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13 de nov. de 2014

Minha mãe me disse :: Elba Serafini

Walasse Ting
Minha mãe me disse
que todos os mortos são anjos,
escutas prováveis
de nossos rogos
deve-se apenas pedir em alta voz
e esperar em silêncio
uma resposta, ter paciência,
depositar em outro 
nosso destino

Assim, a crença inusitada
se alimenta
de um imaginário
círculo de perfeição
sobre a terra.

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Mi madre dice

que todos los muertos son ángeles,
potenciales escuchas
de nuestros ruegos
solo hay que pedir en voz alta
y esperar en silencio
una respuesta, ser pacientes,
depositar en otro
nuestro destino.

Así, la inusitada creencia
se alimenta
de un imaginário
círculo de perfección
sobre la tierra.

fonte: DINAMARCA. Buenos Aires: Sigamos Enamoradas, 2007.

25 de dez. de 2012

Os anjos de José Saramago

Wilton Diptych (c. 1395 – 1399)

(...) os anjos existem para tornar-nos a vida mais fácil, amparam-nos quando vamos a cair ao poço, guiam-nos no perigoso passo da ponte sobre o precipício, puxam-nos pelo braço quando estamos quase a ser atropelados por uma quadriga sem freio ou por um automóvel sem travões. Um anjo realmente merecedor de Jesus (...)”

fonte: O Evangelho segundo Jesus Cristo, 1991.

11 de set. de 2012

Belo, belo de Manuel Bandeira


Belo belo belo,
Tenho tudo quanto quero.

Tenho o fogo de constelações extintas há milênios.
E o risco brevíssimo — que foi? passou — de tantas estrelas cadentes.

A aurora apaga-se,
E eu guardo as mais puras lágrimas da aurora.

O dia vem, e dia adentro
Continuo a possuir o segredo grande da noite.

Belo belo belo,
Tenho tudo quanto quero.

Não quero o êxtase nem os tormentos.
Não quero o que a terra só dá com trabalho.

As dádivas dos anjos são inaproveitáveis:
Os anjos não compreendem os homens.

Não quero amar,
Não quero ser amado.

Não quero combater,
Não quero ser soldado.

— Quero a delícia de poder sentir as coisas mais simples.

5 de set. de 2012

Dança Dos Meninos Composição: Marco Antônio Guimarães, Milton Nascimento


Aleijadinho


Olha bem para mim
Dentro de meu sentimento e tudo de mim
Seja meu lar, uma canção, um carinho
Uma frase de paz
Te acorda é a dança o momento
A roda que vai embalando o amor
Canta um refrão, mostra um sorriso
Canta um refrão, mostra que quer viver
E posso lembrar 
A primeira noite que te vi entoar
Uma emoção
Tanto calor em seu rosto
Como em toda visão
É o mundo, é a senha
Pra que eu te sentisse ali
Força de um leão
Venha de lá anjo suave
Sem esperar grita que quer viver 

2 de mai. de 2012

Verossímil de Adélia Prado


W.-A. Bouguereau. A canção dos anjos. 1881

Antigamente, em maio, eu virava anjo.
A mãe me punha o vestido, as asas,
me encalcava a coroa na cabeça e encomendava:
‘canta alto, espevita as palavras bem’.
Eu levantava voo rua acima.

Adélia Prado, em “Bagagem”

14 de mar. de 2012

Licença de Débora Siqueira Bueno



Quando nasci eu era roxa. 
Não sei se havia anjos 
mas respirei fundo, 
recebi minha missão. 

Falta de ar conheço bem, 
me ensinou a espera. 
Falta de amor graças a Deus não tive muita, 
no ter e não ter fui me fazendo. 

Tão sempre a falta. 
Apesar das pernas das moças, 
despeito o cheiro bom dos moços, 
desejo, de contínuo se escapa. 

Meu nome quer dizer abelha – 
aquela que sempre trabalha. 
Desde o tempo que a memória alcança 
amanheço e entardeço no cuidado. 

Parece dom, mas é sina mineral 
buscar o que advém e é profundeza; 
separar pedra e entulho, encontrar beleza 
oculta na vastidão do sofrimento. 

Quero traçar de novo o meu destino, 
peço licença pra mudar de lavra. 
De agora em diante, carrego a bateia 
para lidar no garimpo das palavras.

9 de fev. de 2012

Voltar aos 17 de Violeta Parra


O rapto de Psique (1895) William-Adolphe Bouguereau

De par a par la ventana
Se abrió como por encanto,
Entró el amor con su manto
Como una tibia mañana,
Al son de su bella diana
Hizo brotar el jazmín,
Volando cual serafín
Al cielo le puso aretes
Y mis años en dicisiete
Los convirtió el querubín 
......................................................................................

De par em par a janela se abriu como por encanto
Entrou o amor com seu manto como uma cálida manhã
Ao som de sua bela alvorada fez brotar o jasmim
Voando qual serafim ao céu lhe pôs brincos
Meus anos em 17 os converteu o querubim


24 de dez. de 2011

O Evangelho segundo Jesus Cristo de José Saramago

 Sandro Botticelli - The Cestello Annunciation c. 1489

“Dizer um anjo que não é anjo de perdões, ou nada significa, ou significa demasiado, vamos por hipótese, que é anjo das condenações, é como se exclamasse, Perdoar, eu, que ideia estúpida, eu não perdoo, castigo. Mas os anjos, por definição, tirando aqueles querubins de espada flamejante que foram postos pelo Senhor a guardar o caminho da árvore da vida para que não voltassem pelos frutos dela os nossos primeiros pais, ou os seus descendentes, que somos nós, os anjos, íamos dizendo, não são polícias, não se encarregam das sujas mas socialmente necessárias tarefas de repressão, os anjos existem para tornar-nos a vida mais fácil, amparam-nos quando vamos a cair ao poço, guiam-nos no perigoso passo da ponte sobre o precipício, puxam-nos pelo braço quando estamos quase a ser atropelados por uma quadriga sem freio ou por um automóvel sem travões. Um anjo realmente merecedor de Jesus (...)”

4 de out. de 2010

O céu sobre Berlim






No filme de Wenders, com versos de Handke, os anjos fingem estar fartos de um tempo infinito.
Sonham com os pequenos tempos de sentar-se à mesa a jogar cartas. Ser cumprimentado na rua, nem que seja com um aceno. Ter febre. Ficar com os dedos sujos de ler o jornal. Entusiasmar-me com uma refeição ou com a curva de uma nuca. Mentir com habilidade. Ao andar sentir a ossatura mexer-se a cada passo. Supor, em vez de saber sempre tudo. Cá em baixo, os humanos não suspeitam da beleza do peso, que os segura à terra e fingem
o futuro em cada minuto, para deixar de dizer agora, agora, agora..."

Inês Lourenço, "A Enganadora Respiração da Manhã"

17 de jul. de 2008

Anjo - Madri




“ Os anjos não dão os ombros, não;
 quando querem mostrar indiferença
 os anjos dão as asas.”

 Mário Quintana, in Caderno H 

João Fasolino (1987, Rio de Janeiro)