Por poder de sugestão, entenda-se aquele misterioso dom que certas casas têm de sugerir a vida dos que já moraram nela. Não pelas manchas e estragos que lhe deixaram antigos moradores, mas exatamente pelas marcas invisíveis que suas paredes recolheram e o tempo fixou.
Essas marcas devem nascer do soalho sob as passadas do morador, correr ao longo das tábuas do teto aos olhos insones que nele se distraem, participar dos próprios ruídos que ajudam a adormecer: o da água caindo na caixa, os talidos de madeira no escuro, o rincho de uma porta ou dos degraus da escada; devem efluir dos trincos e maçanetas, da sombra na parede, terror de uma infância, do vento que infla a cortina. Devem, enfim, impregnar cada canto da casa, estas marcas de tradição que ela carrega em seu bojo como uma carga de navio, a que vai se juntar a do novo morador, dando-lhe novo espírito, e finalmente a absorve”
in No fim dá certo, Record, 2007, pg. 134)
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