Um caco de azulejo sobre uma flanela surrada
algumas contas dispersas de um terço desfeito.
E o passado chegando em fiapos.
Um saco de retalhos, uma torneira fosca
entre parafusos. Um anel que vinho no doce.
Miçangas no ar a morrinha do tempo.
Um pé de meia solteira, de onde surgiu
aquele botão florido, um ajuste no paletó do tio.
Última lembrança da louça antes de partir.
Um número descolado da fachada
que poupou tantas visitas
e extraviou todas as cartas.
Uma xícara rachada, guardada bem no desenho da moça.
Uma carcaça de chuveiro, um vazamento na saudade
uma resistência, queimada.
O pai à cabeceira desfiando com a cadeira de palhinha.
Nove lustres de vidro, uma beleza passageira
no dia do eterno despercebido.
Uma renda quase branca, no tom dos ancestrais.
Um café tão doce quanto o dedinho de prosa,
que cantiga era aquela mesmo?
Um santinho colorido do qual esqueci o nome
um bordado no puído, um outro jeito de ter brio.
Mecha de cabelo, lata de engraxar sapato.
A dor nos panos de pranto, o medo às três da manhã.
Ter de lidar com o tanto de saudade da irmã
e o incômodo das rimas acidentais.
Um cabo de panela solto, um mimo, um agnus-dei
uma piada esquecida, frouxa, uma rua que me lembra
o que na ferrugem dela vai comigo.
Um vidro de graxa, uma polia desencaixada
para sempre de qualquer expectativa.
A chave certa, sem fechadura.
O botão da cortina encomendada pro casório, uma aspirina
diária pra modo de não enfartar, um palavrório
providencial, dissolvido na dúvida.
Uma costela de adão num vaso equilibrado
sobre uma lata de goiabada. Um nó de pinho de riga
no chão, um taco tirado do peito.
Uma concha achada incrível, no mar de Guarapari
um susto horizontal, a promessa de voltar
qualquer hora à Mantiqueira.
Um prego no colchão me levanta e deitam molas
brocas de cisma, pigarro na garganta.