Uma coisa bonita era para se dar ou para se receber, não apenas para se ter. Clarice Lispector
23 de dez. de 2016
22 de dez. de 2016
Natal não é só presente : Rosely Sayão
A maioria das
crianças adora o Natal! Elas esperam ansiosamente pela data: marcam no
calendário se já conseguem, perguntam constantemente aos pais quantos dias
faltam para chegar, e algumas até querem dormir logo porque acham que, desse
modo, o dia chegará mais rapidamente.
Será por causa dos presentes que elas sabem que irão ganhar
que ficam nessa espera ansiosa? Para saber disso diretamente delas, juntei-me a
uma colega e resolvemos conversar com pelo menos 20 crianças, todas com idades
entre 5 e 11 anos, pertencentes a famílias diferentes e não conhecidas entre
si, e perguntamos se elas gostavam do Natal, e por quê. Pode ser que você se
surpreenda com as respostas que tivemos, caro leitor!
Sim, quase todas falaram dos presentes. Mas nenhuma delas
deixou de dizer que gostava de estar com a família toda reunida, de comer as
coisas gostosas que costumam ser servidas e que ficavam sentindo-se contentes
com todos juntos, inclusive com os parentes que moram longe delas e com quem
pouco se encontram. Aliás, várias disseram que acham uma pena que isso aconteça
apenas no Natal, ou seja, uma vez ao ano.
Aí está: se alguém ainda tinha dúvidas sobre a importância
da convivência familiar para as crianças, poderá agora repensar suas ideias a
respeito.
No cotidiano familiar, quase não há tempo nem espaço para a
convivência tranquila dos pais e demais adultos do grupo, sem que haja metas e
objetivos a cumprir, sem obrigações mediando os relacionamentos, sem horários
rigorosos, sem pressa, enfim.
Reunirem-se apenas para estarem juntos uns com os outros,
para comer ao mesmo tempo as comidas que foram preparadas especialmente para a
família celebrar o encontro, para rir do próprio grupo: nada é mais importante
do que isso para as crianças.
Tais reuniões oferecem a elas uma sensação de conforto, de
segurança, de acolhimento e, principalmente, a certeza de poderem contar com
chão firme que lhes permite seguir em frente na vida.
Se para nós, adultos, essas sensações são das mais
relevantes para nos ajudar a continuar em nosso caminho, apesar dos percalços
que a vida nos impõe, imagine, caro leitor, na formação da base estrutural de
uma criança!
Talvez nem todos ainda consigam perceber que, no dia a dia
da família, nem sempre os mais novos conseguem ter a percepção clara de que sua
família toda —não apenas seus pais— estão com eles lado a lado, no apoio e na
tutela, para o que der e vier, mesmo que seja a distância, agora encurtada
pelos contatos virtuais frequentes. Por isso, todas as crianças citaram a
reunião da família expandida como algo de que gostam muito no Natal.
Por isso, meu caro leitor, eu desejo que, neste Natal,
celebrando ou não a data no seu sentido religioso, você realize os
investimentos pessoais necessários para que as crianças que pertencem a seu
grupo familiar consigam desfrutar dessa reunião com todos juntos e, assim,
criar memórias afetivas.
E não pense que se houver contratempos nos relacionamentos,
que esse fato prejudica os mais novos. Ao contrário: ajuda-os a entender que
amores e ódios são as duas faces da mesma moeda e, portanto, estarão sempre
presentes nos relacionamentos afetivos.
A todos, meu desejo de um ótimo Natal!
As crianças querem presentes, mas também se importam em
estar com a família toda reunida
Folha De S.Paulo 20 Dezembro 2016
21 de dez. de 2016
RETORNO :: Prisca Agustoni
Dessas distâncias
eu falo.
Digo céus digo homens
que caçam a origem.
Não voltarei
dessa plena distância.
Tenho a consistência do silêncio
primeiro.
Pois espero a floração das chegadas.
Parti para sempre,
com as histórias
órfãs de todos os invernos.
............
Da questa lontananza
io parlo.
Parlo cieli parlo uomini
che cacciano l'inizio.
Non ritornerò
da questa colma distanza.
