3 de mai. de 2012

Olha o teu leque esquecido! de Fernando Pessoa


 Renoir

 Renoir
Olha o teu leque esquecido!
Olha o teu cabelo solto!
Maria, toma sentido!
Maria, senão não volto!


Ausente de Maria Gabriela LLansol



 se estiveres ausente ( automóvel, comboio, avião, mudança de estação ou de cidade ), compra um papel simples que te comunique e envia-mo pelos meios mais eficazes ao teu alcance, e que te revelem como comprimido a desfazer-se debaixo da língua.

Amigo e amiga, Curso de silênco de 2004. Assírio & Alvim, 2006

2 de mai. de 2012

Verossímil de Adélia Prado


W.-A. Bouguereau. A canção dos anjos. 1881

Antigamente, em maio, eu virava anjo.
A mãe me punha o vestido, as asas,
me encalcava a coroa na cabeça e encomendava:
‘canta alto, espevita as palavras bem’.
Eu levantava voo rua acima.

Adélia Prado, em “Bagagem”

1 de mai. de 2012

Rosa, rosa, trandafir, tela







O poeta-operário de Vladimir Maiacovski

Grita-se ao poeta:

"Queria te ver numa fábrica!

O que? Versos? Pura bobagem".

Talvez ninguém como nós

ponha tanto coração

no trabalho.
Eu sou uma fábrica.
E se chaminés
me faltam
talvez seja preciso
ainda mais coragem.
Sei.
Frases vazias não agradam.
Quando serrais madeira
é para fazer lenha.
E nós que somos
senão entalhadores a esculpir
a tora da cabeça humana?
Certamente que a pesca é coisa respeitável.
Atira-se a rede e quem sabe?
Pega-se um esturjão!
Mas o trabalho do poeta
é muito mais difícil.
Pescamos gente viva e não peixes.
Penoso é trabalhar nos altos-fornos
onde se tempera o ferro em brasa.
Mas pode alguém
acusar-nos de ociosos?
Nós polimos as almas
com a lixa do verso.
Quem vale mais:
o poeta ou o técnico
que produz comodidades?
Ambos!
Os corações também são motores.
A alma é poderosa força motriz.
Somos iguais.
Camaradas dentro da massa operária.
Proletários do corpo e do espírito.
Somente unidos,
somente juntos remoçaremos o mundo,
fá-lo-emos marchar num ritmo célere.
Diante da vaga de palavras
levantemos um dique!
Mãos à obra!
(...)

(publicado em 1918)
tradução de  Emilio C. Guerra 
Vladimir Maiacovski 1893-1930

30 de abr. de 2012

Memorandum de Mario Benedetti

Uno llegar e incorporarse el día
Dos respirar para subir la cuesta
Tres no jugarse en una sola apuesta
Cuatro escapar de la melancolía
Cinco aprender la nueva geografía
Seis no quedarse nunca sin la siesta
Siete el futuro no será una fiesta
Y ocho no amilanarse todavía
Nueve vaya a saber quién es el fuerte
Diez no dejar que la paciencia ceda
Once cuidarse de la buena suerte
Doce guardar la última moneda
Trece no tutearse con la muerte
Catorce disfrutar mientras se pueda. 

...........................................................

Um chegar e incorporar-se o dia
Dois respirar para subir a ladeira
Três não jogar-se em uma só aposta
Quatro escapar da melancolia
Cinco aprender a nova geografia
Seis não ficar-se nunca sem a sesta
Sete o futuro não será uma festa e
Oito não assustar-se ainda
Nove vai a saber quem é o forte
Dez não deixar que a paciência ceda
Onze cuidar-se da boa sorte
Doze guardar a última moeda
Treze não tratar-se com a morte
Catorze desfrutar enquanto se pode.

Tradução de Maria Teresa Almeida Pina

29 de abr. de 2012

Poemas de Eugénio de Andrade


Beijo Querubim de Rogerio Fernandes

Canção
Tinha um cravo no meu balcão;
veio um rapaz e pediu-mo
– mãe, dou-lho ou não?
Sentada, bordava um lenço de mão;
veio um rapaz e pediu-mo
– mãe, dou-lho ou não?

Dei um cravo e dei um lenço,
só não dei o coração;
mas se o rapaz mo pedir
– mãe, dou-lho ou não?
.

28 de abr. de 2012

Dias:: Philip Larkin


Para que servem os dias?
Dias são onde vivemos.
Eles vêm, nos acordam
Um depois do outro.
Servem para a gente ser feliz:
Onde podemos viver senão neles?

