28 de fev. de 2015

Eu Sou Trezentos... :: Mário de Andrade

Giacomo Balla, 1913
Eu sou trezentos, sou trezentos-e-cincoenta,
As sensações renascem de si mesmas sem repouso,
Ôh espelhos, ôh ! Pirineus ! Ôh caiçaras !
Si um deus morrer, irei no Piauí buscar outro !
Abraço no meu leito as milhores palavras,
E os suspiros que dou são violinos alheios;
Eu piso a terra como quem descobre a furto
Nas esquinas, nos táxis,
nas camarinhas seus próprios beijos !

Eu sou trezentos, sou trezentos-e-cincoenta,
Mas um dia afinal toparei comigo...
Tenhamos paciência, andorinhas curtas,
Só o esquecimento é que condensa,
E então minha alma servirá de abrigo.

Remate de males, 1929.

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