27 de jun. de 2022

Passeio pelas estantes da biblioteca :: Jostein Gaarder e Klaus Hagerup

Passeio pelas estantes da biblioteca. Os livros me dão as costas. Não para me rejeitar, como as pessoas: são convidativos, querendo apresentar-se a mim. Metros e mais metros de livros que nunca poderei ler. E sei: o que aqui se oferece é a vida, são complementos à minha própria vida que esperam ser postos em uso. Mas os dias passam rápido e deixam para trás as possibilidades. Um único desses livros talvez bastasse para mudar completamente a minha vida. Quem sou eu agora? Quem eu seria então?


In: A biblioteca mágica de Bibbi Bokken.

 

20 de jun. de 2022

VIVIANE NATHAN (Montevideo - Uruguai 1953

Confesso não ter a capacidade

que exigem todas as absurdas circunstâncias.

Peço desculpas pelas cem lerdezas diárias,

pelos erros grandes e pequenos,

pela bela bobagem,

pela lúcida vontade

de minha vergonha.

Sou aldeia pequena, de espaços diminutos,

selvas e planícies adornadas

com flores que estremecem silenciosas.

Sou a doce resposta da pergunta que não nasce.

 Tradução: Antonio Miranda 

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Pienso no tener equipaje

que exigen todas las absurdas circunstancias.

Me excuso por las cien  torpezas diarias,

por los errores grandes y chiquitos,

por la bella tontería,

por la cuerda voluntad

de mi verguenza.

Soy aldea pequena, de diminutos espacios,

selvas y llanuras adornadadas

con flores que tiemblan silenciosas.

Soy la dulce respuesta de la pregunta que no nace.

6 de jun. de 2022

DA FRUIÇÃO DO SILÊNCIO :: FRANCISCO RUI MONIZ BARRETO ((1935? – 1994 RUY NOGAR, pseudônimo )

Tratávamos o silêncio por tu

Dormíamos na mesma cela

Acordávamos do mesmo sono


Cada sílaba audível

Completamente nua

Feria dum segundo sentido


O palato hipertenso

Da fria cela dezenove


Farrapos de ambiguidade

Pendiam pelas arestas

Das mais afoitas vogais


Ninguém pressentia

No gume acorado

Da quase indiferença

Que o silêncio aparentava

O perfeito sincronismo

Das sílabas dispersas

Pelos tímpanos de cada um


Nada sabíamos de nós próprios

Além da angústia lacerante

Coagulando-nos um a um

Nos limites da expectativa


E no écram memorial

Milhões de imagens se degladiando


Era o silêncio devorando o silêncio

Era o silêncio copulando o silêncio

Era o silêncio assassinando o silêncio

Era silêncio ressuscitando o silêncio

o silêncio


Oh o silêncio

Maldito silêncio colonial

Fuzilando-nos um a um


Contra as paredes da solidão

o silêncio


Oh o silêncio

Maldito silêncio imperial

Sepultando-nos uma a um

Sob os escombros de Portugal.

MOÇAMBIQUE. ANTOLOGIA POÉTICA. Organizador: Rogério Andrade Barbosa.  Brasília:  Thesarus Editora, s.d. 


João Fasolino (1987, Rio de Janeiro)