Uma coisa bonita era para se dar ou para se receber, não apenas para se ter. Clarice Lispector
30 de jun. de 2020
TEXTOS DE SOMBRAALGUNS TEXTOS DE SOMBRA [ 1 ] :: Nina Rizzi
Oda al pan de Pablo Neruda
(...)
27 de jun. de 2020
Por que é importante aprender a cozinhar? Clarice Reichstul
Quando eu era criança, ia à casa da minha avó uma vez por semana. Comíamos sempre a mesma comida: frango assado, cogumelos refogados, batata na manteiga e, de sobremesa, strudel de maçã (um tipo de torta) com creme de leite.
De vez em quando, tinha um peixe frito, mas o forte mesmo era esse menu descrito aí. Nunca mais comi cogumelos refogados como os da casa da minha avó, mas esses momentos que passávamos por lá são inesquecíveis (talvez porque ela deixava a gente tomar guaraná, e a minha mãe não).
Eu aprendi a cozinhar com minha avó. Primeiro foram biscoitinhos amanteigados. Ela fazia a massa e a gente ficava cortando com os cortadores de estrela. Depois foi um estrogonofe de peixe, que ela havia ensinado ao meu pai, quando ele era pequeno.
Na época, ele precisou de uma receita para uma competição de culinária no grupo de escotismo (passou anos reclamando por ter ficado em segundo lugar). O que eu não percebia naquele momento e só fui reconhecer adulta é o quanto aprender a cozinhar é libertador.
Libertador porque não dependemos de outros para ter a nossa comida, porque eu não tenho medo de receita nenhuma e porque, quando fui morar sozinha, não passei pelo aperto de comer miojo todos os dias. Eu já sabia fritar um ovo e fazer arroz. O básico.
A formação de indivíduos independentes se faz de diversas maneiras, algumas bem comuns, como pela cozinha. Como diria a mestra Nina Horta, cozinhar é um modo de se ligar.
25 de jun. de 2020
Minha santa constância :: Noemi Jaffe
23 de jun. de 2020
Poema : : Herberto Helder
irmãos humanos que depois de mim vivereis,
eu que fui obrigado a viver dobrados os oitenta,
fazei por acabar mais cedo vossos trabalhos cegos,
porque nestas idades já não nunca,
nem leituras embrumadas,
nem crenças, nem política das formas, nem poemas no futuro, nem
visitas extraterrestres de mulheres
exorbitantemente
nuas, cruas, sexuais, luminosas,
só vê-las um pouco, sim, mas vê-las também cansa,
é como trabalhar: stanca,
lavorare stanca,
queríamos tanto acreditar no milagre isabelino do pão e das rosas,
e só tínhamos que perder a alma,
hoje talvez eu mesmo acreditasse melhor, mas foi-se tudo,
enfim esses jogos gerais, ao tempo que se esgotaram!
livros, je les aí lus tous, e como de costume a carne é insondável,
estou mais pobre do que ao comêço,
e o mundo é pequeníssimo, dá-se-lhe corda, dá-se uma volta,
meia volta, e já era,
irmãos futuros do gênio de Villon e do meu gênero baixo,
não peço piedade, apenas peço:
não me esqueceis só a mim, esquecei a geração inteira,
inclitamente vergonhosa,
que em testamento vos deixou esta montanha de merda:
o mundo como vontade e representação que afinal é como era,
como há-de ser: alta,
alta montanha de merda — trepai por ela acima até à vertigem,
merda eminentíssima:
daqui se vêem os mistérios, os mesteres, os ministérios,
cada qual obrando a sua própria magia:
merda que há-de medrar melhor na memória do mundo
Servidões, 2013.
22 de jun. de 2020
Somente para seus olhos de Andrea Dutra
eu guardo o nosso segredo como se guarda, escondida no fundo da gaveta, uma jóia dentro de uma caixa forrada de veludo, enrolada no lenço de seda. ou como se perde, entre as folhas de um livro, uma folha seca que a gente pegou no chão daquele dia especial de outono. um dia a gente abre o livro e dá de cara com a cena. guardo os instantâneos da nossa vida na retina, milhares de quadros por segundo. não tiramos nenhuma foto juntos, mesmo qdo o sol listrava de cor de rosa o céu azul do arpoador. não postamos nossos pés sujos de areia no instragram. a gente anda na rua sem dar as mãos, mas trocamos olhares. não vamos publicar nenhuma das nossas felicidades, não vamos postar nada. não temos amigos em comum, não moramos na mesma cidade. nós moramos na nuvem. agora, falamos menos. nos olhamos mais. sorrimos, e ficamos calados, lado a lado. a paz reina. qdo nos vemos vem lua vai sol vem noite vai dia. somos completamente.
21 de jun. de 2020
De Valter Hugo Mãe para Marcelino Freire:Marcelino, tenho medo de voltar ao seu país porque cresci relutante para ser adulto e sei que me mantenho em tantas coisas apenas uma criança.
15 de jun. de 2020
INSTRUÇÕES PARA ESQUIVAR O MAU TEMPO :: Paco Urondo (Santa Fe, Argentina 1930 - 17 de junio de 1976)
Refugie-se em casa e feche as trancas quando todos os seus estiverem a salvo.
