Veste uma camisa limpa antes de morrer, dizem os russos.
Por favor, nada com baba, nódoas de ovo, sangue
suor, esperma.
Queres-me limpa, Deus,
por isso vou tentar obedecer.
O chapéu com que me casei,
servirá?
Branco, largo com um pequeno bouquet de flores falsas.
É antiquado, com tanto estilo como um percevejo,
mas fica bem morrer com algo nostálgico.
E vou levar
a minha bata de pintar
lavada vezes sem conta, claro
manchada com cada cozinha amarela que pintei.
Deus, não te importas que eu leve todas as minhas cozinhas?
Elas contêm o riso da família e a sopa.
Como soutien
(precisamos mesmo mencionar isso?)
o preto acolchoado que tanto irritava o meu amante
quando eu o despia.
Ele dizia: “para onde foi aquilo tudo?”
E levarei
a saia de grávida do meu nono mês
uma janela para a barriga do amor
que deixou cada bebê sair como uma maçã,
as águas a rebentar no restaurante.
Como roupa íntima escolherei algodão branco,
as calcinhas da minha infância,
pois era uma máxima da minha mãe
que as meninas boas apenas usavam algodão branco.
Seria perfeitamente agradável para mim
morrer como uma boa menina
cheirando a desinfetante.
Mas tendo dezesseis-anos-nas-calcinhas
morreria cheia de perguntas.
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