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15 de nov. de 2015

Sempre :: Chico Buarque

John William Godward

Sempre
Eu te contemplava sempre
Feito um gato aos pés da dona
Mesmo em sonho estive atento
Para poder lembrar-te sempre
Como olhando o firmamento
Vejo estrelas que já foram
Noite afora para sempre

O teu corpo em movimento
Os teus lábios em flagrante
O teu riso, o teu silêncio
Serão meus ainda e sempre

Dura a vida alguns instantes
Porém mais do que bastantes
Quando cada instante é sempre

25 de mai. de 2015

Rua do Bonjardim :: Inês Lourenço

Vindo do marquês, o autocarro
chiava na curva estreita, soltando
os seus vapores de gasóleo, e
num portal surgia um gato pardo
para o qual me inclinei, sabendo
que fugiria ao contacto
da minha mão, ou apenas ao
esboço de carícia, como fazem
os gatos, tão fugidios na presença
de estranhos. Mas o animal, no
instante do recuo, aceitou o
deslizar dos meus dedos,
em troca de amáveis energias. E
uma longa saudade subiu-me pelo
braço, no arquear festivo
daquele pequeno tigre.

19 de mai. de 2015

O Gato :: Charles Baudelaire (1821-1867)

Picasso
É no meu cérebro que se passeia,
Como no seu apartamento,
Um gato doce e atraente.
Mal o consigo ouvir, se mia,

Porque o seu timbre é tão discreto;
Mas a voz, calma ou iracunda,
É sempre rica e bem profunda.
É o seu encanto e o seu segredo.

A voz, que goteja e se infiltra
No meu fundo mais tenebroso,
Enche-me, qual verso copioso,
E satisfaz-me como um filtro.

Adormeço os males cruéis,
Ela contém todos os extâses;
E pra dizer as maiores frases
Não necessita de palavras.

Não, não exista arco que morda
O meu peito, raro instrumento,
E faça majestosamente
Cantar essa vibrante corda,

Como a tua voz, ó misterioso
Gato seráfico, tão estranho,
No qual tudo é, como num anjo,
Tão subtil como harmonioso!

Tradução: Fernando Pinto do Amaral
As Flores do Mal. Editora Assírio e Alvim. 1992

6 de mai. de 2015

Dois Sonhos : Carlos Drummond de Andrade

Eugene Delacroix, 1830

O gato dorme a tarde inteira no jardim.
Sonha (?) tigres enviesados a chamá-lo
para a fraternidade no jardim.
Gato sonhando, talvez sonho de homem?
Continua dormindo, enquanto ignoro
a natureza e o limite do seu sonho
e por minha vez
também me sonho (inveja) gato no jardim

22 de out. de 2014

Gato num apartamento vazio :: Wislawa Szymborska (Kórnik, 2 de Julho de 1923 — Cracóvia, 1 de fevereiro de 2012)

Morrer não é coisa que se faça a um gato.
Que há-de um gato fazer
num apartamento vazio?
Subir às paredes?
Roçar-se nos móveis?
Aparentemente não mudou nada
e no entanto está tudo mudado.
Continua tudo no seu lugar
e no entanto está tudo fora do sítio.
E à noite a lâmpada já não está acesa.
Ouvem-se passos nas escadas,
mas não são os mesmos.
A mão que põe o peixe no prato
também já não é a que o punha.
Há aqui qualquer coisa que já não começa
à hora do costume,
qualquer coisa que não se passa
como deveria passar-se.
Havia aqui alguém que há muito estava e estava
e que de repente desapareceu
e agora insistentemente não está.
Procurou-se em todos os armários,
revistaram-se as estantes,
espreitou-se para debaixo do tapete.
Violou-se até a proibição
de desarrumar os papéis.
Que mais se pode fazer?
Dormir e esperar.
Quando regressar, ele vai ver,
ele vai ver quando chegar.
Vai ficar a saber
que isto não é coisa que se faça a um gato.
Caminhar-se-á em direcção a ele
como que contrariado,
devagarinho,
com patas amuadas.
E nada de saltos ou mios. Pelo menos ao princípio.

Tradução do poeta Manuel António Pina

20 de jul. de 2014

O gato de Charles Baudelaire (Tradução de Ivan Junqueira)


Robert Foster

Vem cá, meu gato, aqui no meu regaço;
Guarda essas garras devagar, 
E nos teus belos olhos de ágata e aço
Deixa-me aos poucos mergulhar.

Quando meus dedos cobrem de carícias
Tua cabeça e o dócil torso, 
E minha mão se embriaga nas delícias

De afagar-te o elétrico dorso, 
Em sonho a vejo. Seu olhar, profundo
Como o teu, amável felino, 
Qual dardo dilacera e fere fundo,

E, dos pés à cabeça, um fino 
Ar sutil, um perfume que envenena
Envolvem-lhe a carne morena.

1 de fev. de 2013

Sempre de Chico Buarque

Eu te contemplava sempre
Feito um gato aos pés da dona
Mesmo em sonho estive atento
Para poder lembrar-te sempre
Como olhando o firmamento
Vejo estrelas que já foram
Noite afora para sempre

O teu corpo em movimento
Os teus lábios em flagrante
O teu riso, o teu silêncio
Serão meus ainda e sempre

Dura a vida alguns instantes
Porém mais do que bastantes
Quando cada instante é sempre

http://www.youtube.com/watch?v=OhIB-vYy_Qw

13 de nov. de 2012

Aonde fica a saída? de Lewis Carroll


Utagawa


“Aonde fica a saída?", perguntou Alice ao gato que ria. 
”Depende”, respondeu o gato. 
”De quê?”, replicou Alice; 
”Depende de para onde você quer ir...”

in: Alice no País das Maravilhas

24 de set. de 2012

Não permitas que o momento de lucidez se dissolva de Adam Zagajewski

                                                                                                                                                           Utagawa Kunimasa

Não permitas que o momento de lucidez se dissolva
Deixa que o pensamento radiante dure em sossego
embora a página esteja quase concluída e a chama vacile
Ainda não ascendemos ao nível que nos é devido
A sabedoria cresce lentamente como um dente do siso
A estatura de um homem continua a ser talhada
sobre uma porta branca

Vinda da distância, a voz feliz de uma trompete
e de uma canção surge inesperadamente como um gato
O que acontece não cai no vazio
O fogueiro continua a alimentar a fornalha com carvão
Não permitas que o momento de lucidez se dissolva
Tens de gravar a verdade
numa substância seca e dura

(versão a partir da tradução para inglês de Renata Gorczynski)