23 de fev. de 2012

Em algum lugar de E. E. Cummings

Tarsila do Amaral - Vaso com rosas (1919)

nalgum lugar em que eu nunca estive, alegremente além
de qualquer experiência, teus olhos têm o seu silêncio:
no teu gesto mais frágil há coisas que me encerram,
ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto

teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
embora eu tenha me fechado como dedos, nalgum lugar
me abres sempre pétala por pétala como a Primavera abre
(tocando sutilmente, misteriosamente) a sua primeira rosa

ou se quiseres me ver fechado,  eu e
minha vida nos fecharemos belamente, de repente,
assim como o coração desta flor imagina
a neve cuidadosamente descendo em toda a parte;

nada que eu possa perceber neste universo iguala
o poder de tua imensa fragilidade: cuja textura
compele-me com a cor de seus continentes,
restituindo a morte e o sempre cada vez que respira

(não sei dizer o que há em ti que fecha
e abre; só uma parte de mim compreende que a
voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas

( tradução: Augusto de Campos )

em algum lugar onde nunca estive, e felizmente aquém
de qualquer experiência, teus olhos guardam seu silêncio:
em teu gesto mais frágil há coisas que me envolvem
ou que não posso tocar porque estão muito próximas

teu olhar mais leve facilmente me descerra
embora eu me tenha fechado como dedos, 
e me entreabres sempre, pétala por pétala, como a Primavera 
(por toques habilidosos, misteriosamente) ante a primeira rosa 

ou se teu desejo é me fechar, eu e
minha vida nos fecharemos formosa e rapidamente 
como quando o coração desta flor imagina 
que a neve — cuidadosamente — está caindo em toda a parte; 

nada do que podemos perceber neste mundo se compara
ao poder de tua imensa fragilidade: cuja textura 
me compromete com a cor de seus países 
e me entrega para sempre a morte cada vez que respiro 

(nada sei do que te faz tão poderosa
ao me mover; mas algo em mim compreende apenas 
que a voz de teus olhos é mais profunda que todas as rosas) 
ninguém, nem mesmo a chuva, tem as mãos assim tão pequenas.

tradução de Jorge Wanderley

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