Uma coisa bonita era para se dar ou para se receber, não apenas para se ter. Clarice Lispector
11 de ago. de 2017
10 de ago. de 2017
TARDIO :: MIA COUTO
Quando quis ser fruto
fui fome,
não mais do que areia
de um chão sem cio.
Quando sonhei ser pano
fui agulha.
E morri no sono do gesto
de enrolar o fio.
Quando aprendi a ser poente
já não havia céu.
Quando quis anoitecer
tudo era luz.
E assim me condeno
em livre vício:
no mais derradeiro
eu só vislumbro um início.
Idades, cidades, divindades. Maputo, 2005
9 de ago. de 2017
Aspargo-samambaia (Asparagus setaceus )Aspargo, Aspargo-plumoso, Asparguinho-de-jadim, Melindre, Melindro
Categoria: Arbustos, Arbustos Tropicais, Folhagens, Trepadeiras
Clima: Equatorial, Mediterrâneo, Subtropical, Tropical
Origem: África, África do Sul
Altura: 0.9 a 1.2 metros, 1.2 a 1.8 metros, 1.8 a 2.4 metros, 2.4 a 3.0 metros, 3.0 a 3.6 metros
Luminosidade: Meia Sombra
Ciclo de Vida: Perene
O aspargo-samambaia é uma planta arbustiva e trepadeira, com folhagem de textura delicada e plumosa, muito decorativa. Suas raízes são fibrosas e os longos e ramificados ramos são modificados, do tipo cladódio. As folhas são verdes e afiladas, como pequenos espinhos, porém não são rígidas. O conjunto de ramos e folhas têm o aspecto das frondes de samambaias, o que lhe rendeu o nome popular. Na primavera e verão surgem numerosas flores brancas e minúsculas, de importância ornamental secundária, que originam frutos esféricos, pequenos, do tipo baga e de coloração preta.
O aspargo-samambaia pode ser conduzido como folhagem, em vasos com suportes fibrosos, da mesma forma que jibóias e filodendros. No jardim ele se comporta como arbusto ou trepadeira, e desta forma pode ser aproveitado em renques junto a muros e para cobrir cercas, telas, grades, etc. As principais variedades são Pyramidalis (de ramagem ereta), Nanus (de porte anão) e Cupressoides (com folhagem semelhante a de cipreste). Seus ramos também são utilizados em arranjos florais e buquês. Os frutos atraem passarinhos.
Deve ser cultivada sob meia-sombra, em solo fértil, drenável, enriquecido com matéria orgânica e irrigado regularmente. Podas anuais estimulam a renovação da folhagem. Aprecia o frio subtropical. Tolera estiagem e encharcamentos por períodos não muito prolongados. Se cultivada sob sombra, sua folhagem torna-se amarelada. Multiplica-se por sementes e por divisão da planta.
fonte: jardineiro.net
As janelas do meu quarto :: António Gedeão
nas paredes do meu quarto,
sem vidros nem bambinelas,
posso ver através delas,
o mundo em que me reparto.
Por uma entra a luz do sol,
por outra a luz do luar,
por outra a luz das estrelas,
que andam no céu a rolar.
Por esta entra a Via Láctea,
como um vapor de algodão,
por aquela a luz dos homens,
pela outra a escuridão.
Pela maior entra o espanto,
pela menor a certeza,
pela da frente a beleza,
que inunda de canto a canto.
Pela quadrada entra a esperança,
de quatro lados iguais,
quatro arestas, quatro vértices,
quatro pontos cardeais.
Pela redonda entra o sonho,
que as vigias são redondas,
e o sonho afaga e embala,
à semelhança das ondas.
Por além entra a tristeza,
por aquela entra a saudade,
e o desejo, e a humildade,
e o silêncio, e a surpresa.
E o amor dos homens, e o tédio,
e o medo, e a melancolia,
e essa fome sem remédio,
a que se chama poesia.
