7 de mar. de 2012

A mesma mão de sempre e tão nova de Fabrício Carpinejar


Ferdinand Georg Waldmüller


A mão materna na hora de atravessar a rua. 
A mão paterna mexendo de orgulho nossos cabelos. 
A mão da caligrafia dos cadernos, com a cabeça inclinada na mesa. 
A mão brincando com o graveto na boca do cachorro. 
A mão boba no cinema. A mão para levantar o véu branco da esposa. 
A mão ansiosa a segurar o primeiro passo do filho.
A mão assustada de ternura. 
Ossuda, magra, com as veias azuis pedindo passagem. 
Envelhecida, absolutamente carente, que vai acenar de verdade apertando outra mão.

6 de mar. de 2012

Orquídea Epidendrum conhecida como "orquídea estrela" ou "orquídea crucifixo"








Epidendrum é um gênero que ocorre nas Américas, do México ao Brasil. É também conhecida como "orquídea estrela" ou "orquídea crucifixo".  Recompensa o cultivador com frequentes florações de cores variadas e tem boa resistência a temperaturas altas e baixas, podendo suportar bem períodos de prolongada exposição ao sol. 
Grande número de espécies apresentam um néctar de forte fragrância. Seus principais agentes polinizadores são a mariposa diurnas e noturnas e o beija-flor que costuma visitar algumas espécies.
As condições de cultivo, variam muito, dependendo da região de onde se origina a espécie. Existem espécies epífitas, rupícolas e terrestres, e para cada uma as condições são diferentes, porém na sua maioria, são plantas que devem ser cultivadas em clima intermediário, com boa ventilação e umidade, sem necessitarem de grande adubação nem de períodos secos durante o ano. 

Poemas escolhidos de Emily Dickinson

Leonardo Da Vinci


É mais fácil encontrar
Um amigo que é sombra para os dias quentes,
Do que algum outro, caloroso,
Para as horas frias da mente.

Voltado um tanto para o leste, o catavento
Põe em fuga as almas de musselina;
E se mais firmes são os corações de seda
Do que os feitos de organdi,

A quem culpar? Ao tecelão?
Ó os enganadores fios!
No paraíso, as alfombras
Têm urdidura invisível.


“Poemas escolhidos”, Emily Dickinson. Seleção, tradução, introdução e notas de Ivo Bender.

5 de mar. de 2012

Poema 15: Me gusta cuando callas de Pablo Neruda


Van Gogh 

Me gustas cuando callas porque estás como ausente,
y me oyes desde lejos, y mi voz no te toca.
Parece que los ojos se te hubieran volado
y parece que un beso te cerrara la boca.

Como todas las cosas están llenas de mi alma
emerges de las cosas, llena del alma mía.
Mariposa de sueño, te pareces a mi alma,
y te pareces a la palabra melancolía.

Me gustas cuando callas y estás como distante.
Y estás como quejándote, mariposa en arrullo.
Y me oyes desde lejos, y mi voz no te alcanza:
Déjame que me calle con el silencio tuyo.

Déjame que te hable también con tu silencio
claro como una lámpara, simple como un anillo.
Eres como la noche, callada y constelada.
Tu silencio es de estrella, tan lejano y sencillo.

Me gustas cuando callas porque estás como ausente.
Distante y dolorosa como si hubieras muerto.
Una palabra entonces, una sonrisa bastan.
Y estoy alegre, alegre de que no sea cierto.

4 de mar. de 2012

Amor-agarradinho, mimo-do-céu, amor-entrelaçado







Nome Científico: Antigonon leptopus
Sinonímia: Antigonon cordatum
Nome Popular: Amor-agarradinho, viuvinha, mimo-do-céu, coralita, cipó-coral, lágrima-de-noiva, rosália, rosa-da-montanha, cipó-mel, georgina, amor-entrelaçado, bela-mexicana
Família: Polygonaceae
Divisão: Angiospermae
Origem: México

Agora que sinto amor de Fernando Pessoa (Alberto Caieiro)


Agora que sinto amor
Tenho interesse no que cheira.
Nunca antes me interessou que uma flor tivesse cheiro.
Agora sinto o perfume das flores como se visse uma coisa nova.
Sei bem que elas cheiravam, como sei que existia.
São coisas que se sabem por fora.
Mas agora sei com a respiração da parte de trás da cabeça.
Hoje as flores sabem-me bem num paladar que se cheira.
Hoje às vezes acordo e cheiro antes de ver.

