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14 de nov. de 2013

O chão é a grande pergunta - Nuno Ramos


Angela Doelling
O chão é a grande pergunta
haver chão
se tudo voa
e quer cantar.

Haver morte e poeira
cobrindo os lábios carnudos
e gozo
nos fios dos cabelos mortos.

Voltar quando partir
parece o impulso da bússola
parece o recado da ave
parece a cartilha do sopro.

RAMOS, Nuno.  Junco.  São Paulo: Iluminuras, 2011.  118 p. 

18 de out. de 2013

Não são apenas os relógios de Albano Martins


Também se pode

regressar sem partir. Não são apenas

os relógios que se atrasam, às vezes

é o próprio tempo. E todos

os cuidados são

então necessários. Há sempre

um comboio que rola

a nosso lado sem luzes

e sem freios. E pode

faltar-nos o estribo ou já

não haver lugar

na carruagem da frente.


escrito a vermelho. campo das letras, 1999


20 de dez. de 2011

Cais Matutino de Ribeiro, extrato crônica de Carlos Heitor Cony



(...) Embora escreva crônicas para jornais ou revistas há bastante tempo, não costumo abordar temas literários. Eventualmente comento um livro ou um autor, mas em 60 anos de ofício são raros os textos sobre o assunto.
Faço este registro da Série Essencial da ABL para ter o pretexto de transcrever um pequeno poema de Ribeiro Couto, que há anos mantenho sob o vidro da minha mesa de trabalho:

"Cais Matutino"
"Mercado do peixe, mercado da aurora: cantigas, apelos, pregões e risadas à proa dos barcos que chegam de fora.
Cordames e redes dormindo no fundo; à popa estendidas, as velas molhadas; foi noite de chuva nos mares do mundo.
Pureza do largo, pureza da aurora, há viscos de sangue no solo da feira, se eu tivesse um barco, partiria agora.
O longe que aspiro no vento salgado tem gosto de um corpo que cintila e cheira para mim sozinho, num mar ignorado."



Quando estou triste, muito triste mesmo, e descrente de quase tudo, leio com renovada atenção este pequeno poema, apesar de sabê-lo de cor.

fonte:  Folha de São Paulo, Ilustrada sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

João Fasolino (1987, Rio de Janeiro)