Uma coisa bonita era para se dar ou para se receber, não apenas para se ter. Clarice Lispector
1 de dez. de 2015
DECLARAÇÃO DE MALES :: Paulo Mendes de Campos
Ilmo. Sr. Diretor do Imposto de Renda.
Antes de tudo devo declarar que já estou, parceladamente, à venda.
Não sou rico nem pobre, como o Brasil, que também precisa de boa parte do meu dinheirinho.
Pago imposto de renda na fonte e no pelourinho.
Marchei em colégio interno durante seis anos mas nunca cheguei ao fim de nada, a não ser dos meus enganos.
Fui caixeiro. Fui redator. Fui bibliotecário.
Fui roteirista e vilão de cinema. Fui pegador de operário.
Já estive, sem diagnóstico, bem doente.
Fui acabando confuso e autocomplacente.
Deixei o futebol por causa do joelho.
Viver foi virando dever e entrei aos poucos no vermelho.
No Rio, que eu amava, o saldo devedor já há algum tempo que supera o saldo do meu amor.
Não posso beber tanto quanto mereço, pela fadiga do fígado e a contusão do preço.
Sou órfão de mãe excelente.
Outras doces amigas morreram de repente.
Não sei cantar. Não sei dançar.
A morte há de me dar o que fazer até chegar.
Uma vez quis viver em Paris até o fim, mas não sei grego nem latim.
Acho que devia ter estudado anatomia patológica ou pelo menos anatomia filológica.
Escrevo aos trancos e sem querer e há contudo orgulhos humilhantes no meu ser.
Será do avesso dos meus traços que faço o meu retrato?
Sou um insensato a buscar o concreto no abstrato.
Minha cosmovisão é míope, baça, impura, mas nada odiei, a não ser a injustiça e a impostura.
Não bebi os vinhos crespos que desejara, não me deitei sobre os sossegos verdes que acalentara.
Sou um narciso malcontente da minha imagem e jamais deixei de saber que vou de torna-viagem.
Não acredito nos relógios... the pule cast of throught... sou o que não sou (all that I am I am not).
Podia ter sido talvez um bom corredor de distância: correr até morrer era a euforia da minha infância.
O medo do inferno torceu as raízes gregas do meu psiquismo e só vi que as mãos prolongam a cabeça quando me perdera no egotismo.
Não creio contudo em myself.
Nem creio mais que possa revelar-me em other self.
Não soube buscar (em que céu?) o peso leve dos anjos e da divina medida.
Sou o próprio síndico de minha massa falida.
Não amei com suficiência o espaço e a cor.
Comi muita terra antes de abrir-me à flor.
Gosto dos peixes da Noruega, do caviar russo, das uvas de outra terra; meus amores pela minha são legião, mas vivem em guerra.
Fatigante é o ofício para quem oscila entre ferir e remir.
A onça montou em mim sem dizer aonde queria ir.
A burocracia e o barulho do mercado me exasperam num instante.
Decerto sou crucificado por ter amado mal meu semelhante.
Algum deus em mim persiste
mas não soube decidir entre a lua que vemos e a lua que existe.
Lobisomem, sou arrogante às sextas-feiras, menos quando é lua cheia.
Persistirá talvez também, ao rumor da tormenta, algum canto da sereia.
Deixei de subir ao que me faz falta, mas não por virtude: meu ouvido é fino e dói à menor mudança de altitude.
Não sei muito dos modernos e tenho receios da caverna de Platão: vivo num mundo de mentiras captadas pela minha televisão.
Jamais compreendi os estatutos da mente.
O mundo não é divertido, afortunadamente.
E mesmo o desengano talvez seja um engano.
in: O amor acaba
30 de nov. de 2015
Prendedores :: Ana Estaregui
de roupa
sobre a dor deles, função primeira
desmembrei suas patas
arranquei o coraçãozinho
de metal gelado
olhei atentamente
vi um buraco absurdo
um tiro bem no meio
vi planalto, depressão
topografia enrustida
mas hoje
hoje eu só quero
estirar umas calcinhas
ao vento.
29 de nov. de 2015
Poemas de kitnet :: Ana Estaregui (1987, Sorocaba )
na quitinete de 45 metros
tenho todas as solidões
que envolvem poeiras e
buracos desocupados
roseira sem flor e rosas avulsas
ganhadas no dia da mulher
tem o filtro de barro que não enche
sozinho os copos
os lírios que nascem e morrem
cristalizados
em fotografias digitais
na velocidade do congelador
criar crostas brancas
e o teto refletir a rua em formas móveis
e geométricas
toda noite
toda noite tem as janelas
dos vizinhos classe média
tingindo o escuro com
as cores luz do plasma
e dos cristais líquidos
os garfos a mais
as facas a mais
as taças de vinho que esperam
os talheres que sobram
sou só eu, não preciso de mais
que um copo
um garfo
uma faca
um prato
e um horizonte entrecortado de prédios desbotados.
28 de nov. de 2015
A pouco e pouco, aloja-se-me no coração :: Graça Pires (Figueira da Foz a 22 de Novembro de 1946 )
Francis Picabia
A pouco e pouco, aloja-se-me no coração
a cicatriz da espera.
Alheio-me da minha cronologia porque o passado
se tornou permanente. Caminho tão perto do mar,
que Ulisses avalia a direção do vento pelos vestígios
do meu respirar, lento ou apressado.
