Uma coisa bonita era para se dar ou para se receber, não apenas para se ter. Clarice Lispector
18 de out. de 2022
11 de out. de 2022
O Impossível Carinho :: Manuel Bandeira
3 de out. de 2022
Hilda Hilst :: Do Amor
Como se te perdesse, assim te quero
Como se te perdesse, assim te quero
Como se não te visse (favas douradas
Sob um amarelo) assim te apreendo brusco
Inamovível, e te respiro inteiro
Um arco-íris de ar em águas profundas.
Como se tudo o mais me permitisses,
A mim me fotografo nuns portões de ferro
Ocres, altos, e eu mesma diluída e mínima
No dissoluto de toda despedida.
Como se te perdesse nos trens, nas estações
Ou contornando um círculo de águas
Removente ave, assim te somo a mim:
De redes e de anseios inundada.
26 de set. de 2022
Discurso na seção de achados e perdidos :: Wislawa Szymborska
Fernand Leger
Perdi algumas deusas no caminho do sul ao norte,
e também muitos deuses no caminho do oriente ao ocidente.
Extinguiram-se para sempre umas estrelas, abra-se o céu.
Uma ilha, depois outra mergulhou no mar.
Nem sei direito onde deixei minhas garras,
quem veste meu traje de pelo, quem habita minha casca.
Morreram meus irmãos quando rastejei para a terra,
e somente certo ossinho celebra em mim este aniversário.
Eu saía da minha pele, desbaratava vértebras e pernas,
perdia a cabeça muitas e muitas vezes.
Faz muito que fechei meu terceiro olho para isso tudo.
Lavei as barbatanas, encolhi os galhos.
Dividiu-se, desapareceu, aos quatro ventos se espalhou.
Surpreende-me quão pouco de mim ficou:
uma pessoa singular, na espécie humana de passagem,
que ainda ontem perdeu somente a sombrinha no trem.
In:_____. Poemas. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
19 de set. de 2022
12 de set. de 2022
AUSÊNCIA :: MARÍA EUGENIA RAMOS (Tegucigalpa, Honduras, 26 de noviembre de 1959)
Alguém se foi
e deixou todos os cadernos
abertos na página 21,
servidos o café
e o feijão
na mesa,
quente
a casa por fazer,
o cão
esperando a comida,
uma hora marcada para o amor
colocada a secar na janela
e os vazios do guarda-roupa
o odor dos sonhos.
.................
Alguien se fue
y dejó todos los cuadernos
abiertos en la ágina 21,
servidos el café
y los frijoles
en la mesa,
caliente
la cama sin hacer,
el perro
esperando su comida,
una cita de amor
puesta a secar en la ventana
y en los vacíos del ropero
el olor de los sueños.
Tradução de Antonio Miranda
5 de set. de 2022
Eucanaã Ferraz, "Acontecido"
Mary Jane Glauber
1 de set. de 2022
Pobres, verdadeiramente pobres :: Eduardo Galeano (1940-2015)
Pobres, verdadeiramente pobres, são os
que não têm tempo para perder tempo
Pobres, verdadeiramente pobres, são os que não têm silêncio e nem podem comprá-lo.
Pobres, verdadeiramente pobres, são os que têm pernas que se esqueceram de andar, como as asas das galinhas, que se esqueceram de voar.
Pobres, verdadeiramente pobres, são os que comem lixo e pagam por ele como se fosse comida.
Pobres, verdadeiramente pobres, são os que têm o direito de respirar merda, como se fosse ar, sem pagar nada por ela.
Pobres, verdadeiramente pobres, são os que não têm liberdade senão para escolher entre um e outro canal de televisão.
Pobres, verdadeiramente pobres, são os que vivem dramas passionais com as máquinas.
Pobres, verdadeiramente pobres, são os que sempre são muitos e sempre estão sós.
Pobres, verdadeiramente pobres, são os que não sabem que são pobres.
