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13 de abr. de 2015

Nas cidades a vida é mais pequena (Alberto Caieiro / Fernando Pessoa) imagens: Lúcia Neto


Nas cidades a vida é mais pequena
Que aqui na minha casa no cimo deste outeiro.
Na cidade as grandes casas fecham a vista à chave,
Tornam-nos pequenos porque nos tiram o que nossos olhos
nos podem dar
E tornam-nos pobres porque a nossa única riqueza é ver






11 de nov. de 2014

Um corpo :: Adélia Prado

Jerry McElroy

Um corpo quer outro corpo.
Uma alma quer outra alma e seu corpo.
Este excesso de realidade me confunde.
Jonathan falando:
parece que estou num filme.
Se eu lhe dissesse você é estúpido
ele diria sou mesmo.
Se ele dissesse vamos comigo ao inferno passear
eu iria.
As casas baixas, as pessoas pobres,
e o sol da tarde,
imaginai o que era o sol da tarde
sobre a nossa fragilidade.
Vinha com Jonathan
pela rua mais torta da cidade.
O Caminho do Céu.


10 de dez. de 2013

Eu toco na santidade :: Clarice Lispector


Por que escrevo sobre uma jovem que nem pobreza enfeitada tem?
Talvez porque nela haja um recolhimento e também porque na pobreza de corpo e espírito eu toco na santidade, eu que quero sentir o sopro do meu além.
LISPECTOR, Clarice. A hora da estrela. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1993. p. 35

28 de nov. de 2012

O Sapo - Débora Siqueira Bueno


Aos pés da Serra do Sapo
um lugar perdido,
por assim dizer, nenhum,
traz o mesmo nome:
Sapo.
Nem gastou poesia
para o batizado –
o batráquio feio,
córrego qualquer
é o seu padrinho.

De lá se avista a serra,
dita do Sapo,
crivada de estacas
que vão, buliçosas,
sondar seu interno.
Lá havia ouro,
diziam escravos,
mas braços miúdos
de força pequena
não foram buscá-lo.

Aos pés da Serra do Sapo
a pequena vila,
de tão pobre,
quase dói.
O gado esquálido pasta
a grama murcha e seca
no entorno da capela,
que a Companhia
prometeu cobrir
com novo telhado.

São andaimes toscos
nos quais se equilibram
homens murchos, secos,
que vão consertando
a capela onde
nem sabem se um dia
poderão rezar.
Se estarão vivos
ou, não é bem certo,
capela haverá.

Na vila do Sapo,
novo movimento
levanta a poeira
vermelha e grudenta.
Logo toldará
o brilho prateado,
pois nessa beirada
perdida do mundo
inda existe quem
areie as panelas.

A Companhia promete
caminhão pipa
pra lavar as ruas,
assentar poeiras,
descansar os homens
da vista do pó,
descansar a vista
do que está por vir –
rês de matadouro,
não se olha o olho.

Ao lugar chamado
Sapo
foi determinada,
com muita discrição,
morte inexorável:
sua terra será levada.
Serra tão erma,
gente tão órfã,
poucos prantearão
sua agonia.

Lentamente será aberta
a redondez da montanha.
Feita a incisão,
interior exposto,
virão os abutres,
urubus enormes,
prontos pra comer
com voracidade
todo o conteúdo
daquela barriga.

Talvez mesmo a serra
cedesse, bom grado,
parte do seu ventre.
Não terá tal chance.
Separada em partes,
toda esquartejada,
os seus intestinos
virarão pedaços
que viajarão
pra esse mundão de Deus.

O Sapo e sua serra
aguardam
a execução da sentença.
Homens, bois, cães sonolentos,
senhoras, crianças, latas reluzentes –
todos irão embora.
Tomarão seu rumo,
buscarão a vida;
não cria raízes
chão que esfarinha.

Montanhas esvaeceram
qual fossem levadas
pela ação do tempo.
Mas assim morreram, de morte matada:
Serra da Pedra Grande, Serra do Curral,
Pico do Cauê.
Assiste-se agora
à morte anunciada:
a Serra do Sapo
tornará  buraco.

10 de nov. de 2012

Pobreza de Clarice Lispector


Fernand Pelez


Fernand Pelez
Fernand Pelez


Fernand Pelez

Porque na pobreza de corpo e espírito eu toco na santidade, eu que quero sentir o sopro do meu além. Para ser mais do que eu, pois tão pouco sou.



João Fasolino (1987, Rio de Janeiro)