4 de set. de 2023

MOÇAS DAS DOCAS :: 20 Setembro 1926 (Moçambique) -04 Dezembro 2002 (Cascais) Carolina Noémia Abranches de Sousa Soares

Somos fugitivas de todos os bairros de zinco e caniço.

Fugitivas das Munhuanas e dos Xipamanines,

viemos do outro lado da cidade

com nossos olhos espantados,

nossas almas trançadas,

nossos corpos submissos e escancarados.

De mãos ávidas e vazias,

de ancas bamboleantes lâmpadas vermelhas se acendendo,

de corações amarrados de repulsa,

descemos atraídas pelas luzes da cidade,

acenando convites aliciantes

como sinais luminosos na noite.


Viemos ...

Fugitivas dos telhados de zinco pingando cacimba,

do sem sabor do caril de amendoim quotidiano,

do doer espáduas todo o dia vergadas

sobre sedas que outras exibirão,

dos vestidos desbotados de chita,

da certeza terrível do dia de amanhã

retrato fiel do que passou,

sem uma pincelada verde forte

falando de esperança.

(Excerto)

 

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