Ho la consistenza del silenzio
primigenio.
Quindi aspetto la fioritura degli arrivi.
Sono partita per sempre,
assieme alle storie
dimentiche di tutti gli inverni.
20 de dez. de 2016
19 de dez. de 2016
Ah! O flamboyant!
Antonio Gomes Comonian
Era uma ruazinha simples
Sem nenhum encanto
Não havia pássaros, nem canto
Ao final daquela rua avistava-se uma árvore frondosa.
Flores alaranjadas bailavam no ar
Desatavam-se as folhas em um vôo livre rumo aos céus
O vento sorria extasiado com rara beleza
Ao chão, um tapete colorido e perfumado
Aproximei-me mais
Deixei-me fascinar
Gotas poéticas inundaram os meus olhos
A rua enchera de poesia
de cores e fantasias
Ah! O flamboyant!
Arnalda Rabelo
18 de dez. de 2016
Hino :: Jorge Luís Borges (1899-1986)
Esta manhã
há no ar a incrível fragrância
das rosas do Paraíso.
Na margem do Eufrates
Adão descobre a frescura da água.
Uma chuva de ouro cai do céu;
é o amor de Zeus.
Salta do mar um peixe
é um homem de Agrigento lembrará
ter sido ele esse peixe.
Na gruta cujo nome será Altamira
dedos sem rosto traçam a curva
de um lombo de bisonte.
A lenta mão de Virgílio acarinha
a seda trazida
do reino do Imperador Amarelo
por naus e caravanas.
O primeiro rouxinol canta na Hungria.
Jesus vê na moeda o perfil de César.
Pitágoras revela aos seus gregos
que a forma do tempo é a do círculo.
Numa ilha do Oceano
os lebréus de prata perseguem os veados de ouro.
Numa bigorna forjam a espada
que será fiel a Sigurd.
Whitman canta em Manhattan.
Homero nasce em sete cidades.
Uma donzela acaba de caçar
o unicórnio branco.
Todo o passado volta, é uma onda,
e essas antigas coisas regressam
porque uma mulher te beijou.
tradução de Fernando Pinto do Amaral
in Jorge Luis Borges. Obras Completas, vol III. Editorial Teorema,1998.
17 de dez. de 2016
Esquadros :: Adriana Calcanhotto
Eu ando pelo mundo
Prestando atenção em cores
Que eu não sei o nome
Cores de Almodóvar
Cores de Frida Kahlo
Cores!
Passeio pelo escuro
Eu presto muita atenção
No que meu irmão ouve
E como uma segunda pele
Um calo, uma casca
Uma cápsula protetora
Ai, Eu quero chegar antes
Para sinalizar
O estar de cada coisa
Filtrar seus graus
Eu ando pelo mundo
Divertindo gente
Chorando ao telefone
E vendo doer a fome
Nos meninos que têm fome
Pela janela do quarto
Pela janela do carro
Pela tela, pela janela
Quem é ela? Quem é ela?
Eu vejo tudo enquadrado
Remoto controle
Eu ando pelo mundo
E os automóveis correm
Para quê?
As crianças correm
Para onde?
Transito entre dois lados
De um lado
Eu gosto de opostos
Exponho o meu modo
Me mostro
Eu canto para quem?
Pela janela do quarto
Pela janela do carro
Pela tela, pela janela
Quem é ela? Quem é ela?
Eu vejo tudo enquadrado
Remoto controle
Eu ando pelo mundo
E meus amigos, cadê?
Minha alegria, meu cansaço
Meu amor, cadê você?
Eu acordei
Não tem ninguém ao lado
Pela janela do quarto
Pela janela do carro
Pela tela, pela janela
Quem é ela? Quem é ela?
Eu vejo tudo enquadrado
Remoto controle
Eu ando pelo mundo
E meus amigos, cadê?
Minha alegria, meu cansaço
Meu amor cadê você?
Eu acordei
Não tem ninguém ao lado
Pela janela do quarto
Pela janela do carro
Pela tela, pela janela
Quem é ela? Quem é ela?