De pernas pro ar. tradução Sergio Faraco. L&PM, 1998.
30 de ago. de 2022
Coleus (Plectranthus)
Coleus é presentemente considerado um sinónimo taxonómico de Plectranthus.
O termo "coleus" (ou "cóleus") é frequentemente utilizado como um nome comum para algumas das espécies anteriormente integradas no extinto género Coleus que são cultivadas e comercializadas como plantas ornamentais.
A lista que se segue apresenta a equivalência entre os nomes científicos tradicionalmente utilizados e a corrente estruturação do género Plectranthus:
Coleus blumei = Coleus scutellarioides = Plectranthus scutellarioides = Solenostemon scutellarioides
Coleus amboinicus = Plectranthus amboinicus
Coleus barbatus = Plectranthus barbatus
Coleus caninus = Plectranthus caninus
Coleus edulis = Plectranthus edulis
Coleus esculentus = Plectranthus esculentus
Coleus forskohlii = Plectranthus barbatus
Coleus rotundifolius = Plectranthus rotundifolius
29 de ago. de 2022
Combate :: CLEMENTINA SUÁREZ (Honduras 1906-1991)
Eu sou um poeta,
um exército de poetas.
E hoje quero escrever um poema,
um poema de apitos
um poema fuzis.
Para pregá-los nas portas,
nas selas das prisões
nos muros das escolas.
Hoje quero construir e destruir,
erigir andaimes de esperança.
Despertar a criança
arcanjo das espadas,
ser relâmpago, trovão,
com estatura de herói
para abater, arrasar,
as podres raízes de minha cidade.
............
Yo soy un poeta,
un ejército de poetas.
Y hoy quiero escribir un poema,
un poema de silbatos
un poema fusiles.
Para pegarlos en las puertas,
en la celda de las prisiones
en los muros de las escuelas.
Hoy quiero construir y destruir,
levantar en andamios la esperanza.
Despertar al niño
arcángel de las espadas,
ser relámpago, trueno,
con estatura de héroe
para talar, arrasar,
las podridas raíces de mi pueblo
16 de ago. de 2022
Amigos
14 de ago. de 2022
As Mortes Sucessivas :: Adélia Prado
8 de ago. de 2022
Borboletas:: Manoel de Barros
1 de ago. de 2022
A curva dos teus olhos : Paul Eluard
A curva dos teus olhos dá a volta ao meu peito
É uma dança de roda e de doçura.
Berço noturno e auréola do tempo,
Se já não sei tudo o que vivi
É que os teus olhos não me viram sempre.
Folhas do dia e musgos do orvalho,
Hastes de brisas, sorrisos de perfume,
Asas de luz cobrindo o mundo inteiro,
Barcos de céu e barcos do mar,
Caçadores dos sons e nascentes das cores.
Perfume esparso de um manancial de auroras
Abandonado sobre a palha dos astros,
Como o dia depende da inocência
O mundo inteiro depende dos teus olhos
E todo o meu sangue corre no teu olhar.
Capitale de la douleur. 1926
KAVÁFIS, Konstantinos :: Longe
Mas já se apagou tanto... visto que nada se mantém --
pois longe, nos primeiros anos de minha adolescência, ela jaz.
Uma pele como feita de jasmim...
Aquela noite de agosto -- era agosto? -- aquela noite...
Mal me lembro agora dos olhos -- eram, creio, azuis...
Ah! sim, azuis: um azul de safira.
..........................
Μακρυά
Θάθελα αυτήν την μνήμη να την πω...
Μα έτσι εσβύσθη πια... σαν τίποτε δεν απομένει —
γιατί μακρυά, στα πρώτα εφηβικά μου χρόνια κείται.
Δέρμα σαν καμωμένο από ιασεμί...
Εκείνη του Aυγούστου — Aύγουστος ήταν; — η βραδυά...
Μόλις θυμούμαι πια τα μάτια• ήσαν, θαρρώ, μαβιά...
