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20 de jun. de 2014

Toda mulher :: Ana Cristina César


Martiros Saryan,1939

a coisa que mais o preocupava
naquele momento
era estudo de mulher 

toda mulher
dos quinze aos dezoito.

Não sou mais mulher.
Ela quer o sujeito.
Coleciona histórias de amor.

13 de mar. de 2014

Voando com o pássaro :: Ana Cristina Cesar (1952-1983)

Erik Hedin - Borlänge
Tu queres sono: despe-te dos ruídos, e
dos restos do dia, tira da tua boca
o punhal e o trânsito, sombras de
teus gritos, e roupas, choros, cordas e
também as faces que assomam sobre a
tua sonora forma de dar, e os outros corpos
que se deitam e se pisam, e as moscas
que sobrevoam o cadáver do teu pai, e a dor (não ouças)
que se prepara para carpir tua vigília, e os cantos que
esqueceram teus braços e tantos movimentos
que perdem teus silêncios, o os ventos altos
que não dormem, que te olham da janela
e em tua porta penetram como loucos
pois nada te abandona nem tu ao sono.     

17 de fev. de 2014

O Homem Público N. 1 de Ana Cristina Cesar

Ana Cristina Cesar 
Tarde aprendi
bom mesmo
é dar a alma como lavada.
Não há razão
para conservar
este fiapo de noite velha.
Que significa isso?
Há uma fita
que vai sendo cortada
deixando uma sombra
no papel.
Discursos detonam.
Não sou eu que estou ali
de roupa escura
sorrindo ou fingindo
ouvir.
No entanto
também escrevi coisas assim,
para pessoas que nem sei mais
quem são,
de uma doçura
venenosa
de tão funda.

6 de jul. de 2013

Ana Cristina Cesar lê Clarice – por Elizama Almeida





É de conhecimento coletivo que Ana Cristina costumava fazer resumos, anotações, riscos – verdadeiras interações com os livros que lia. Logo na folha de rosto da edição de A legião estrangeira, ela avisa: “antes de ler este volume veja a página 137”. Seguindo a pista, somos levados a um texto intitulado “Mas já que se há de escrever…”, composto de apenas duas linhas: “Mas já que se há de escrever, que ao menos não se esmaguem com palavras as entrelinhas”. A lápis, Ana Cristina assinalou: “genial” – adjetivo que seria usado para qualificar diversos outros trechos ao longo do livro. Acima do aviso estão a data e o local – presume-se – do início da leitura: Porto Alegre, 12 de dezembro de 1967. A leitora contava apenas quinze anos.

fonte: http://blogdoims.uol.com.br/ims/ana-cristina-cesar-le-clarice-por-elizama-almeida/



30 de jun. de 2013

Tenho uma folha branca de ANA CRISTINA CESAR



Tenho uma folha branca

e limpa à minha espera:

mudo convite

tenho uma cama branca

e limpa à minha espera:

mudo convite:

tenho uma vida branca

e limpa à minha espera.

29 de jun. de 2013

16 de abr. de 2013

Ana Cristina César (1952- 1983)


I
olho muito tempo o corpo de um poema
até perder de vista o que não seja corpo
e sentir separado dentre os dentes
um filete de sangue
nas gengivas
II 
Tenho uma folha branca
e limpa à minha espera:
mudo convite

tenho uma cama branca
e limpa à minha espera:
mudo convite

tenho uma vida branca
e limpa à minha espera

7 de jan. de 2013

Acreditei de Ana Cristina César (1952-1983)

Acreditei que se amasse de novo
esqueceria outros
pelo menos três ou quatro rostos que amei
Num delírio de arquivística
organizei a memória em alfabetos
como quem conta carneiros e amansa
no entanto flanco aberto não esqueço
e amo em ti os outros rostos

João Fasolino (1987, Rio de Janeiro)