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30 de nov. de 2015

Prendedores :: Ana Estaregui


já escrevi sobre prendedores
de roupa
sobre a dor deles, função primeira
desmembrei suas patas
arranquei o coraçãozinho
de metal gelado
olhei atentamente
vi um buraco absurdo
um tiro bem no meio
vi planalto, depressão
topografia enrustida
mas hoje
hoje eu só quero
estirar umas calcinhas
ao vento.

24 de mai. de 2015

Cantiga para Djanira :: Paulo Mendes Campos


Djanira
O vento é o aprendiz das horas lentas,
Traz suas invisíveis ferramentas,
Suas lixas, seus pentes-finos,
Cinzela seus castelos pequeninos,
Onde não cabem gigantes contrafeitos,
E, sem emendar jamais os seus defeitos,
Já rosna descontente e guaia
De aflição e dispara à outra praia,
Onde talvez possa assentar
Seu monumento de areia – e descansar.

In: Poemas. Civilização Brasileira, 1984.

4 de mai. de 2015

Da vista e do visto ::Eucanaã Ferraz


Mais uma vez é maio; não o levaste contigo;
horas se escrevem hoje com o lápis de sempre,
ultramar e um tanto adolescente; não o levaste,
maio, mês do meu aniversário, quando a melancolia
é menos nítida que a linha dos morros e dos edifícios;

vento sol amendoeiras, é como te digo, não levaste
maio e mesmo os meus olhos estão aqui, comigo, algo,
porém, sei que se foi contigo; que coisa era, não sei,
e, ainda que pequena, faz falta, era minha; coincidência
ou não, procuro e não encontro a minha antiga alegria.

Sentimental: poemas. Companhia das Letras, 2012.

11 de abr. de 2015

SONETO DAS DEFINIÇÕES :: Carlos Penas Filho



Não falarei das coisas, mas de inventos
e de pacientes buscas no esquisito.
Em breve, chegarei à cor do grito
à música das cores e dos ventos.

Multiplicar-me-ei em mil cinzentos
(desta maneira, lúcido, me evito)
e a estes pés cansados de granito
saberei transformar em cataventos.

Daí, o meu desprezo a jogos claros
e nunca comparados ou medidos
como estes meus, ilógicos, mas raros.

Daí também, a enorme divergência
entre os dias e os jogos, divertidos
e feitos de beleza e improcedência.


26 de fev. de 2015

Eu posso ir lá fora ? :: Mario Quintana


Louisa Matthiasdottir, 1985

Oh! aquele menininho que dizia
“Fessora, eu posso ir lá fora?”
mas apenas ficava um momento
bebendo o vento azul...
Agora não preciso pedir licença a ninguém.
Mesmo porque não existe paisagem lá fora:
somente cimento.
O vento não mais me fareja a face como um cão amigo...
Mas o azul irreversível persiste em meus olhos.


QUINTANA, Mario. A vaca e o hipogrifo. São Paulo, Globo, 1995. p.51

5 de fev. de 2015

VIVÊNCIA :: FLORA FIGUEIREDO


Se sua rua porventura aparecer 
coberta de pétalas caídas 
pela inclemência 
de um vento qualquer, 
não faça nada. 
Deixe-a assim desordenada 
e descabida. 
São reticências que sobraram da estação passada. 
Acabarão varridas pela própria vida. 

In Amor a céu aberto, 1992 


6 de jan. de 2015

4 de nov. de 2014

"Um refúgio? Eduardo Galeano

"Um refúgio? Uma barriga? Um abrigo onde se esconder quando estiver se afogando na chuva, ou sendo quebrado pelo frio, ou sendo revirado pelo vento? Temos um esplêndido passado pela frente? Para os navegantes com desejo de vento, a memória é um ponto de partida".











9 de out. de 2014

Meu Avô :: Manoel de Barros

Odilon Redon

Meu avô dava grandeza ao abandono.
Era com ele que vinham os ventos a conversar
Sentava-se o velho sobre uma pedra nos fundos 
do quintal
E vinham as pombas e vinham as moscas a
conversar.
saia do fundo do quintal para dentro da
casa
E vinham os gatos a conversar com ele.
Tenho certeza que o meu avô enriquecia
a palavra abandono.
Ele ampliava a solidão dessa palavra.
e as borboletas se aproveitavam dessa
amplidão para voar mais longe.

9 de set. de 2014

O som - Ferreira Gullar

Praça do Lido, Copacabana, RJ.

o som é da Terra
não há nenhuma música das esferas
como pensou Aristóteles

música barulho
o trepidar cristalino
da água
sob as folhas
é coisa terrestre

o cosmo é um vastíssimo silêncio
de bilhões e bilhões de séculos

nenhum ruído
as estrelas são imensas explosões mudas
um desatino

a matéria estelar
(a explodir)
é silêncio
e energia

Para outros ouvidos talvez
poderia ser o universo
um insuportável barulho;
não para os nossos
terrenos

Viver na Terra é ouvir
entre outras vozes
o marulho
do mar salgado e azul
ouvir a ventania a rasgar-se nos galhos
antes do temporal

só aqui
neste planeta é que
se pode escutar teu límpido gorjeio,
passarinho,
pequenino cantor
da praça do Lido.

