15 de abr. de 2017

TEM AQUELES QUE TEM AQUELES QUE :: Wislawa Szymborska

Tem aqueles que executam a vida de modo eficaz,
põem ordem em si mesmos e ao seu redor.
Têm resposta correta e jeito para tudo.

Adivinham logo quem a quem, quem com quem,
com que objetivo, por onde.

Batem o carimbo nas verdades únicas,
colocam no triturador os fatos desnecessários,
e as pessoas desconhecidas
em fichários de antemão destinados a elas.

Pensam só o quanto vale a pena,
nem um instante mais,
pois detrás desse instante espreita a dúvida.

E quando recebem dispensa da existência,
deixam o posto
pela porta indicada.

Às vezes os invejo
— por sorte isso passa.

13 de abr. de 2017

Abril florecía :: ANTONIO MACHADO

Abril florecía 
frente a mi ventana. 
Entre los jazmines 
y las rosas blancas 
de un balcón florido, 
vi las dos hermanas. 
La menor cosía, 
la mayor hilaba ... 
Entre los jazmines 
y las rosas blancas, 
la más pequeñita, 
risueña y rosada 
?su aguja en el aire?, 
miró a mi ventana. 

La mayor seguía 
silenciosa y pálida, 
el huso en su rueca 
que el lino enroscaba. 
Abril florecía 
frente a mi ventana. 

Una clara tarde 
la mayor lloraba, 
entre los jazmines 
y las rosas blancas, 
y ante el blanco lino 
que en su rueca hilaba. 
?¿Qué tienes ?le dije? 
silenciosa pálida? 
Señaló el vestido 
que empezó la hermana. 
En la negra túnica 
la aguja brillaba; 
sobre el velo blanco, 
el dedal de plata. 
Señaló a la tarde 
de abril que soñaba, 
mientras que se oía 
tañer de campanas. 
Y en la clara tarde 
me enseñó sus lágrimas... 
Abril florecía 
frente a mi ventana. 

Fue otro abril alegre 
y otra tarde plácida. 
El balcón florido 
solitario estaba... 
Ni la pequeñita 
risueña y rosada, 
ni la hermana triste, 
silenciosa y pálida, 
ni la negra túnica, 
ni la toca blanca... 
Tan sólo en el huso 
el lino giraba 
por mano invisible, 
y en la oscura sala 
la luna del limpio 
espejo brillaba... 
Entre los jazmines 
y las rosas blancas 
del balcón florido, 
me miré en la clara 
luna del espejo 
que lejos soñaba... 
Abril florecía 
frente a mi ventana.

10 de abr. de 2017

EURÍDICE :: Arseni Tarkovski

Uma pessoa tem um corpo,
Um só, sozinho.
A alma já está farta
De ficar confinada dentro
De uma caixa, com orelhas e olhos
Do tamanho de moedas,
Feita de pele — só cicatrizes —
Cobrindo um esqueleto.

Pela córnea ela voa
Para a cúpula do céu,
Sobre um raio gélido,
Até uma rodopiante revoada de pássaros,
E ouve pelas grades
Da sua prisão viva
O crepitar de florestas e milharais,
O troar de sete mares.

Uma alma sem corpo é pecaminosa
Como um corpo sem camisa —
Nenhuma intenção, nem um verso.
Uma charada sem solução:
Quem vai voltar
Ao salão depois do baile,
Quando não há ninguém para dançar?

E eu sonho com uma alma diferente
Vestida com outras roupas:
Que se inflama enquanto corre
Da timidez à esperança;
Pura e sem sombra,
Como fogo, ela percorre a Terra,
Deixa lilases sobre a mesa
Para que se lembrem dela.

Então continua a correr, criança, não te aflige
Por causa da pobre Eurídice;
Continua a rodar teu aro de cobre,
Corre com ele mundo afora,
Enquanto, em notas firmes
De tom alegre e frio,
Em resposta a cada passo que deres,
A Terra soar em teus ouvidos.


9 de abr. de 2017

A violência :: Erich Fried

A violência não começa
quando alguém estrangula alguém.
ela começa quando alguém diz
“Eu te amo:
você me pertence!”