Compartilhe o mate e a conversa com os companheiros, os beijos furtivos e as noites clandestinas com quem lhe assegure ternura.
Não deixe que a estupidez se imponha.
Defenda-se.
Contra a estética, ética.
Esteja sempre atento.
Não lhes bastará empobrecê-lo, e quererão subjugá-lo com sua própria tristeza.
Ria ostensivamente.
Tire sarro: a direita é mal comida.
Será imprescindível jantar juntos a cada dia até que a tormenta passe.
São coisas simples, mas nem por isso menos eficazes.
Diga para o lado bom dia, por favor e obrigado.
E tomar no cu quando o solicitem de cima.
Dê tudo o que tiver, mas nunca sozinho.
Eles sabem como emboscá-lo na solidão desprevenida de uma tarde.
Lembre que os artistas serão sempre nossos.
E o esquecimento será feroz com o bando de impostores que os acompanha.
Tudo vai ficar bem se você me ouvir.
Sobreviveremos novamente, estamos maduros.
Cuidemos dos garotos, que eles quererão podar.
Só é preciso se munir bem e não amesquinhar amabilidades.
Devemos ter à mão os poemas indispensáveis, o vinho tinto e o violão.
Sorrir aos nossos pais como vacina contra a angústia diária.
Ser piedosos com os amigos.
Não confundir os ingênuos com os traidores.
E, mesmo com estes, ter o perdão fácil quando voltarem com as ilusões acabadas.
Aqui ninguém sobra.
E, isto sim, ser perseverantes e tenazes, escrever religiosamente todos os dias, todas as tardes, todas as noites.
Ainda sustentados em teimosias se a fé desmoronar.
Nisso, não haverá trégua para ninguém.
A poesia dói nesses filhos da puta.
12 de jun. de 2020
Dia dos Namorados
10 de jun. de 2020
Olhos parados :: Manoel de Barros
8 de jun. de 2020
Nomear :: Mario Quintana
Treino e(m) poema (um trecho) :: Kazuo Ohno
que se assemelha a um pássaro, um pássaro
feito de espírito – será que ele conseguirá
penetrar no seu espírito sem dificuldade?
Seus olhos estão prontos para permitir sua
entrada? Quando o pássaro está prestes
a entrar, será que você dança com olhos que
o acolhem? Sempre em movimento, com
leveza – é preciso dançar com leveza para
que ele seja acolhido. Como se houvesse
uma porta de entrada e saída do espírito,
uma porta fundamental. Será que o que
nasce com isso é a sua alegria ou a sua
tristeza? O que se passa? No seu ir e vir,
o pássaro bate as asas – é a sua alma que
bate asas de alegria? Ou seria de tristeza?
A realidade muda a todo instante, não é
mesmo? Cuide bem de seus olhos, existem
danças assim, só de olhos. Veja bem, há todo
um mundo que é apenas deles. Então é isso,
vamos tentar com olhos assim.
1 de jun. de 2020
A palavra seda de João Cabral de Melo Neto
28 de mai. de 2020
Madeira-de-sonho :: Adrienne Rich
ou o eu mais velho da criança,
uma mulher sonhando quando devia estar a bater à máquina
o último relatório do dia. Se isto fosse um mapa,
pensa ela, um mapa decretado para memorizar
podendo ela talvez percorrê-lo, ele mostra
cordilheira atrás de cordilheira esbatendo-se no deserto nebulento,
aqui e além um sinal de aquíferos
e um possível bebedouro. Se isto fosse um mapa
seria o mapa da última idade da sua vida,
não um mapa de escolhas mas um mapa de variações
sobre a escolha maior. Seria o mapa pelo qual
ela poderia ver o fim das escolhas turísticas,
de distâncias azuladas e arroxeadas de romantismo,
pelo qual ela reconheceria que a poesia
não é revolução mas uma forma de saber
por que tem de vir a revolução. Se esta mesinha de madeira baratucha,
produzida em massa, vinda da Companhia de Gás de Brooklyn,
produzida em massa porém duradoura, presente agora aqui,
é o que é porém um mapa-de-sonho
tão renitente, tão simples,
pensa ela, o material e o sonho podem juntar-se
e isso é o poema e isso é o relatório retardatário.
Uma Paciência Selvagem. Editora Cotovia, 2008.
25 de mai. de 2020
Balanço de Débora Siqueira Bueno
18 de mai. de 2020
11 de mai. de 2020
Casa antiga :: Cecilia Meireles
8 de mai. de 2020
4 de mai. de 2020
O Haver :: Vinicius de Moraes
Jardim Noturno: poemas inéditos. Companhia das Letras - São Paulo, 1993. p. 17.
Uma imagem de prazer :: Clarice Lispector
Conheço em mim uma imagem muito boa, e cada vez que eu quero eu a tenho, e cada vez que ela vem ela aparece toda. É a visão de uma flor...
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Tem de haver mais Agora o verão se foi E poderia nunca ter vindo. No sol está quente. Mas tem de haver mais. Tudo aconteceu, Tu...
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A ilha da Madeira foi descoberta no séc. XV e julga-se que os bordados começaram desde logo a ser produzidos pel...