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16 de nov. de 2014

Não sei se sabes de Rui Costa

The fire - Rene Magritte, 1943
Não sei se sabes
que a meio da manhã

o verde dos teus lábios

passou para as encostas

e um gomo transparente

adormeceu nos juncos e abriu.

Abriu um brilho qualquer

na gruta fria e pôs uma fogueira

pequenina numa taça

e elevou as mãos quentes

pelo dia.


talvez tu saibas que o principal

do amor

é uma montanha de efeitos secundários.



In: A Nuvem Prateada das Pessoas Graves. Edições Quasi

2 de jan. de 2014

O pão de Rui Costa


Há pessoas que amam
Com os dedos todos sobre a mesa.
Aquecem o pão com o suor do rosto
E quando as perdemos estão sempre
Ao nosso lado.
Por enquanto não nos tocam:
A lua encontra o pão caiado que comemos
Enquanto o riso das promessas destila
Na solidão da erva.
Estas pessoas são o chão
Onde erguemos o sol que nos falhou os dedos
E pôs um fruto negro no lugar do coração.
Estas pessoas são o chão
Que não precisa de voar.

a nuvem prateada das pessoas graves. quasi, 2005

29 de nov. de 2013

A nuvem prateada das pessoas graves de Rui Costa

Magritte

Nem sempre se deve desconfiar das pessoas graves, aquelas que caminham com o pescoço inclinado para baixo, os olhos delas a tocar pela primeira vez o caminho que os pés confirmarão depois. Às vezes elas vêem o céu do outro lado do caminho que é o que lhes fica por baixo dos pés e por isso do outro lado do mundo. O outro lado do mundo das pessoas graves parece portanto um sítio longe dos pés e mais longe ainda das mãos que também caem nos dias em que o ar pode ser mais pesado e os ossos se enchem de uma substância morna que não se sabe bem o que é.
Na gravidade dos pés e da cabeça, e também dos olhos, com que nos são alheias quando as olhamos de frente rumo ao lado útil do caminho que escolhemos, essas pessoas arrastam uma nuvem prateada que a cada passo larga uma imagem daquilo que foram ou das pessoas que amaram.

Essas imagens podem desaparecer para sempre se forem pisadas quando caem no chão. A gravidade dos pés e da cabeça, e também dos olhos, dessas pessoas, é, por isso, uma subtil forma de cuidado.

a nuvem prateada das pessoas graves
quasi
2005

João Fasolino (1987, Rio de Janeiro)