A violência não começa
quando pacientes são mortos
Ela começa quando alguém diz
“Você está doente
tem de fazer o que eu digo!”

A violência não começa
quando pais
dominam os filhos obedientes
e quando papas e professores e pais
exigem autodomínio.

A violência impera onde o Estado diz:
“Para combater a violência
não pode haver mais violência
exceto a minha violência!”

A violência impera
onde alguém ou algo
é tão superior ou tão sagrado
para ser ainda criticado

Ou onde à crítica nada se permite fazer
além de falar
e aos superiores e aos sagrados
se permite mais do que falar

A violência impera onde se diz
“você pode usar de violência”
mas também onde se diz:
“você não pode usar de violência!”

A violência impera lá
onde ela encarcera seus opositores
e os calunia
como insufladores da violência.

A carta magna da violência
diz: “Certo é o que fazemos
o que os outros fazem
é a violência!"

A violência nunca se
supera com violência
mas nem sempre também
sem violência

tradução de Simone Brantes

„Die Gewalt“
Die Gewalt fängt nicht an,
wenn einer einen erwürgt.
Sie fängt an, wenn einer sagt:
„Ich liebe dich:
du gehörst mir!“

Die Gewalt fängt nicht an,
wenn Kranke getötet werden.
Sie fängt an, wenn einer sagt:
„Du bist krank:
Du musst tun, was ich sage!“

Die Gewalt fängt an,
wenn Eltern
ihre folgsamen Kinder beherrschen,
und wenn Päpste und Lehrer und Eltern
Selbstbeherrschung verlangen.

Die Gewalt herrscht dort wo der Staat sagt:
„Um die Gewalt zu bekämpfen
darf es keine Gewalt mehr geben
außer meiner Gewalt!“

Die Gewalt herrscht
wo irgendwer oder irgend etwas
zu hoch ist oder zu heilig,
um noch kritisiert zu werden.

Oder wo die Kritik nichts tun darf,
sondern nur reden,
und die Heiligen und die Hohen
mehr tun dürfen als reden.

Die Gewalt herrscht dort wo es heißt:
„Du darfst Gewalt anwenden!“
Aber auch dort wo es heißt:
„Du darfst keine Gewalt anwenden!“

Die Gewalt herrscht dort,
wo sie ihre Gegner einsperrt
und sie verleumdet
als Anstifter zur Gewalt.

Das Grundgesetz der Gewalt
lautet: „Recht ist, was wir tun.
Und was die anderen tun,
das ist Gewalt!“.

Die Gewalt kann man vielleicht nie
mit Gewalt überwinden,
aber auch nicht immer
ohne Gewalt.

Artesanato com miçangas - foto de Alexandre Disaro


7 de abr. de 2017

POR UM ACASO :: Wislawa Szymborska (1923, Bninie, Polônia)


Poderia ter acontecido.
Teve que acontecer.
Aconteceu antes. Depois. Mais perto. Mais longe.
Aconteceu, mas não com você.
Você foi salvo pois foi o primeiro.
Você foi salvo pois foi o último.
Porque estava sozinho. Com outros. Na direita. Na esquerda.
Porque chovia. Por causa da sombra.
Por causa do sol.
Você teve sorte, havia uma floresta.
Você teve sorte, não havia árvores.
Você teve sorte, um trilho, um gancho, uma trave, um freio,
um batente, uma curva, um milímetro, um instante.
Você teve sorte, o camelo passou pelo olho da agulha.
Em conseqüência, porque, no entanto, porém.
O que teria acontecido se uma mão, um pé,
a um passo, por um fio
de uma coincidência.
Então você está aí? A salvo, por enquanto, das tormentas em curso?
Um só buraco na rede e você escapou?
Fiquei mudo de surpresa.
Escuta,
como seu coração dispara em mim.

Uma imagem de prazer :: Clarice Lispector

     Conheço em mim uma imagem muito boa, e cada vez que eu quero eu a tenho, e cada vez que ela vem ela aparece toda. É a visão de uma flor...