E a inocência, e a bondade,
e a dor própria, e a dor alheia,
e a paixão que se incendeia,
e a viuvez, e a piedade.
E o grande pássaro branco,
e o grande pássaro negro,
que se olham obliquamente,
arrepiados de medo.
Todos os risos e choros,
todas as fomes e sedes,
tudo alonga a sua sombra,
nas minhas quatro paredes.
Oh janelas do meu quarto,
que vos pudesse rasgar,
com tanta janela aberta,
falta-me a luz e o ar.
8 de ago. de 2017
4 de ago. de 2017
Bauernmalerei
Bauernmalerei significa, em tradução literal, "pintura campestre". Supõe-se que a técnica era inicialmente empregada para aprimorar, a partir do reaproveitamento artesanal de objetos metálicos ou de madeira, o ambiente do lar durante os longos períodos de guerra à que a Europa foi submetida até o século XX. Nos dias de hoje, ela é bastante difundida em todo o mundo graças à sua aura campestre e romântica
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
3 de ago. de 2017
DESCRIÇÃO DE SI MESMO JUNTO A UM COPO DE WHISKY NO AEROPORTO, DIGAMOS EM MINNEAPOLIS :: Czeslaw Milosz (1911-2004)
Meus ouvidos ouvem cada vez menos das conversas, meus olhos vão ficando mais fracos, mas não se fartaram.Vejo suas pernas em minissaias, em calças compridas ou tecidos voláteis,Observo uma a uma, suas bundas e coxas, pensativo, acalentado por sonhos pornô.Velho depravado, é a cova que te espera, não os jogos e folguedos da juventude.Não é verdade, faço apenas o que sempre fiz, compondo cenas dessa terra sob as ordens de uma imaginação erótica.Não desejo a estas criaturas, desejo tudo, e elas são como o signo de uma convivência extática.Não é minha culpa se somos feitos assim, metade contemplação desinteressada, e metade apetite.Se após a morte eu chegar ao Céu, lá deve ser como aqui, só que me terei desfeito da obtusidade dos sentidos e do peso dos ossos.Tornado puro olhar, sorverei ainda as proporções do corpo humano, a cor da íris, uma rua de Paris em junho de manhãzinha, toda a incompreensível, a incompreensível multidão das coisas visíveis.2000
1 de ago. de 2017
Uma defesa do 'crime' de rabiscar em livros :: Gilles Lapouge
André Martins de Barros
Não leio. Rabisco os livros. Eu os danifico. Coloco pontos de exclamação à margem. Sublinho palavras, risco os parágrafos. Acrescento “minha contribuição” à poesia que me deixa inebriado. Faço com que minha voz seja ouvida. Escrevo “bravo”, “exagerado” ou mesmo “magnífico”. Nos silêncios da narrativa engendro aventuras que o escritor não imaginou, mas seus heróis amariam viver. Às vezes critico o autor. Quando empresto um dos meus livros a um amigo, ele fica horrorizado: arruinei o “objeto sagrado”.Sacrilégio! Desnaturei o poema. Mereço passar meu inferno fechado em uma biblioteca, vigiado por um diabo especializado em literatura que irá me repreender toda vez que aponto meu lápis para macular a beleza imarcescível de uma página. Onde estou com a cabeça? Ousarei acrescentar um grafite na Capela Sistina de Michelangelo? Irei ao Museu Rodin levando comigo um pequeno martelo para extrair alguns fragmentos de mármore com o fim de “melhorar” O Beijo, ou a estátua de Balzac?
Mas hoje me sinto mais confiante. Soube pelo jornal The New York Times que a New Library de Chicago publicou um livro reproduzindo comentários e anotações feitas a lápis em seus livros por leitores como o presidente Lincoln, Alexander Pope, Jane Austen, Walt Whitman ou David Thoreau.
Um dos mais brilhares escritores políticos, o italiano Maquiavel, compartilhava comigo esse “vício”. Cobria seus livros de comentários marginais, apogiaturas, parênteses ou sinais incompreensíveis.