Eu vejo tudo enquadrado
Remoto controle
16 de dez. de 2016
A fotografar vidas :: Dalila Teles Veras
capturo e eternizo
com o vidro despolido
de minha Yashica
teu sorriso, teu gesto
tua vida em começo
me surpreendo com a idéia
pueril, mágica e banal
de guardar as vidas
queridas
nas gavetas
rio-me
de minha onipotência
in "Lições de Tempo"
15 de dez. de 2016
Arco-íris
Chagall
Robert Henri
Jules Breton
William Bradford
Roland Petersen
Albert Bierstadt
Arkhip Kuindzhi
Arkhip Kuindzhi
14 de dez. de 2016
13 de dez. de 2016
Estou Tonto :: Fernando Pessoa (Álvaro de Campos)
Estou tonto,
Tonto de tanto dormir ou de tanto pensar,
Ou de ambas as coisas.
O que sei é que estou tonto
E não sei bem se me devo levantar da cadeira
Ou como me levantar dela.
Fiquemos nisto: estou tonto.
Afinal
Que vida fiz eu da vida?
Nada.
Tudo interstícios,
Tudo aproximações,
Tudo função do irregular e do absurdo,
Tudo nada.
É por isso que estou tonto ...
Agora
Todas as manhãs me levanto
Tonto ...
Sim, verdadeiramente tonto...
Sem saber em mim e meu nome,
Sem saber onde estou,
Sem saber o que fui,
Sem saber nada.
Mas se isto é assim, é assim.
Deixo-me estar na cadeira,
Estou tonto.
Bem, estou tonto.
Fico sentado
E tonto,
Sim, tonto,
Tonto...
Tonto.
12 de dez. de 2016
10 de dez. de 2016
Clarice Lispector
A Paixão segundo G. H
Registrada como Chaya Pinkhasovna Lispector (em russo Хая Пинхасовна Лиспектор), Clarice Lispector nasceu em 10 de dezembro de 1920 na aldeia de Chechelnyk, região da Podólia, então parte da República Popular da Ucrânia e hoje parte da moderna Ucrânia.
9 de dez. de 2016
7 de dez. de 2016
6 de dez. de 2016
Desato :: Viviane Mosé
É preciso fritar o arroz bastante antes de jogar água fervendo.
E não pode mexer jamais depois de a água ser posta.
O alho deve fritar no óleo junto com o arroz.
Coisas que eu sei e que não. Eu sei muitas coisas.
Faxina por exemplo. Sei limpar uma casa de tal modo
Que não sobra um canto que não tenha sido tocado
Por minhas mãos.
Depois vou sujando. Com muito gosto.
Deixo peças na sala e louças sujas na pia.
Não na mesma hora mas um pouco
Bastante depois volto limpando.
Assim me faço.
Nos objetos que me acompanham.
Gosto de andar nas ruas e comprar coisas
Que vão se arrumando em torno de mim.
Tenho muitas coisas, quero dizer, tenho muitas camadas.
Uma camada de livros outra de sapatos.
Tem a camada de plantas. E toalhas de rosto.
Tenho camadas de cosméticos e de adereços.
Uma camada de nomes e de coisas que vejo.
Tudo ordenado ao meu redor. Em forma de corpo.
Um corpo que me sustenta quando o meu próprio me falta.
Cadeiras são meus ossos. Sapatos são meus braços.
Torneiras em meus poros. Paredes como roupas de inverno.
(Quando toca música em minha casa sai do umbigo)
Descanso recostada nas paredes da casa
Que me guardam como um abraço.
Me abraço quando me derramo na sala.
E na cozinha. Em geral adormeço no quarto.
Tudo em minha casa tem existência.
Todas as coisas significo.
Com os olhos. Ou com as mãos.
Minha casa tem silêncios
Que às vezes ouço. Em meu corpo
Tem silêncios maiores ainda.
Que às vezes ouço. E faço poemas.
Faço poemas dos silêncios que ouço.
E não pode mexer jamais depois de a água ser posta.
O alho deve fritar no óleo junto com o arroz.
Coisas que eu sei e que não. Eu sei muitas coisas.
Faxina por exemplo. Sei limpar uma casa de tal modo
Que não sobra um canto que não tenha sido tocado
Por minhas mãos.