20 de mar. de 2014

Os mortos de Ferreira Gullar


Balthus

os mortos vêem o mundo
pelos olhos dos vivos

eventualmente ouvem,
com nossos ouvidos,
certas sinfonias
algum bater de portas,
ventanias

Ausentes
de corpo e alma
misturam o seu ao nosso riso
se de fato
quando vivos
acharam a mesma graça


De Muitas Vozes (1999)

9 de set. de 2013

Vento de Clara Coelho de Carvalho

Louise Richardson

Eu pensava que nunca mais ia amar ninguém, depois de ter o coração partido aos 19.

Mas o Tempo vem e traz a Vida com ele. E a Vida carrega o Amor na ponta da saia


fonte: http://poetetre.wordpress.com/2012/10/03/vento/
.

23 de jun. de 2013

Canção dos que partem - Luis Enrique Belmonte (Caracas, 1971)


Os que partem a cantarolar uma canção
a deixar que a luz ocupe seu lugar nas esquinas,
nos rostos que chegam,
nas mãos que palpam o espaço habitável
Os que se aproximam do horizonte
procurando pássaros que adejam na escuridão
Os que no seu andar desprendem gravetos, espinhos,
cascas que assinalam o sentido
do que não puderam dizer a tempo
quando era preciso dizê-lo.
Os que se vão não devem olhar o rasto do seu passo
senão a cintilação da terra prometida
que não é mais que o lampejo de seus próprios corpos
a trafegar caminhos no mais côncavo da noite.
Escutemos a canção
sobre os telhados de povos afantasmados,
nos gonzo de portas entreabertas,
nos sótãos do vento.
É a canção que anuncia aos que chegam
e torna mais leve a travessia dos que partem.

.........................
Los que se van tarareando una canción
dejando que la luz ocupe su lugar en las esquinas,
en los rostros que llegan,
en las manos que tantean el espacio habitable.
Los que se van arrimando al horizonte
buscando pájaros que aletean en la oscurana.
Los que en su marcha desprenden astillas, espinas,
cáscaras que señalan el sentido
de lo que no pudieron decir a tiempo
cuando era justo decirlo.
Los que se van no deben mirar la estela de su paso
sino el relumbre de la tierra prometida
que no es más que el destello de sus propios cuerpos
trasegando caminos en lo más cóncavo de la noche.
Escuchemos la canción
sobre los tejados de pueblos afantasmados,
en los goznes de puertas entreabiertas,
en los áticos del viento.
Es la canción que anuncia a los que llegan
y hace más ligera la travesía de los que parten.


Luis Enrique Belmonte. Nasceu em Caracas, em 1971. É médico cirurgião (UCV), especializou-se em Bioética na Universidade Ramón Llull e em História das Ciências na Universidade Autónoma de Barcelona. Recebeu diferentes reconhecimentos literários, entre eles o Prêmio de Poesia Fernando Paz Castillo (1996), por Corpo baixo lâmpada; o Prêmio Adonais (1998), convocado pela editorial Rialp de Madri, por Inútil registo; e o Prêmio de Poesia da IV Bienal de Literatura Mariano Picón Salas (2005), por O encanto.

11 de fev. de 2013

Chovendo na Roseira de Tom Jobim



Olha está chovendo na roseira
Que só dá rosa mas não cheira
A frescura das gotas úmidas
Que é de Luisa
Que é de Paulinho
Que é de João
Que é de ninguém

Pétalas de rosa carregadas pelo vento
Um amor tão puro carregou meu pensamento

Olha um tico-tico mora ao lado
E passeando no molhado
Adivinhou a primavera

Olha que chuva boa prazenteira
Que vem molhar minha roseira
Chuva boa criadeira
Que molha a terra
Que enche o rio
Que limpa o céu
Que traz o azul

Olha o jasmineiro está florido
E o riachinho de água esperta
Se lança em vasto rio de águas calmas

Ah, você é de ninguém
Ah, você é de ninguém

29 de jan. de 2013

Evadir-me, esquecer-me de Sophia de Mello Breyner Andresen


Evadir-me, esquecer-me, regressar

À frescura das coisas vegetais,
Ao verde flutuante dos pinhais
Percorridos de seivas virginais
E ao grande vento límpido do mar.



Obra Poética I

Caminho

5 de jul. de 2009

Paisagem N.º 1



Minha Londres das neblinas finas!
Pleno verão. Os dez mil milhões de rosas paulistanas.
Há neve de perfumes no ar.
Faz frio, muito frio...
E a ironia das pernas das costureirinhas
parecidas com bailarinas...
O vento é como uma navalha
nas mãos dum espanhol. Arlequinal!...
Há duas horas queimou Sol.
Daqui a duas horas queima Sol.

Passa um São Bobo, cantando, sob os plátanos,
um tralálá... A guarda-cívica! Prisão!
Necessidade a prisão
para que haja civilização?
Meu coração sente-se muito triste...
Enquanto o cinzento das ruas arrepiadas
dialoga um lamento com o vento...

Meu coração sente-se muito alegre!
Este friozinho arrebitado
dá uma vontade de sorrir!

E sigo. E vou sentindo,
à inquieta alacridade da invernia,
como um gosto de lágrimas na boca...


Mário de Andrade