Escadas de caracol
Sempre
São misteriosas: conturbam.
Quando as descem, a gente
Se desparafusa.
Quando a gente as sobe
Se parafusa
- o peito
estreito –
o teto descendo
Descendo descendo como nas histórias de imortal horror!
Mas de que jeito,
Mas como pode ser,
Morrer cair rolar por uma escada de parafuso?
Além disso não têm, pelo que dizem, nenhuma acústica...
Oh! não há como as escadarias daqueles antigos edifícios públicos
Para ser assassinado...
Porém não fiques tão eufórico,
- nem tudo são rosas:
Há,
no sonho das velhas casas de cômodos onde moras,
Passos que vêm subindo degrau por degrau em direção ao teu quarto
E “sabes” que é um fantasma chamejante e fosfóreo
- o corpo todo feito de inconsumíveis labaredas verdes!
O melhor
Mesmo
É fechar os olhos
E pensar numa outra coisa...
Pensa, pensa
- o quanto antes!
Naquelas pobres escadas de madeira das casas pobres
- escurinho dos teus primeiros aconchegos...
Pensa em cascatas de risos
Escada abaixo
De crianças deixando a escola...
Pensa na escada do poema
Que tu
comigo
vens descendo
agora...
(Hoje em dia todas as escadas são para descer)
Mas não! este poema não é
Nenhum
Abrigo
Antiaéreo...
Ah, tu querias que eu te embalasse?!
Eu estava, apenas, explorando uns abismos...
Apontamentos de História Sobrenatural, 2005.
Uma coisa bonita era para se dar ou para se receber, não apenas para se ter. Clarice Lispector
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