Minha mulher, que lá em casa é minha deusa, compartilhou com os amigos de uma dessas redes que pescam gente, as tais redes sociais, um vídeo que mostrava sua avó, uma típica mineira de palavras curtinhas e de sorriso "facim, facim", contando histórias de vaidades, de saudades, de futebol e de família.
Embora eu não tenha conhecido dona Magnólia, a avó em questão, adorei e me emocionei ao ver aquela senhora sentada em um sofá bem confortável dando uma "entrevista" informal a uma das filhas para ser apreciada a qualquer tempo, inclusive na posteridade, por toda a parentada.
Vó Magnólia usava um roupão cor-de-rosa -quase na mesma tonalidade da flor homônima de seu registro-, óculos grandes e redondos, mas que já pouco serviam, e cabelos irretocáveis, tingidos de castanho. Articulava as ideias com a memória meio barro meio tijolo devido à fúria do Alzheimer, mas nada que comprometesse o conteúdo geral.
Mesmo que por estes dias as câmeras de filmar estejam sempre ao alcance das mãos -há até caneta, botão e broches que gravam tudo em Brasília-, são pouquíssimas as vezes em que os velhos viram "atores" para contar sobre as coisas do mundo, seja de seus mundos, seja de suas coisas.
É bem diferente dos bebês, dos bichinhos e dos engraçados. Esses estão gravados e espalhados por todos os lados, ainda mais no tal universo digital. Não faltam "facebooqueiros" que os postam rotineiramente na internet fazendo fofices, dando cambalhotas desajeitadas, correndo atrás do próprio rabo, tendo atitudes de adultos ou soltando falas anedóticas.
Vovós Magnólias, não as vi muitas. E digo isso para não comprometer a sagacidade de minha memória escrevendo que ela foi a única. Ser velho não tem graça? Ser velho não é bonito? Ser velho não tem alegria? Ser velho não dá o que falar?
Defendo que a mira das lentes seja mais voltada àqueles que a gente ama, àqueles de quem o tempo já não conta a favor, àqueles que justificam de maneira completa a palavra saudade. Mesmo que, rotineiramente, eles digam que "detestam essas coisas modernas", insista, grave escondidinho, brinque de fazer novela, de imitar o Jô Soares entrevistando.
Imagine tirar das gavetas tecnológicas essas lembranças sempre que o coração tiver vontade, que a alma gritar por um banho de recordação. Que delícia seria morrer de rir relembrando o jeito como o vozinho penteava o que chamava de cabelo para, depois, esconder tudo na boina xadrez.
E o que dizer da cena da mãe nervosa balangando as pernas e reclamando do caçula ingrato que não liga há dois dias? Não gravei nem gravaram minha avó na máquina de costura fazendo bainha ou no fogão frigindo seus famosos bolinhos de polvilho. Seria delicioso poder revê-la de formas simples assim, escutar sua voz e encantar-me, mais uma vez, com seus causos já quase esquecidos.
Uma coisa bonita era para se dar ou para se receber, não apenas para se ter. Clarice Lispector
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