Ah, resolver essa questão
Faz o padre e o médico
Em seus longos paletós
Perderem seu trabalho.

Philip Larkin, "Days" In : Nichols, David. Um dia.

27 de abr. de 2012

Canção Para Álbum de Moça Carlos Drummond de Andrade



Bom dia: eu dizia à moça
que de longe me sorria.
Bom dia: mas da distância
ela nem me respondia.
Em vão a fala dos olhos
e dos braços repetia
bom-dia a moça que estava
de noite como de dia
bem longe de meu poder
e de meu pobre bom-dia.

Bom-dia sempre: se acaso
a resposta vier fria ou tarde vier,
contudo esperarei o bom-dia.
E sobre casas compactas
sobre o vale e a serrania
irei repetindo manso
a qualquer hora: bom dia.
Nem a moça põe reparo
não sente, não desconfia
o que há de carinho preso
no cerne deste bom-dia.

Bom dia: repito à tarde
à meia-noite: bom dia.
E de madrugada vou
pintando a cor de meu dia
que a moça possa encontrá-lo
azul e rosa: bom dia.

Bom dia: apenas um eco na mata
(mas quem diria)
decifra minha mensagem,
deseja bom o meu dia.
A moça, sorrindo ao longe
não sente, nessa alegria,
o que há de rude também
no clarão deste bom-dia.
De triste, túrbido, inquieto,
noite que se denuncia
e vai errante, sem fogos,
na mais louca nostalgia.
Ah, se um dia respondesses
Ao meu bom-dia: bom dia!
Como a noite se mudara
no mais cristalino dia!

Miosotis






As flores Miosotis também são conhecidas como “não se esqueça de mim” ou ”não me esqueças” em várias línguas — non-ti-scordar-di-me, na Itália, forget-me-not na língua inglesa. São várias as formas de se explicar o seu nome, são diversas as lendas e estórias que passaram de pai para filho. Em uma antiga e romântica lenda alemã, conta-se esse nome está relacionado à última frase de um cavaleiro que, tentando alcançar uma flor para oferecer para a sua companheira, por conta do peso da armadura caiu em um rio e se afogou. Em outra lenda, conta-se que o nome teria sido dado por Adão, ainda no Éden, que ao nomear as flores do jardim esquecera desta e, mais tarde, ao constatar que essa planta havia sido esquecida, deu-lhe então o nome de Miosotis como forma de compensação por seu esquecimento. Uma terceira lenda, cristã e popular, diz-se que as flores dessa planta teriam ficado da cor azul quando a Virgem Maria lhes derramou lágrimas por cima. Na Europa há um folclore que costuma atribuir diversos poderes mágicos ao Miosotis, tratando-o, por exemplo, como chave mágica para tesouros enfeitiçados.

fonte: http://www.portalmundodasflores.com.br/guia_plantas_22.asp

26 de abr. de 2012

Todo o Leitor é Leitor de si Mesmo- de Marcel Proust

imagem: Elizabeth Peyton
Na realidade, todo leitor é, quando lê, o leitor de si mesmo. A obra não passa de uma espécie de instrumento óptico oferecido ao leitor a fim de lhe ser possível discernir o que, sem ela, não teria certamente visto em si mesmo.
Marcel Proust, in "O Tempo Redescoberto"

25 de abr. de 2012

Da pequena parte de perfeição


Amor e Psique de Antonio Canova (1757 — 1822)

“Já amei mulheres de feições diversas,
Por suas mais diversas qualidades,
Mas nunca assim, com toda a minha alma,
Pois sempre alguma sombra de defeito
Pairava sobre a graça mais perfeita
E desfazia o meu encantamento.
Mas você é tão bela e tão perfeita,
Parece feita da pequena parte
De perfeição que há em cada criatura.”
Shakespeare “A Tempestade”, tradução de Geraldo Carneiro

Erva-doce




O funcho, também conhecido por anis-doce, erva-doce, maratro ou finóquio, ou fiuncho, é o nome vernáculo dado à espécie herbácea Foeniculum vulgare Mill. (sinónimo taxonómico de Anethum foeniculum L. e deFoeniculum officinale L.) uma umbelífera fortemente aromática comestível utilizada em culinária, em perfumaria e como aromatizante no fabrico de bebidas espirituosas e planta medicinal. O funcho é nativo da bacia do Mediterrâneo, com variedades na Macaronésia e no Médio Oriente, onde ocorre no estado silvestre, mas é hoje cultivado, sob diversas formas varietais, em todas as regiões temperadas e subtropicais. 
fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Funcho

