Angelo Savelli
Por mais que olhe o quadro, não me canso dele. Pelo contrário, ele me renova.
Nele, Maria está sentada perto de uma janela e vê-se pelo volume de seu ventre que está grávida . O arcanjo , de pé ao seu lado, olha-a . E ela, como se mal suportasse o que lhe fora anunciado como destino seu e destino para a humanidade futura através dela, Maria aperta a garganta com a mão, em surpresa e angústia .
O anjo, que veio pela janela, é quase humano : só suas longas asas é que lembram que ele pode se transladar sem ser pelos pés. As asas são muito humanas: carnudas, e o seu rosto é o rosto de um homem.
É a mais bela e cruciante verdade do mundo.
Cada ser humano recebe a anunciação: e, grávido de alma, leva a mão à garganta em susto e angústia . Como se houvesse para cada um, em algum momento da vida, a anunciação de que há uma missão a cumprir .
A missão não é leve: cada homem é responsável pelo mundo inteiro .
In: A Descoberta do Mundo. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1984. p. 232
Um comentário:
Primeiro li a crônica de Clarice Lispector, depois fui procurar a pintura. Confesso que imaginei uma outra Maria, um outro anjo
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