A ναι, μαβιά• ένα σαπφείρινο μαβί.
Poemas de K. Kaváfis. Tradução, estudo e notas de Ísis Borges da Fonseca. São Paulo: Odysseus, 2006.
27 de jun. de 2022
Passeio pelas estantes da biblioteca :: Jostein Gaarder e Klaus Hagerup
Passeio pelas estantes da biblioteca. Os livros me dão as costas. Não para me rejeitar, como as pessoas: são convidativos, querendo apresentar-se a mim. Metros e mais metros de livros que nunca poderei ler. E sei: o que aqui se oferece é a vida, são complementos à minha própria vida que esperam ser postos em uso. Mas os dias passam rápido e deixam para trás as possibilidades. Um único desses livros talvez bastasse para mudar completamente a minha vida. Quem sou eu agora? Quem eu seria então?
In: A biblioteca mágica de Bibbi Bokken.
20 de jun. de 2022
VIVIANE NATHAN (Montevideo - Uruguai 1953
Confesso não ter a capacidade
que exigem todas as absurdas circunstâncias.
Peço desculpas pelas cem lerdezas diárias,
pelos erros grandes e pequenos,
pela bela bobagem,
pela lúcida vontade
de minha vergonha.
Sou aldeia pequena, de espaços diminutos,
selvas e planícies adornadas
com flores que estremecem silenciosas.
Sou a doce resposta da pergunta que não nasce.
Tradução: Antonio Miranda
....................
Pienso no tener equipaje
que exigen todas las absurdas circunstancias.
Me excuso por las cien torpezas diarias,
por los errores grandes y chiquitos,
por la bella tontería,
por la cuerda voluntad
de mi verguenza.
Soy aldea pequena, de diminutos espacios,
selvas y llanuras adornadadas
con flores que tiemblan silenciosas.
Soy la dulce respuesta de la pregunta que no nace.
6 de jun. de 2022
DA FRUIÇÃO DO SILÊNCIO :: FRANCISCO RUI MONIZ BARRETO ((1935? – 1994 RUY NOGAR, pseudônimo )
Tratávamos o silêncio por tu
Dormíamos na mesma cela
Acordávamos do mesmo sono
Cada sílaba audível
Completamente nua
Feria dum segundo sentido
O palato hipertenso
Da fria cela dezenove
Farrapos de ambiguidade
Pendiam pelas arestas
Das mais afoitas vogais
Ninguém pressentia
No gume acorado
Da quase indiferença
Que o silêncio aparentava
O perfeito sincronismo
Das sílabas dispersas
Pelos tímpanos de cada um
Nada sabíamos de nós próprios
Além da angústia lacerante
Coagulando-nos um a um
Nos limites da expectativa
E no écram memorial
Milhões de imagens se degladiando
Era o silêncio devorando o silêncio
Era o silêncio copulando o silêncio
Era o silêncio assassinando o silêncio
Era silêncio ressuscitando o silêncio
o silêncio
Oh o silêncio
Maldito silêncio colonial
Fuzilando-nos um a um
Contra as paredes da solidão
o silêncio
Oh o silêncio
Maldito silêncio imperial
Sepultando-nos uma a um
Sob os escombros de Portugal.
MOÇAMBIQUE. ANTOLOGIA POÉTICA. Organizador: Rogério Andrade Barbosa. Brasília: Thesarus Editora, s.d.
Uma imagem de prazer :: Clarice Lispector
Conheço em mim uma imagem muito boa, e cada vez que eu quero eu a tenho, e cada vez que ela vem ela aparece toda. É a visão de uma flor...
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Tem de haver mais Agora o verão se foi E poderia nunca ter vindo. No sol está quente. Mas tem de haver mais. Tudo aconteceu, Tu...
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A ilha da Madeira foi descoberta no séc. XV e julga-se que os bordados começaram desde logo a ser produzidos pel...