24 de abr. de 2012

Presença de Mário Quintana

Wyeth
É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas,
teu perfil exato e que, apenas, levemente, o vento
das horas ponha um frêmito em teus cabelos...
É preciso que a tua ausência trescale
sutilmente, no ar, a trevo machucado,
as folhas de alecrim desde há muito guardadas
não se sabe por quem nalgum móvel antigo...
Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janela
e respirar-te, azul e luminosa, no ar.
É preciso a saudade para eu sentir
como sinto - em mim - a presença misteriosa da vida...
Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista
que nunca te pareces com o teu retrato...
E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te.

Fotografia: Diego González Ragel [España, 1893-1951].








Sobre: Diego González Ragel [España, 1893-1951]. Las aficiones de Diego González Ragel pronto le condujeron hasta un variado grupo de artistas, intelectuales, deportistas y aristócratas de la época que iría fotografiando a lo largo de toda su vida. Paralelamente se especializó en el fotorreportaje, cuya dificultad técnica y modernidad pronto le lanzaron a la fama. Colaboró con revistas y publicaciones de gran prestigio, como Blanco y Negro o The Illustrated London News. Destacan también varias series de retratos, como los de la familia Sorolla o los del guitarrista Andrés Segovia. Junto a otros colegas, fundó la Unión de Reporteros Gráficos de Guerra y en 1941 fue nombrado fotógrafo oficial del Banco de España, actividad que combinaba con sus colaboraciones en el diario ABC y con trabajos más personales: retratos de familia, vistas de Madrid y reportajes de carreras y cacerías.

23 de abr. de 2012

Treze


Ler ou Copiar um Texto de Walter Benjamin

Marjan Khosravi, artista iraniana

O efeito de uma estrada campestre não é o mesmo quando se caminha por ela ou quando a sobrevoamos de avião. De igual modo, o efeito de um texto não é o mesmo quando ele é lido ou copiado. O passageiro do avião vê apenas como a estrada abre caminho pela paisagem, como ela se desenrola de acordo com o padrão do terreno adjacente. Somente aquele que percorre a estrada a pé se dá conta dos efeitos que ela produz e de como daquela mesma paisagem, que aos olhos de quem a sobrevoa não passa de um terreno indiferenciado, afloram distâncias, belvederes, clareiras, perspectivas a cada nova curva [...]. Apenas o texto copiado produz esse poderoso efeito na alma daquele que dele se ocupa, ao passo que o mero leitor jamais descobre os novos aspectos do seu ser profundo que são abertos pelo texto como uma estrada talhada na sua floresta interior, sempre a fechar-se atrás de si. Pois o leitor segue os movimentos de sua mente no vôo livre do devaneio, ao passo que o copiador os submete ao seu comando. A prática chinesa de copiar livros era assim uma incomparável garantia de cultura literária, e a arte de fazer transcrições, uma chave para os enigmas da China.

Walter Benjamin, in 'Rua de Sentido Único'

21 de abr. de 2012

Desenho de Mário de Andrade


Poty - Capa do livro Ave,  palavra de Guimarães Rosa 

O que me agrada principalmente, na tão complexa natureza do desenho, é o seu caráter infinitamente sutil, de ser ao mesmo tempo uma transitoriedade e uma sabedoria. O desenho fala, chega mesmo a ser muito mais uma espécie de escritura, uma caligrafia, que uma arte plástica.

20 de abr. de 2012

Pedra de crochê !






Todo Sentimento de Chico Buarque



Preciso não dormir
Até se consumar
O tempo da gente.
Preciso conduzir
Um tempo de te amar,
Te amando devagar e urgentemente.
Pretendo descobrir
No último momento
Um tempo que refaz o que desfez,
Que recolhe todo sentimento
E bota no corpo uma outra vez.
Prometo te querer
Até o amor cair
Doente, doente...
Prefiro, então, partir
A tempo de poder
A gente se desvencilhar da gente.
Depois de te perder,
Te encontro, com certeza,
Talvez num tempo da delicadeza,
Onde não diremos nada;
Nada aconteceu.
Apenas seguirei
Como encantado ao lado teu.


Uma imagem de prazer :: Clarice Lispector

     Conheço em mim uma imagem muito boa, e cada vez que eu quero eu a tenho, e cada vez que ela vem ela aparece toda. É a visão de uma flor...