Mostrando postagens com marcador Lágrimas. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Lágrimas. Mostrar todas as postagens

27 de jun. de 2016

Meus sapatos amarelos :: Maura Lopes Cançado (1929 - 1993)


um passo adiante na minha solidão.
Eu os vi mil vezes através de lágrimas,
na sua ingenuidade gasta, resignada,
Ó, meus sapatos - amarelo-girassol.



(28/10/1959)

2 de dez. de 2015

Lágrimas :: Fábio Oliveira

Fornasetti 

Gotas de não se sabe o quê.
De fome, de dor, de sede?
Do que o outro diz.
Gotas de capricho,
Infância desabrochando,
Olhar de mãe.
Sal escorrendo na face
De aflição, angústia, medo:
Vida que não se conhece,
Caminho que se segue.
Gotas de alegria,
Gozo de plenitude,
Prazer de se encontrar
No emaranhado da vida.

4 de jun. de 2015

NOSSA HISTÓRIA :: Yehuda Amichai

Andrew Wyeth
Na história de nosso amor, um foi sempre
Uma tribo nômade, outro uma nação em seu próprio solo.
Quando trocamos de lugar, tudo tinha acabado.
O tempo passará por nós, como paisagens
Passam por trás de atores parados em suas marcas
Quando se roda um filme.
As palavras
Passarão por nossos lábios, até as lágrimas
Passarão por nossos olhos.
O tempo passará
Por cada um em seu lugar.
E na geografia do resto de nossas vidas,
Quem será uma ilha e quem uma península.
Ficará claro pra cada um de nós no resto de nossas vidas
Em noites de amor com outros.

tradução de Millôr Fernandes

9 de fev. de 2014

O alfabeto no parque - Adélia Prado

Charlie Spear

Escrevo cartas, bilhetes, lista de compras,
composição escolar narrando o belo passeio
 à fazenda da vovó que nunca existiu
 porque ela era pobre como Jó.
 Mas escrevo também coisas inexplicáveis:
 quero ser feliz, isto é amarelo.
 E não consigo, isto é dor.

 Vai-te de mim, tristeza, sino gago,
 pessoas dizendo entre soluços:
 «não aguento mais».

 Moro num lugar chamado globo terrestre
 onde se chora mais
 que o volume das águas denominadas mar,
 para onde levam os rios outro tanto de lágrimas.

 Aqui se passa fome. Aqui se odeia.
 Aqui se é feliz, no meio de invenções miraculosas.

 Imagine que uma dita roda-gigante
 propicia passeios e vertigens entre
 luzes, música, namorados em êxtase.
 Como é bom! De um lado os rapazes.
 Do outro as moças, eu louca para casar
 e dormir com meu marido no quartinho
 de uma casa antiga com soalho de tábua.

 Não há como não pensar na morte,
 entre tantas delícias, querer ser eterno.
 Sou alegre e sou triste, meio a meio.
 Levas tudo a peito, diz a minha mãe,
 dá uma volta, distrai-te, vai ao cinema.

 A mãe não sabe, cinema é como diria o avô:
 «cinema é gente passando.
 Viu uma vez, viu todas.»

 Com perdão da palavra, quero cair na vida.
 Quero ficar no parque, a voz do cantor açucarando a tarde…
 Assim escrevo: tarde. Não a palavra,
 a coisa.

16 de nov. de 2012

Dolores de Adélia Prado


Hoje me deu tristeza,
sofri três tipos de medo
acrescido do fato irreversível:
não sou mais jovem.
Discuti política, feminismo,
a pertinência da reforma penal,
mas ao fim dos assuntos
tirava do bolso meu caquinho de espelho
e enchia os olhos de lágrimas:
não sou mais jovem.
As ciências não me deram socorro,
não tenho por definitivo consolo
o respeito dos moços.
Fui no Livro Sagrado
buscar perdão pra minha carne soberba
e lá estava escrito:
"Foi pela fé que também Sara, apesar da idade avançada,
se tornou capaz de ter uma descendência..."
Se alguém me fixasse, insisti ainda,
num quadro, numa poesia...
e fossem objetos de beleza os meus músculos frouxos...
Mas não quero. Exijo a sorte comum das mulheres nos tanques,
das que jamais verão seu nome impresso e no entanto
sustentam os pilares do mundo, porque mesmo viúvas dignas
não recusam casamento, antes acham sexo agradável,
condição para a normal alegria de amarrar uma tira no cabelo
e varrer a casa de manhã.

Uma tal esperança imploro a Deus.

"Adélia Prado - Poesia Reunida", Editora Siciliano, 1991. pág. 194.

João Fasolino (1987, Rio de Janeiro)