Uma coisa bonita era para se dar ou para se receber, não apenas para se ter. Clarice Lispector
11 de jan. de 2014
10 de jan. de 2014
Mário de Andrade: Manhã (1912)
Arnaud Julien Pallière, Ouro Preto - 1820.
O jardim estava em rosa ao pé do Sol
E o ventinho de mato que viera do Jaraguá,
Deixando por tudo uma presença de água,
Banzava gozado na manhã praceana.
Tudo limpo que nem toada de flauta.
A gente si quisesse beijava o chão sem formiga,
A boca roçava mesmo na paisana de cristal.
Um silêncio nortista, muito claro!
As sombras se agarravam no folheto das árvores
Talqualmente preguiças pesadas.
O sol sentava nos bancos tomando banho-de-luz.
Tinha um sossego tão antigo no jardim,
Uma fresca tão de mão lavada com limão,
Era tão marupiara e descansante
Que desejei… Mulher não desejei não, desejei…
Se eu tivesse ao meu lado ali passeando
Suponhamos Lênin, Carlos Prestes, Ghandi, um desses!…
Na doçura da manhã quase acabada
Eu lhes falava cordialmente: – Se abanquem um bocadinho.
E havia de contar pra eles os nomes dos nossos peixes,
Ou descrevia Ouro Preto, a entrada de Vitória, Marajó,
Coisa assim, que pusesse um disfarce de festa
No pensamento dessas tempestades de homens.
9 de jan. de 2014
Jorge de Lima, "Não procureis nexo naquilo ..."
Não procureis nexo naquilo
que os poetas pronunciam acordados,
pois eles vivem no âmbito intranquilo
em que se agitam seres ignorados.
No meio de desertos habitados
só eles é que entendem o sigilo
dos que no mundo vivem sem asilo
parecendo com eles renegados.
Eles possuem, porém, milhões de antenas
distribuídas por todos os seus poros
aonde aportam do mundo suas penas.
São os que gritam quando tudo se cala,
são os que vibram de si estranhos coros
para a fala de deus que é sua fala.
7 de jan. de 2014
Sobre o Poema de Herberto Helder
Andreas Cellarius, Harmonia Macrocosmica, Amsterdam, 1660.
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Sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,
talvez como sangue
ou sombra de sangue pelos canais do ser.
Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência
ou os bagos de uva de onde nascem
as raízes minúsculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalteráveis
do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silêncio,
as sementes à beira do vento,
- a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.
E já nenhum poder destrói o poema.
Insustentável, único,
invade as órbitas, a face amorfa das paredes,
a miséria dos minutos,
a força sustida das coisas,
a redonda e livre harmonia do mundo.
— Embaixo o instrumento perplexo ignora
a espinha do mistério.
— E o poema faz-se contra o tempo e a carne.
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