3 de mar. de 2012

Paisagem de Murilo Mendes

imagem de Vinicius Moreira

Manhã de claridade,
sinos vibrando na alma da gente,
o amor tão calmo me leva pela mão
nas ruas alinhadas da vida,
me mostra as colunas polidas do tempo,
festões cor-de-rosa,
ritmos equilibrados.
Sons de realejo na praça onde crianças jogam malha
e o ar fino de cheiro de madressilva e jasmins lavados,
água cantando na fonte mecânica, embalando a praça.
Até minha namorada que tem o corpo sólido
e a cara tristíssima
toma uns ares de garota e o mundo entra na ordem.

In Poesia Completa e Prosa

2 de mar. de 2012

Orquídeas Bulbophyllum




Bulbophyllum (em português: Bulbófilo) é um gênero botânico pertencente à família das orquídeas (Orchidaceæ).  
Etimologia: O nome do gênero (Bulb.) procede da latinização das palavras gregas: βολβος (bolbos), que significa "bulbo", "tubérculo", "raiz carnuda"; e φύλλον que significa "folha", aludindo à forma bulbosa das folhas da primeira planta descrita, folhas bastante espessas.
É o mais vasto e um dos mais complexos gêneros dentre as orquídeas, com cerca de duas mil espécies bastante diversas, distribuídas pelos trópicos de todos os continentes com predominância no sudeste africano e asiático. Somente na Nova Guiné há mais de quinhentas espécies descritas.
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

Adiada enchente de Mia Couto



Velho, não.
Entardecido, talvez.
Antigo, sim.

Me tornei antigo
porque a vida,
tantas vezes, se demorou.
E eu a esperei
como um rio aguarda a cheia.

1 de mar. de 2012

A alma escolhe sua companhia de Emily Dickinson


A alma escolhe sua companhia
E fecha a porta, depois.
Em sua augusta suficiência,
Cessam as intromissões.

Indiferente, vê as carruagens
Parando junto ao portão;
Indiferente, um rei de joelhos
Sobre suas alfombras.

Sei que, dentre uma vasta multidão,
Ela escolheu um ser apenas;
Depois, cerrou as aldravas de sua atenção,
Feito pedra.

In Poemas Escolhidos

Cedro do Líbano manuscrito da Lorena Rocha Hoff


29 de fev. de 2012

Mural de Adélia Prado



Recolhe do ninho os ovos a mulher
nem jovem nem velha,
em estado de perfeito uso.
Não vem do sol indeciso
a claridade expandindo-se,
é dela que nasce a luz 
de natureza velada,
é seu próprio gosto 
em ter uma família,
amar a aprazível rotina.
Ela não sabe que sabe,
a rotina perfeita é Deus:
as galinhas porão seus ovos,
ela porá sua saia,
a árvore a seu tempo
dará suas flores rosadas.
A mulher não sabe que reza:
que nada mude, Senhor.

Bonito de ver






28 de fev. de 2012

Recomendação de Goethe

imagem Pedro Ruiz


Ai, que deve o homem esperar?
É melhor ficar inerte?
É melhor viver sem leme?
A algum amor se aferrar? 
Deve em tenda residir? 
Ou uma casa edificar? 
Deve se fiar em rocha, 
Tão sujeita a vacilar? 
A cada um o seu tanto... 
Cada qual rume, com fé, 
Pense onde se fixar 
E não caia estando em pé.

Investigações de um cão de Franz Kafka


Andrew Wyeth 
Todo o conhecimento, a totalidade de todas as perguntas e respostas, está contida no cão.

As minhas interrogações servem apenas de aguilhão para mim mesmo. Só quero ser estimulado pelo silêncio que se ergue à minha volta como resposta derradeira. «Até quando conseguirás suportar o facto de que o mundo dos cães, tal como demonstram cada vez com mais evidência as tuas pesquisas, está para sempre votado ao silêncio? Até quando conseguirás suportar esta ideia?» Esta, esta é que é a verdadeira grande interrogação da minha vida, uma interrogação perante a qual as outras interrogações se tornam totalmente insignificantes. Uma interrogação que diz respeito apenas a nós próprios e a mais ninguém. Infelizmente, posso responder a esta interrogação com mais facilidade do que às interrogações específicas: aguentarei, provavelmente, até ao meu fim natural. A serenidade da velhice irá formando uma resistência cada vez maior a todas as interrogações inquietantes. Tudo indica que hei-de morrer em silêncio e rodeado de silêncio, na verdade até de forma específica, e antevejo isso com uma certa tranquilidade. Um coração admiravelmente resistente, pulmões que é impossível ficarem fracos prematuramente, foram-nos dados a nós, cães, como que por ironia. Assim, sobrevivemos a todas as interrogações, inclusive àquelas que colocamos a nós próprios, como autênticas fortalezas de silêncio que somos.
Franz Kafka, "Investigações de um cão"

