15 de jan. de 2007

Não Sei Para Que Me Morreste Porque É Inútil :: João Bosco da Silva

Não sei para que me morreste porque é inútil

Não sei para que me morreste, mas também nunca percebi a morte, ou a vida, para quê uma se

A outra está para reduzir tudo a nada, nem cinzas, e os ossos anónimos não fosse o nome sobre

O qual as lágrimas dos que ficaram a ser menos e cada vez menos, não sei para que me morreste,

A égua já deve estranhar a tua ausência, porque hoje não é Domingo e tu de gravata, deitado, a estas

Horas, sem teres bebido gota de vinho e quero acreditar que por isso tão sossegado, não sei onde

Irei depois da festa do Verão amanhecer, agora que a carroça ficará de pernas para o ar e a madeira

Desistirá e cederá todos os anos que aguentou, ao caruncho e os melões ficarão a apodrecer, a vinha

Morrerá de sede do teu suor e o teu vinho não voltará a encher aquela caneca que parecia ir ficar

Pela eternidade fora em cima da lareira, do teu lado pelas noites frias fora, dos rigorosos Invernos

Da terra esquecida pelo país a que dizem que pertence, não sei para que me morreste, mas desculpa

Contrariar-te e roubar um pouco de ti que guardarei até eu morrer para os outros, podes fechar os

Olhos, podes não voltar a contar-me com orgulho a história do jogo da sardinha, que fui eu

Que escrevi nos teus olhos que não sabiam ler, junto à mesma lareira, podes não voltar a fazer batota

Na bisca dos nove, podes esquecer-te de mim, obrigado, eu sei como funcionam as sinapses e é

Na sua união que vive a alma, podes morrer-me, mas prometo-te e que me desculpe a morte,

Que os raios partam, que nunca te deixarei morrer de todo, não enquanto nas minhas veias correr

O teu sangue, não enquanto o dia me permitir acordar e ter saudades tuas, sentado debaixo daquela

Macieira, enquanto as vacas pastavam, com um pedaço de cortiça e uma faca nas mãos,

Com o teu ar de eternidade, as tuas mãos de raiz de castanheiro e cepa e da cortiça dois

Bois e eu convencido que era o neto de um deus real, por isso perdoo o teu coração humano, cansado

Pelos anos, calejado pelos dias, não sei para que me morreste, porque é inútil, nunca me morrerás.


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