Depois vou sujando. Com muito gosto.
Deixo peças na sala e louças sujas na pia.
Não na mesma hora mas um pouco
Bastante depois volto limpando.
Assim me faço.
Nos objetos que me acompanham.
Gosto de andar nas ruas e comprar coisas
Que vão se arrumando em torno de mim.
Tenho muitas coisas, quero dizer, tenho muitas camadas.
Uma camada de livros outra de sapatos.
Tem a camada de plantas. E toalhas de rosto.
Tenho camadas de cosméticos e de adereços.
Uma camada de nomes e de coisas que vejo.
Tudo ordenado ao meu redor. Em forma de corpo.
Um corpo que me sustenta quando o meu próprio me falta.
Cadeiras são meus ossos. Sapatos são meus braços.
Torneiras em meus poros. Paredes como roupas de inverno.
(Quando toca música em minha casa sai do umbigo)
Descanso recostada nas paredes da casa
Que me guardam como um abraço.
Me abraço quando me derramo na sala.
E na cozinha. Em geral adormeço no quarto.
Tudo em minha casa tem existência.
Todas as coisas significo.
Com os olhos. Ou com as mãos.
Minha casa tem silêncios
Que às vezes ouço. Em meu corpo
Tem silêncios maiores ainda.
Que às vezes ouço. E faço poemas.
Faço poemas dos silêncios que ouço.
5 de dez. de 2016
O Novo Colosso :: Emma Lazarus 1849-1887
Não como o gigante bronzeado de grega fama,
Com pernas abertas e conquistadoras a abarcar a terra
Aqui nos nossos portões banhados pelo mar e dourados pelo sol, se erguerá
Uma mulher poderosa, com uma tocha cuja chama
É o relâmpago aprisionado e seu nome
Mãe dos Exílios. Do farol de sua mão
Brilha um acolhedor abraço universal; Os seus suaves olhos
Comandam o porto unido por pontes que enquadram cidades gémeas.
“Mantenham antigas terras sua pompa histórica!” grita ela
Com lábios silenciosos “Dai-me os seus fatigados, os seus pobres,
As suas massas encurraladas ansiosas por respirar liberdade
O miserável refugo das suas costas apinhadas.
Mandai-me os sem abrigo, os arremessados pelas tempestades,
Pois eu ergo o meu farol junto ao portal dourado.”.
o poema "O Novo Colosso" está gravado em uma placa de bronze presa no pedestal da Estátua da Liberdade.
O trenzinho do caipira :: Ferreira Gullar Ferreira Gullar - pseudônimo de José Ribamar Ferreira (10 de setembro de 1930, São Luís, Maranhão - 4 de dezembro de 2016)
Lá vai o trem com o menino
Lá vai a vida a rodar
Lá vai ciranda e destino
Cidade e noite a girar
Lá vai o trem sem destino
Pro dia novo encontrar
Correndo vai pela terra
Vai pela serra
Vai pelo mar
Cantando pela serra o luar
Correndo entre as estrelas a voar
No ar, no ar...
Lá vai o trem com o menino
Lá vai a vida a rodar
Lá vai ciranda e destino
Cidade e noite a girar
Lá vai o trem sem destino
Pro dia novo encontrar
Correndo vai pela terra
Vai pela serra
Vai pelo mar
Cantando pela serra o luar
Correndo entre as estrelas a voar
No ar, no ar..
2 de dez. de 2016
O Unicórnio :: Anne Morrow Lindbergh
O Unicórnio está imóvel,
contemplando,
resignado;
impassível, menos por seu chifre;
continua vivo em seu chifre;
horizontalmente,
preso;
perpendicularmente,
livre.
Como prisioneiro,
que contempla o céu à noite
e desdenha da prisão imposta
por grades e muros,
observando a imensa liberdade
da noite estrelada,
e encontra ali a sua felicidade:
então, o unicórnio
está livre.
O que é liberdade?
Aqui vive o Unicórnio,
cativo:
mas livre.
imagem: O unicórnio em cativeiro
1495-1505
Metropolitan Museum of Art, Nova Iorque
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