para esquecer o Estio.
Não de outra forma mais apoquentada
Nos vale o esforço usarmos
A existência indecisa e afluente
Fatal do rio escuro.
Como acima dos deuses o Destino
É calmo e inexorável,
Acima de nós-mesmos construamos
Um fado voluntário

Que quando nos oprima nós sejamos
Esse que nos oprime,
E quando entremos pela noite dentro
Por nosso pé entremos.
30-7-1914
Odes de Ricardo Reis . Fernando Pessoa. (Notas de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa: Ática, 1946 (imp.1994).  - 40.

Bela-emília, plumbago, jasmim-azul, dentilária





Nome Científico: Plumbago auriculata
Sinonímia: Plumbago capensis
Nome Popular: Bela-emília, plumbago, jasmim-azul, dentilária
Família: Plumbaginaceae
Divisão: Angiospermae
Origem: África do Sul
Ciclo de Vida: Perene

Planta muito versátil e rústica, a bela-emília é largamente utilizada no paisagismo. Arbustiva e muito ramificada presta-se para cercas-vivas e pode ser tutorada como trepadeira. Suas flores são delicadas em forma de pequenos buquês. É mais comum encontrarmos espécimes de flores azuladas embora exista uma variedade de flores brancas.
Deve ser cultivada sempre a pleno sol; isolada, em conjuntos ou como cerca-viva. Não é muito exigente em fertilidade e pode-se renovar a folhagem e estimular a floração com podas regulares. Multiplica-se por estacas, mergulhia e sementes e é tolerante ao frio.
fonte: http://www.jardineiro.net

3 de abr. de 2012

Olinda de Carlos Pena Filho (1929/1960)

Lucy Passos
De limpeza e claridade
é a paisagem defronte. 
Tão limpa que se dissolve 
A linha do horizonte. 

As paisagens muito claras 
Não são paisagens, são lentes. 
São íris, sol, aguaverde 
Ou claridade somente. 

Olinda é só para os olhos, 
Não se apalpa, é só desejo. 
Ninguém diz: é lá que eu moro 
Diz somente: é lá que eu vejo.

2 de abr. de 2012

Vivian Maier, fotógrafa









Vivian Maier, nascida dia 1 de Fevereiro de 1926 em Nova Iorque e falecida dia 21 de abril de 2009 com 83 anos. Apesar de americana ela cresceu na França, cujo local exato ainda é desconhecido. O que mais chamou a atenção da mídia é que ela foi babá durante 40 anos. Trabalhou também para um casal de Chicago, durante 14 anos.  

Estás só. Ninguém o sabe. Cala e finge. Fernando Pessoa

Mas finge sem fingimento.
Nada esperes que em ti já não exista,
Cada um consigo é triste.
Tens sol se há sol, ramos se ramos buscas,
Sorte se a sorte é dada.
6-4-1933
Odes de Ricardo Reis . Fernando Pessoa. Lisboa: Ática, 1946 (imp.1994).  - 152.

Azaléia






1 de abr. de 2012

Valsa brasileira de Edu Lobo e Chico Buarque


Vivia a te buscar
Porque pensando em ti
Corria contra o tempo
Eu descartava os dias
Em que não te vi
Como de um filme
A ação que não valeu
Rodava as horas pra trás
Roubava um pouquinho
E ajeitava o meu caminho
Pra encostar no teu

Subia na montanha
Não como anda um corpo
Mas um sentimento
Eu surpreendia o sol
Antes do sol raiar
Saltava as noites
Sem me refazer
E pela porta de trás
Da casa vazia
Eu ingressaria
E te veria
Confusa por me ver
Chegando assim
Mil dias antes de te conhecer
http://letras.terra.com.br/chico-buarque/45185/

Orquídea-amor-perfeito, Miltoniopsis






31 de mar. de 2012

Aguardo, equânime, o que não conheço — Fernando Pessoa


Aguardo, equânime, o que não conheço —
Meu futuro e o de tudo.
No fim tudo será silêncio, salvo
Onde o mar banhar nada.

Odes de Ricardo Reis . Fernando Pessoa. Lisboa: Ática, 1946 (imp.1994). - 156.

30 de mar. de 2012

Duy Huynh, pintor vietnamita






São Francisco de Vinícius de Moraes e Paulo Soledade



Afresco na Basilica Superior de São Francisco em Assis, de Giotto.

Lá vai São Francisco
Pelo caminho
De pé descalço
Tão pobrezinho
Dormindo à noite
Junto ao moinho
Bebendo a água
Do ribeirinho.

Lá vai São Francisco
De pé no chão
Levando nada 
No seu surrão
Dizendo ao vento
Bom-dia, amigo
Dizendo ao fogo
Saúde, irmão.

Lá vai São Francisco
Pelo caminho
Levando ao colo
Jesuscristinho
Fazendo festa
No menininho
Contando histórias
Pros passarinhos.


29 de mar. de 2012

Beleza


Hipótese



A vida, Senhor Visconde, é um pisca-pisca. 
A gente nasce, isto é, começa a piscar. [...] 
a vida das gentes deste mundo, senhor sabugo, é isso.
Um rosário de piscadas. 
Cada pisco é um dia. 
Pisca e mama;  pisca e anda;  pisca e brinca; pisca e estuda; pisca e ama; pisca e cria filhos;  pisca e geme os reumatismos;
por fim pisca pela última vez e morre.
- E depois que morre? - pergunta o Visconde.
- Depois que morre? Vira hipótese!
  É ou não é?
Emília, Monteiro Lobato 

28 de mar. de 2012

A arte é um esquivar-se a agir, ou a viver de Fernando Pessoa


A arte é um esquivar-se a agir, ou a viver. A arte é a expressão intelectual da emoção, distinta da vida, que é a expressão volitiva da emoção. O que não temos, ou não ousamos, ou não conseguimos, podemos possuí-lo em sonho, e é com esse sonho que fazemos arte. Outras vezes a emoção é a tal ponto forte que, embora reduzida a acção, a acção, a que se reduziu, não a satisfaz; com a emoção que sobra, que ficou inexpressa na vida, se forma a obra de arte. Assim, há dois tipos de artista: o que exprime o que não tem e o que exprime o que sobrou do que teve.
fonte: Livro do Desassossego. Vol.II. Fernando Pessoa. (Organização e fixação de inéditos de Teresa Sobral Cunha.) Lisboa: Presença, 1990. - 500.

A CERCA, O CÓRREGO :: Marcílio Godoi

  Quando falava de suas poucas reservas, de saúde e de dinheiro, meu velho pai dizia, “talvez dê pra chegar com a cerca no córrego!”. Desde ...