27 de mar. de 2015

Disritmia :: Adélia Prado

Os velhos cospem sem nenhuma destreza

e os velocípedes atrapalham o trânsito no passeio.

O poeta obscuro aguarda a crítica

e lê seus versos, as três vezes por dia,

feito um monge com seu livro de horas.

A escova ficou velha e não penteia.

Neste exato momento o que interessa

são os cabelos desembaraçados.

Entre as pernas geramos e sobre isso

se falará até o fim sem que muitos entendam:

erótico é a alma.

Se quiser, ponho agora a ária na quarta corda,

para me sentir clemente e apaziguada.

O que entendo de Deus é sua Ira,

não tenho outra maneira de dizer.

As bolas contra a parede me desgostam,

mas os meninos riem satisfeitos.

Tarde como a de hoje, vi centenas.

Não sinto angústia, só uma espera ansiosa.

Alguma coisa vai acontecer.

não existe o destino.

Quem é premente é Deus.

In:  Poesia Reunida. Siciliano.

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