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27 de jan. de 2015

MINHA GRANDE TERNURA :: Manuel Bandeira


quadro: Campos de Outrora  de Lúcia Buccini

Minha grande ternura
Pelos passarinhos mortos,
Pelas pequeninas aranhas.

Minha grande ternura
Pelas mulheres que foram meninas bonitas
E ficaram mulheres feias;
Pelas mulheres que foram desejáveis
E deixaram de o ser;
Pelas mulheres que me amaram
E que eu não pude amar.

Minha grande ternura
Pelos poemas que
Não consegui realizar.

Minha grande ternura
Pelas amadas que
Envelheceram sem maldade.

Minha grande ternura
Pelas gotas de orvalho que
São o único enfeite
De um túmulo.


13 de abr. de 2014

IN VAIN THE AM’ROUS FLUTE :: Manuel de Freitas



Estas escadas tinham degraus
onde por acaso nos sentámos
à espera de não ver gaivotas,
com livros abertos
quando as mãos chegavam.

De novo e despercebida e só,
acendia-se para morrer na tarde
a inútil figuração do desejo.

E éramos outra vez nós
os seus irrepetíveis figurantes,
escondidos num poema
que o tempo pisou, deixa lá
- o recomeçado amor descendo.

7 de jan. de 2014

Sobre o Poema de Herberto Helder

Andreas Cellarius, Harmonia Macrocosmica, Amsterdam, 1660.


Sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,
talvez como sangue
ou sombra de sangue pelos canais do ser.
Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência
ou os bagos de uva de onde nascem
as raízes minúsculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalteráveis
do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silêncio,
as sementes à beira do vento,
- a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.
E já nenhum poder destrói o poema.
Insustentável, único,
invade as órbitas, a face amorfa das paredes,
a miséria dos minutos,
a força sustida das coisas,
a redonda e livre harmonia do mundo.
— Embaixo o instrumento perplexo ignora
a espinha do mistério.
— E o poema faz-se contra o tempo e a carne.

15 de fev. de 2013

Face sonhada de João Cabral de Melo Neto

Felix Mas

Eu penso o poema 
da face sonhada, 
metade de flor 
metade apagada. 
O poema inquieta
o papel e a sala.
Ante a face sonhada 
o vazio se cala.

1 de jul. de 2012

Trégua de Adélia Prado


Hoje estou velha como quero ficar.
Sem nenhuma estridência.
Dei os desejos todos por memória
e rasa xícara de chá.