27 de fev. de 2012

A senhora Clarinha de Agustina Bessa Luís



Em Fontelas de Cima, repentino sobrado do Alto Douro, ficava a venda da senhora Clarinha. Era uma mulher baixinha, minuciosa nas contas, pouco afeiçoada à clientela, mas mais correcta de maneiras do que éhabitual em patroa de balcão e locanda. A montra, feita duma janela ainda apresentável no seu parapeito verde, exibia maços de velas e lamparinas. A senhora Clarinha servia as necessidades das almas e outras que o não eram. Ela própria tinha a sua devoção pessoal a 5. Judas Tadeu; oferecia-lhe todos os meses um litro de azeite, do melhor, e um quilo de bolachas jazz band. Não que o santo, no seu pequeno soco de escaiola, demonstrasse apetite e gostos adamados. Quem comia as bolachas era o Tito, filho de sacristão e cara de Caim. Era um exemplo paleolitíco com aquela fauce bravia e os olhos juntos. Atirava pedradas aos carros, corria de rastos, tinha escon­derijo nas minas e nas pedreiras. Mas sabia o seu latim e tocava a Santos como se quisesse fazer cair as mura­lhas de Jericó. Enfim, havia prós e contras nesse cham­bão. No coro, com a opa de cetineta vermelha, estava regular; no adro, parecia ainda humano; na torre do sino, um morcego vampiro ou gárguia de Nôtre Dame. Vamos lá destrinçar as espécies e fazer paleontologia! O caso é outro.

A senhora Clarinha, numa manhã de Maio, recebeu uma carta extraordinária. Era dirigida aos devotos de S. Judas Tadeu e devia ser copiada duzentas vezes e mandada a outros tantos fiéis, a começar pelo nome que lhes era indicado. Porém o nome não constava na carta, e a senhora Clarinha achou-se embaraçada para cumprir aquela intimação; o que a punha em perigo gravíssimo. Interrompida a cadeia, caíam sobre ela desgraças impos­síveis de evitar, como incêndios, inundações, mortes de parentes e amigos. Ela estava muitíssimo apoquentada e fechou a loja antes das sete horas. Sentou-se numa cadeirinha de palha e pôs-se a pensar. Tinha algum dinheiro, nome honrado e uma vinha com o seu quartei­rão de oliveiras. A casa era dela, com duas salas com um fausto de vistas e uma coroa de bouças velhas em volta. Tinha de tudo na loja — fio de Norte, papos-secos, tesouras da poda. Também vendia grandes rebuçados de avenca, quase do tamanho de pires e embrulhados em papel de seda branco. Desde Fontelas de Cima até Moura Morta, eram famosos. A senhora Clarinha abanou tristemente a cabeça. Não tinha esperança de escapar à ter­rível ameaça que sobre ela desabara. O Tito, que vinha à noite trazer a canada do leite, encontrou-a meio transtornada e com a carta na mão.

— Lê o que aí diz — pediu ao rapaz. Ele juntou as letras, foi-se explicando.

— Duzentas vezes esta letania! Deite-a fora, não faça caso.

— A carta de S. Judas? Não se pode, é proibido.

Estava tão branca atrás do mostrador verde, que era como uma aparição. Um feixe de ráfia projectava atrás dela uma espécie de auréola loira. O Tito teve medo, e não era um moço acanhado. As ratoeiras a fogo, nos laranjais, já lhe tinham acertado nas pernas duas ou três vezes.

Em poucos dias, a senhora Clarinha morreu do aperto de alma em que estava. Não pôde mandar a ‘carta de S. Judas Tadeu’, e alguma coisa ‘tinha que lhe acontecer’ Deus nos livre do que o destino manda sem nos dar o direito de executar a sua ordem. Ai!

