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25 de jun. de 2014

A Serenata :: Adélia Prado

Andrew Wyeth

Uma noite de lua pálida e gerânios
ele viria com boca e mão incríveis
tocar flauta no jardim.
Estou no começo do meu desespero
e só vejo dois caminhos:
ou viro doida ou santa.
Eu que rejeito e exprobo
o que não for natural como sangue e veias
descubro que estou chorando todo dia,
os cabelos entristecidos,
a pele assaltada de indecisão.
Quando ele vier, porque é certo que ele vem,
de que modo vou chegar ao balcão sem juventude?
A lua, os gerânios e ele serão os mesmos
- só a mulher entre as coisas envelhece.
De que modo vou abrir a janela, se não for doida?
Como a fecharei, se não for santa?

3 de nov. de 2013

Da literatura de Roberto Bolaño

 Nakamura Daizaburo 

Há uma literatura para quando se está aborrecido. Abunda. Há uma literatura para quando se está calmo. Esta é a melhor literatura, acho eu. Também há uma literatura para quando se está triste. E há uma literatura para quando se está alegre. Há uma literatura para quando se está ávido de conhecimento. E há uma literatura para quando se está desesperado."
in Os Detectives Selvagens. trad. Miranda das Neves

3 de set. de 2013

Se alguém :: Fernando Pessoa

Max Ernst

Se alguém bater um dia à tua porta,
Dizendo que é um emissário meu,
Não acredites, nem que seja eu;
Que o meu vaidoso orgulho não comporta
Bater sequer à porta irreal do céu.

Mas se, naturalmente, e sem ouvir
Alguém bater, fores a porta abrir
E encontrares alguém como que à espera
De ousar bater, medita um pouco. Esse era
Meu emissário e eu e o que comporta
O meu orgulho do que desespera.
Abre a quem não bater à tua porta!

Fernando Pessoa - 5/9/1934

18 de fev. de 2013

Só quereria ter o que eu tivesse sido e não fui. de Clarice Lispector

Catrin Welz-Stein

Escrevo por não ter nada a fazer no mundo: sobrei e não há lugar para mim na terra dos homens. Escrevo porque sou um desesperado e estou cansado, não suporto mais a rotina de me ser e se não fosse sempre a novidade que é escrever, eu morreria simbolicamente todos os dias. Mas preparado estou para sair discretamente pela saída da porta dos fundos. Experimentei quase tudo, inclusive a paixão e o seu desespero. E agora só quereria ter o que eu tivesse sido e não fui.

in A Hora da estrela

23 de jan. de 2013

Nova poética de Manuel Bandeira


Vou lançar a teoria do poeta sórdido.
Poeta sórdido:
Aquele em cuja poesia há a marca suja da vida.
Vai um sujeito,
Saí um sujeito de casa com a roupa de brim branco muito bem engomada, e na primeira esquina passa um caminhão, salpica-lhe o paletó ou a calça de uma nódoa de lama: 
É a vida

O poema deve ser como a nódoa no brim:
Fazer o leitor satisfeito de si dar o desespero.

Sei que a poesia é também orvalho.
Mas este fica para as menininhas, as estrelas alfas, as virgens cem por cento e as amadas que envelheceram sem maldade.


26 de fev. de 2012

E se escreve de Marguerite Duras


Chorar, é preciso que isto também aconteça.
Se chorar é inútil, mesmo assim creio que é preciso chorar. 
Pois o desespero é tangível. Perdura. 
A lembrança do desespero, isto perdura. 
Às vezes mata.
Escrever.
Não posso.
Ninguém pode.
É preciso dizer: não se pode.
E se escreve.
É o desconhecido que trazemos conosco: 
escrever, é isto o que se alcança. 
Isto ou nada.
Pode-se falar de uma doença da escrita.
in: Escrever. Rocco, p. 47

16 de ago. de 2010

Sempre no nunca

Talvez seja isso a vida: 
muito desespero, mas também alguns momentos de beleza em que o tempo não é mais o mesmo. 
É como se as notas de música fizessem uma espécie de parêntesis no tempo, 
de suspensão, 
um alhures aqui mesmo, 
um sempre no nunca.
Sim, é isso, um sempre no nunca. Muriel Barbery in A elegância do ouriço.

João Fasolino (1987, Rio de Janeiro)