Também fiz uma pequena pesquisa e encontrei muitos “rabiscadores” de livros. O francês Montaigne, na Renascença, escreveu em seu próprio livro, Ensaios, inúmeros comentários ou objeções a ponto de no final compor um novo livro. O grande Petrarca escreveu no seu livro Confissões de Santo Agostinho tantas notas e comentários que serviram para um curso de filosofia, O Livre Arbítrio.
Meus “rabiscadores” preferidos são os mais tímidos. Aqueles que se contentam em acrescentar uma interjeição à margem, um comentário breve, ou simplesmente sinais de pontuação: pontos de exclamação, ou de interrogação. Eles não querem acrescentar ao texto original um novo texto. Sua ambição é outra: eles tatuam o livro, como algumas pessoas tatuam sua pele. Eles o esfolam, o dramatizam. Eles se apropriam do livro.
Do mesmo modo que os poetas brasileiros “antropofágicos”, eles comem as letras, as mastigam, as digerem, e é um romance desconhecido que surge no final das suas obscuras fermentações. Outros, mais ingênuos, se satisfazem em “fazer amor” com o livro.
Por mais minúsculas, modestas ou misteriosas que sejam essas impressões furtivas deixadas por um desconhecido em seu livro de cabeceira, essas anotações, esses escólios, esses riscos ou essas interjeições acrescentam uma frase ao discurso original e essa frase é bela: “Para o melhor ou pior, é o comentarista que tem a última palavra”, disse Nabokov.
Mesmo traços simples, verticais, horizontais ou em diagonal, podem falar. Há uma dezena de anos, minha irmã mais velha que eu amava muito faleceu. E eu me encarreguei de ordenar algumas centenas de livros que ela possuía. Passava rapidamente os olhos neles. Ouvia o silêncio, a morte.
Abri um cujo título era L’Echelle de Soie, de um autor conhecido nos anos 1960, mas um pouco esquecido nos dias de hoje, Jean- Louis Curtis. À medida que repassava aquelas páginas, percebi que não lia o romance de Curtis, mas os traços feitos por minha irmã nos brancos da página, sobre um adjetivo ou num trecho de uma frase, ou mesmo à margem. Vi assim se produzir diante dos meus olhos, com fragmentos de textos assinalados por minha irmã, do outro lado da morte, outro romance.
Guiado pelos traços feitos a lápis, nas margens do livro, eu lia: “Cada pessoa é um enigma para todos e para ela própria. E ela morre sem ter revelado nem compreendido seu próprio segredo”. E mais longe, “talvez nada seja preferível a essa tentativa incansável e sempre frustrada pela qual se busca fundir em um núcleo de vida as duas solidões de um casal”. Algumas passagens mais: “Eu me perguntei por qual encadeamento de encantos e malefícios pude amar Anne e sofrer por causa dela”.
Eu perguntei a mim mesmo então porque minha irmã havia extraído aquelas frases, aqueles pequenos fragmentos de texto.
Ligando aqueles fragmentos, interjeições, palavras sublinhadas, aqueles pontos de exclamação, reconstitui, me parece, uma história de amor infeliz que eu sabia que minha irmã tinha vivido quando era jovem e sobre a qual jamais contou a ninguém. E eis que nesse momento ela me fazia um relato desses anos dolorosos.
Senti-me indiscreto. E me dizia que os segredos jamais devem ser arrancados à força, mesmo se a morte permite que eles se façam ouvir. A morte em suma me propiciou abrir as gavetas de um armário proibido.
Recusei-me a ir mais longe e ver outras confidências. E ao mesmo tempo me perguntei por que foi preciso que a morte chegasse para que paisagens proibidas fossem exibidas? Por que foi necessário se fazer o silêncio da morte para o silêncio fazer um pouco de ruído?
Tradução de Terezinha Martino
Aliás, O Estado de S. Paulo 29 Julho 2017
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