Datado: 10-8-1974

AGUSTINA BESSA LUIS, CONVERSAÇÕES COM DMITRI E OUTRAS FANTASIAS,

Inverso, A REGRA DO JOGO, 1979, p. 35

26 de fev. de 2012

E se escreve de Marguerite Duras


Chorar, é preciso que isto também aconteça.
Se chorar é inútil, mesmo assim creio que é preciso chorar. 
Pois o desespero é tangível. Perdura. 
A lembrança do desespero, isto perdura. 
Às vezes mata.
Escrever.
Não posso.
Ninguém pode.
É preciso dizer: não se pode.
E se escreve.
É o desconhecido que trazemos conosco: 
escrever, é isto o que se alcança. 
Isto ou nada.
Pode-se falar de uma doença da escrita.
in: Escrever. Rocco, p. 47

25 de fev. de 2012

Beija-flores de John James Audubon



John James Audubon (26 de abril de 1785 – 27 de janeiro 1851) foi um naturalista americano de origem francesa, especializado na ilustração científica de aves. O seu trabalho mais conhecido The Birds of America (As Aves da América em língua portuguesa) alcançou, durante a sua vida, sucesso comercial e trouxe-lhe enorme popularidade junto do público. O prestígio científico alcançado pela obra valeu-lhe elogios rasgados dos seus pares e permitiu-lhe tornar-se o segundo americano (depois de Benjamin Franklin) a ser incluido à seleta Royal Society britânica para as ciências.

24 de fev. de 2012

Anseios de Florbela Espanca

Meu doido coração aonde vais,
No teu imenso anseio de liberdade?
Toma cautela com a realidade;
Meu pobre coração olha cais!

Deixa-te estar quietinho! Não amais
A doce quietação da soledade?
Tuas lindas quimeras irreais
Não valem o prazer duma saudade!

Tu chamas ao meu seio, negra prisão!…
Ai, vê lá bem, ó doido coração,
Não te deslumbre o brilho do luar!

Não ´stendas tuas asas para o longe…
Deixa-te estar quietinho, triste monge,
Na paz da tua cela, a soluçar!…

23 de fev. de 2012

Em algum lugar de E. E. Cummings

Tarsila do Amaral - Vaso com rosas (1919)

nalgum lugar em que eu nunca estive, alegremente além
de qualquer experiência, teus olhos têm o seu silêncio:
no teu gesto mais frágil há coisas que me encerram,
ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto

teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
embora eu tenha me fechado como dedos, nalgum lugar
me abres sempre pétala por pétala como a Primavera abre
(tocando sutilmente, misteriosamente) a sua primeira rosa

ou se quiseres me ver fechado,  eu e
minha vida nos fecharemos belamente, de repente,
assim como o coração desta flor imagina
a neve cuidadosamente descendo em toda a parte;

nada que eu possa perceber neste universo iguala
o poder de tua imensa fragilidade: cuja textura
compele-me com a cor de seus continentes,
restituindo a morte e o sempre cada vez que respira

(não sei dizer o que há em ti que fecha
e abre; só uma parte de mim compreende que a
voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas

( tradução: Augusto de Campos )

em algum lugar onde nunca estive, e felizmente aquém
de qualquer experiência, teus olhos guardam seu silêncio:
em teu gesto mais frágil há coisas que me envolvem
ou que não posso tocar porque estão muito próximas

teu olhar mais leve facilmente me descerra
embora eu me tenha fechado como dedos, 
e me entreabres sempre, pétala por pétala, como a Primavera 
(por toques habilidosos, misteriosamente) ante a primeira rosa 

ou se teu desejo é me fechar, eu e
minha vida nos fecharemos formosa e rapidamente 
como quando o coração desta flor imagina 
que a neve — cuidadosamente — está caindo em toda a parte; 

nada do que podemos perceber neste mundo se compara
ao poder de tua imensa fragilidade: cuja textura 
me compromete com a cor de seus países 
e me entrega para sempre a morte cada vez que respiro 

(nada sei do que te faz tão poderosa
ao me mover; mas algo em mim compreende apenas 
que a voz de teus olhos é mais profunda que todas as rosas) 
ninguém, nem mesmo a chuva, tem as mãos assim tão pequenas.

tradução de Jorge Wanderley

Uma imagem de prazer :: Clarice Lispector

     Conheço em mim uma imagem muito boa, e cada vez que eu quero eu a tenho, e cada vez que ela vem ela aparece toda. É a visão de uma flor...