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7 de dez. de 2020

Nonada de Guimarães Rosa

Via Lactea
"... E eu sou nada, não sou nada, não sou nada... 
Não sou mesmo nada, nadinha de nada, de nada... 
Sou uma coisinha... nenhuma, o senhor sabe? 
Sou nada coisinha mesma nenhuma de nada, o menorzinho de todos. 
O senhor sabe? 
De nada. De nada...De nada...” 

Rosa, João Guimarães: Grande Sertão: Veredas. 19ª edição. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001. p. 366

11 de jan. de 2015

Uma vez :: Idea Vilariños

Eyvind Earle

Sou meu pai e minha mãe
sou meus filhos
e sou o mundo
sou a vida
e não sou nada
ninguém
um pedaço animado
uma visita
que não esteve
nem estará depois.
Estou estando agora
quase não sei mais nada
como uma vez estavam
outras coisas que foram
como um céu distante
um mês
uma semana
um dia de verão
que outros dias do mundo
dissiparam.

28 de nov. de 2014

Volta :: Alice Sant'Anna

Reb Frost

esses dias de tédio
em que se tem tempo – 
tempo só se arranja quando 
não se tem
quando sobra desse jeito
a gente repete os assuntos
o ônibus chega rápido 
e os trajetos ficam curtos
– de repente
readaptar-se à própria casa
como foi lá? bom
rever os gigantes, os mínimos
dedicar a eles igual dose
de carinho ou indiferença
usar as roupas que ficaram
meses dobradas no armário
com cheiro de sachê
nessas tardes sem compromisso
esticadas com rolo de macarrão
tudo é longo
nada dura

31 de ago. de 2014

AS TRÊS PALAVRAS MAIS ESTRANHAS :: Wislawa Szymborska

Mel Bochner, 2012
Quando pronuncio a palavra Futuro
a primeira sílaba já pertence ao passado.
Quando pronuncio a palavra Silêncio,
destruo-o.
Quando pronuncio a palavra Nada,
crio algo que não cabe em nenhum não-ser.


Tradução de Elzbieta Milewska e Sérgio das Neves

25 de mar. de 2014

Falem se parar de Paulo Henriques Britto

Octavio Ocampo

A realidade é coisa delicada,
de se pegar com as pontas dos dedos.

Um gesto mais brutal, e pronto: o nada.
A qualquer hora pode advir o fim.
O mais terrível de todos os medos.

Mas, felizmente, não é bem assim.
Há uma saída – falar, falar muito.
São as palavras que suportam o mundo,
não os ombros. Sem o “porquê”, o sim”,

todos os ombros afundavam juntos.
Basta uma boca aberta (ou um rabisco
num papel) para salvar o universo.
Portanto, meus amigos, eu insisto:
falem se parar. Mesmo sem assunto.

do livro Macau

17 de jan. de 2014

Maneiras de se combater o nada de Julio Cortázar


Theophrastos Triantafyllidis

"Entre as muitas maneiras de se combater o nada, uma das melhores é tirar fotografias, atividade que deveria ser ensinada desde muito cedo às crianças, pois exige disciplina, educação estética, bom olho e dedos seguros. (...) Quando se anda com a câmara tem-se de estar atento de não perder este brusco e delicioso rebote de um raio de sol numa velha pedra, ou a carreira, trançadas ao vento, de uma menininha que volta com um pão ou uma garrafa de leite. (...) O fotógrafo age sempre como uma permutação de sua maneira pessoal de ver o mundo por outra que a câmara lhe impõe, insidiosa (...)".
In: Cortázar, Julio. As armas secretas. Rio de janeiro: José Olympio, 2009.

28 de ago. de 2013

Tabacaria de Fernando Pessoa

 Henricus Hondius, 1660

Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

24 de ago. de 2013

Quando pronuncio de Wislawa Szymborska


Quando pronuncio a palavra Futuro
a primeira sílaba já se perde no passado.
Quando pronuncio a palavra Silêncio,

suprimo-o.

Quando pronuncio a palavra Nada,

crio algo que não cabe em nenhum não ser.


fonte: Poemas. Companhia da Letras, 2011.