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25 de ago. de 2014

Não basta abrir a janela :: Fernando Pessoa

 Childe Hassam
Não basta abrir a janela
Para ver os campos e o rio.
Não é bastante não ser cego
Para ver as árvores e as flores.
É preciso também não ter filosofia nenhuma.
Com filosofia não há árvores: há ideias apenas.
Há só cada um de nós, como uma cave.
Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;
E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse,
Que nunca é o que se vê quando se abre a janela.

In Poemas de Alberto Caeiro. Fernando Pessoa. (Nota explicativa e notas de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa: Ática, 1946 (10ª ed. 1993).  p. 75.

10 de abr. de 2013

Vaguedades de ROSALÍA DE CASTRO


Magritte

Bem sei que non hai nada
Novo en baixo do ceo, 
Que antes outros pensaron 
As cousas que ora eu penso. 
E bem, ¿para que escribo? 
E bem, porque así semos, 
Relox que repetimos 
Eternamente o mesmo. 

Tal como as nubes 
Que impele o vento, 
I agora asombran, i agora alegran 
Os espazos inmensos do ceo, 

Así as ideas 
Loucas que eu teño, 
As imaxes de múltiples formas, 
De estranas feituras, de cores incertos, 
Agora asombran, 
Agora acraran 
O fondo sin fondo do meu pensamento. 

...................... 

VAGUEDADES

Bem sei que não há nada de 
Novo sob o céu, 
Que antes outros pensaram 
As cousas que ora eu penso. 
Bem, para que escrevo? 
Bem, porque somos assim: 
Relógios que repetem 
Eternamente o mesmo. 

Tal como as nuvens 
Que impele o vento, 
E ora assombram, e ora alegram 
Os espaços imensos do céu, 
Assim as idéias 
Loucas qu´eu tenho, 
As imagens de múltiplas formas, 
D´estranhas feituras, de cores incertas, 
Ora assombram, 
Ora aclaram 
O fundo sem fundo do meu pensamento. 

Tradução de Andityas Soares de Moura

ROSALÍA DE CASTRO (1837-1885)  Natural da Galícia, Espanha, nasceu na cidade de Santiago de Compostela. Sua poesia inspira-se na lírica popular trovadoresca e foi escrita em galego e em castelhano. Considerada a figura mais importante da poesia galega do século XIX, publicou os livros Cantares Gallegos (1863) e Folhas Novas (1880), ambos escritos em galego, e En las Orillas del Sar (1884), este considerado os primeiros versos modernos em língua castelhana.  Sua poesia será relida e valorizada pela geração de 1898: Antonio Machado, Miguel de Unamuino, Juan Ramón Jiménez e, mais tarde, Federico García Lorca.

28 de mar. de 2012

Não basta abrir a janela de Fernando Pessoa / Alberto Caieiro



Não basta abrir a janela

Para ver os campos e o rio.

Não é bastante não ser cego
Para ver as árvores e as flores.
É preciso também não ter filosofia nenhuma.
Com filosofia não há árvores: há idéias apenas.
Há só cada um de nós, como uma cave.
Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;
E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse,
Que nunca é o que se vê quando se abre a janela.

“Poemas Inconjuntos”. In Poemas de Alberto Caeiro. Fernando Pessoa. (Nota explicativa e notas de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa: Ática, 1946 (10ª ed. 1993). - 75. 

11 de mai. de 2008

Palavra



Brilham como pedras coloridas, saltam como peixes de prata, são espuma, fio, metal, orvalho...São tão belas que quero colocá-las todas em meu poema... Agarro-as no vôo, quando vão zumbindo, e capturo-as, limpo-as, aparo-as, preparo-me diante do prato, sinto-as cristalinas, vibrantes, ebúrneas, vegetais, oleosas, como frutas, como algas, como ágatas, como azeitonas... E então as revolvo, agito-as, trituro-as, adorno-as, liberto-as... Deixo-as como estalactites em meu poema como pedacinhos de madeira polida, como carvão, como restos de naufrágio, presentes da onda... Tudo está na palavra... Uma idéia inteira muda porque uma palavra mudou de lugar ou porque se sentou como uma rainha dentro de uma frase que não a esperava e que lhe obedeceu... Têm sombra, transparência, peso, plumas, pêlos, têm tudo o que se lhes foi agregado de tanto vagar pelo rio, de tanto transmigrar de pátria, de tanto ser raízes... São antiqüíssimas e recentíssimas. 
Pablo Neruda in Confesso que vivi

João Fasolino (1987, Rio de Janeiro)