Sou um péssimo público para a minha memória.
Ela quer que eu ouça sua voz incessantemente,
mas eu me agito, tusso
ouço e não ouço,
saio, volto e saio de novo.
Ela requer todo o meu tempo e atenção.
Quando durmo, é fácil para ela.
De dia já nem tanto, o que a magoa.
Me propõe zelosamente velhas cartas, fotos,
revolve fatos importantes e desimportantes,
devolve a vista para paisagens ignoradas,
e povoa-as com os meus mortos.
Nos seus relatos sou sempre mais jovem.
Isso é bom, mas por que sempre essa história?
Cada espelho me dá outras notícias.
Irrita-se quando dou de ombros.
E então se vinga remexendo todos os meus erros,
graves, mas que já não pesam.
Me olha nos olhos, espera minha reação.
Por fim me consola; podia ter sido pior.
Quer que agora eu viva só para ela e com ela.
De preferencia num quarto escuro e fechado,
mas nos meus planos ainda figuram o sol presente,
as nuvens atuais, as estradas correntes.
Às vezes fico farta de sua companhia.
Proponho nos separarmos. De hoje para sempre.
Então sorri com complacência,
sabe que também para mim seria uma condenação.
Trad.: Regina Przybycien
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