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21 de nov. de 2014

Invenção de Orfeu –:: Jorge de Lima

A ilha ninguém achou
porque todos a sabíamos.
Mesmo nos olhos havia
Uma clara geografia.

Mesmo nesse fim de mar
qualquer ilha se encontrava,
mesmo sem mar e sem fim,
mesmo sem terra e sem mim

Mesmo sem naus e sem rumos,
mesmo sem vagas e areias,
há sempre um copo de mar
para um homem navegar.

Nem achada e nem não vista
nem descrita e nem viagem,
há aventuras de partidas
porém nunca acontecidas.

Chegados nunca chegamos
eu e a ilha movediça.
Móvel terra, céu incerto,
mundo jamais descoberto.

Indícios de canibais,
sinais do céu e sargaços,
aqui um mundo escondido
geme num búzio perdido.

Rosa de ventos na testa,
maré rasa, aljôfre, pérolas,
domingos de pascoelas.
E esse veleiro sem velas!

Afinal: ilha de praias.
Quereis outros achamentos
além dessas ventanias
tão tristes, tão alegrias?

9 de jan. de 2014

Jorge de Lima, "Não procureis nexo naquilo ..."

Não procureis nexo naquilo
que os poetas pronunciam acordados,
pois eles vivem no âmbito intranquilo
em que se agitam seres ignorados.

No meio de desertos habitados
só eles é que entendem o sigilo 
dos que no mundo vivem sem asilo 
parecendo com eles renegados. 

Eles possuem, porém, milhões de antenas
distribuídas por todos os seus poros 
aonde aportam do mundo suas penas. 

São os que gritam quando tudo se cala,
são os que vibram de si estranhos coros 
para a fala de deus que é sua fala.

8 de set. de 2013

Jorge de Lima (União dos Palmares, 23 de abril de 1893 — Rio de Janeiro, 15 de novembro de 1953)






E o sino da Igrejinha com voz fina de menina

tem dlins-dlins

para o batismo dos pimpolhos.


Para os mortos: devagar – DLIM-DLIM...

é como um choro de menino, compassado

sem

fim.


Dlin-dlins para as manhãs loucas de luz,

para as tardinhas que são como velhinhas

passo tardo, xale preto, corcundinhas...


As andorinhas conhecem esses dlins-dlins

e vêm

ouvi-los no verão.

As ave-marias vêm

ouvi-los ao sol-pôr...

E a estrela Vésper

atrás da torre,

e entre a neblina

ouve quieta: dlim, dlim, dlim...


E há dlins-dlins de esperança,

de venturas de saudades e de fé...


Todo o pulsar da vila:

virgens que morrem, virgens que casam...

Viático...

Novenas...

Comunhões...

E nas missas domingueiras

que alegria, que repiques argentinos

aos namoros das mocinhas...

Casamentos...

Batizados...

Agonias...

Meu deus! Dlins-dlins para os que morrem...

Dlim-dlim

Jorge Mateus de Lima (União dos Palmares, 23 de abril de 1893 — Rio de Janeiro, 15 de novembro de 1953) foi político, médico, poeta, romancista, biógrafo, ensaísta, tradutor e pintor brasileiro. Inicialmente autor de belíssimos alexandrinos, posteriormente transformou-se em um modernista.

Uma imagem de prazer :: Clarice Lispector

     Conheço em mim uma imagem muito boa, e cada vez que eu quero eu a tenho, e cada vez que ela vem ela aparece toda. É a visão de uma flor...