27 de nov. de 2015
Jasmim-do-cabo, Gardênia - Gardenia jasminoides
- Nomes Populares: Gardênia, Jasmim-do-cabo
- Família: Rubiaceae
- Categoria: Arbustos, Cercas Vivas, Flores Perenes
- Clima: Mediterrâneo, Subtropical, Temperado, Tropical
- Origem: Ásia, China
- Altura: 1.8 a 2.4 metros
- Luminosidade: Meia Sombra, Sol Pleno
- Ciclo de Vida: Perene
- A gardênia é uma planta arbustiva, de textura semi-lenhosa, com ramos eretos, ramificados e folhas perenes. Sua altura média é de 1,5 a 2 metros de altura. Suas folhas são brilhantes, coriáceas, opostas, ovaladas e de coloração verde-escura. As flores são brancas, cerosas, grandes e muito perfumadas. Com o tempo adquirem uma coloração creme com tons amarelados. A floração ocorre em meados da primavera e início do verão. Os frutos, oriundos das variedades férteis, têm a polpa amarela, de onde extraem-se corantes para o artesanato e indústria. Ocorrem variedades de flores simples ou dobradas, pequenas e grandes, assim como há variedades de ramagem prostrada e pequeno porte.
- A gardênia é uma planta de rica fragrância e sua utilização deve aproveitar esta sua qualidade. Ela pode ser cultivada isolada em pátios ou próximo à portas e janelas, onde há transito de pessoas. Sendo conduzida sem podas de adensamento, apenas de limpeza, ela cresce com maior ventilação e é menos suscetível à doenças. Contudo, pode ser plantada em grupos e, sendo cuidada com zelo, pode formar belas cercas-vivas com textura mais compacta. O momento ideal para a poda das gardênias é após a floração. Presta-se para o plantio em vasos e é ótima para bonsai.
- Deve ser cultivada sob sol pleno, em solo fértil, levemente ácido, bem drenável, enriquecido com matéria orgânica e com regas regulares. Suplementações com quelatos de ferro e adubações na primavera e verão estimulam um crescimento vigoroso e florações intensas. A gardênia aprecia a temperatura amena, mas não tolera baixa umidade do ar. Ela se adapta bem ao clima subtropical e tropical de altitude, com noites frias. Multiplica-se por estaquia dos ramos semilenhosos após a floração.
- fonte: jardineiro.net
Declaração de Amor :: Luis Fernando Veríssimo
Tentei dizer o quanto te amava, aquela vez, baixinho.
Mas havia um grande berreiro, um enorme burburinho.
E, pensando bem, o berçário não era o melhor lugar.
Você de fraldas, uma graça, e eu pelado.
Lado a lado, cada um recém-chegado.
Você sem saber ouvir, eu sem saber falar.
Tentei de novo, lembro bem, na escola.
Um PS no bilhete pedindo cola.
Interceptado pela professora como um gavião.
Fui parar na sala da diretora e depois na rua.
Enquanto você, compreensivelmente, ficou na sua.
Curta é a vida, longa é a paixão.
Numa festinha, ah! nossas festinhas, disse tudo:
" Eu te adoro, te venero, na sua frente fico mudo".
E você não disse nada. E você não disse nada.
Só mais tarde, de ressaca, atinei.
Cheio de amor e Cuba Libre, me enganei.
E disse tudo para uma almofada.
Gravei em vinte árvores, quarenta corações.
O teu nome, o meu, flechas e palpitações.
No mal-me-quer, bem-me-quer, dizimei jardins.
Resultado: Sou persona non grata.
Corrido aos gritos de "Mata-mata!".
Por ambientalista, ecólogos e afins.
Recorri em desespero ao gesto obsoleto:
" Se não me segurarem, faço um soneto!"
E não é que fiz, e até com boas rimas?
Você não leu e nem sequer ficou sabendo.
Continuo inédito e por teu amor sofrendo.
Mas fui premiado num concurso em Minas.
Comecei a escrever com pincel e piche.
Num muro branco, o asseio que se lixe.
Todo meu amor para tua ciência.
Fui preso, aos socos, e fichado.
Dias e mais dias interrogado:
Era PC, PC do B ou alguma dissidência?
Te escrevi com lágrimas, sangue, suor e mel.
(você devia ver o estado do papel)
Uma carta longa, linda e passional.
De resposta nem uma cartinha.
Nem um cartão, nem uma linha...
Vá se confiar no Correio Nacional!
Com uma serenata, sim uma serenata.
Como nos tempos da Cabloca Ingrata.
Me declararia, respeitando a métrica.
Ardor, tenor, a calçada enluarada...
Havia tudo sob tua sacada.
Menos tomada para a guitarra elétrica.
Decidi então, botar a maior banca.
No céu escrever com fumaça branca:
" Te amo, assinado..." e meu nome bem legível.
Já tinha avião, coragem, brevê.
Tudo para impressionar você.
Mas veio a crise, faltou combustível.
Ontem você me emprestou seu ouvido.
E na discoteca, em meio ao alarido.
Despejei meu coração.
Falei da devoção há anos entalada.
E você disse " Não tô escutando nada".
Curta é a vida, longa a paixão.
Na velhice, num asilo, lado a lado.
Em meio a um silêncio abençoado.
Direi o que sinto, meu bem.
O meu único medo é que então
Empinando a orelha com a mão
Você só me responda: " Hein?"
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Uma imagem de prazer :: Clarice Lispector
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