10 de abr. de 2012

Calu Fontes

















Tudo o que temos – e nos escapa. Maria Rita Kelh

Ferdinand Hodler
O passado tornou-se o único terreno seguro onde a imaginação pode armar sua tenda e contemplar o mundo em relativa tranqüilidade. Na vida em retrospecto, todas as nossas escolhas teriam sido corretas. Teríamos sido abolicionistas no século XIX, modernistas nos anos 1920, resistentes antifascistas em 1930-40, opositores firmes contra as duas ditaduras brasileiras. O passado nos poupa da dimensão trágica da escolha. 
Mas é no presente que o corpo está vivo. No presente é que se jogam os lances de dados do destino. Ele é tudo o que temos – e nos escapa.

9 de abr. de 2012

Andorinha de Manuel Bandeira



Andorinha lá fora está dizendo: 
- "Passei o dia à toa, à toa!"

Andorinha, andorinha, minha cantiga é mais triste! 
Passei a vida à toa, à toa...

8 de abr. de 2012

Copo de Leite






Oração de Antônio Maria

"Rosinha Desossée, me tire desse quarto de hotel e de todas as coisas que entram pela janela; me leve para longe das palmeiras, mais longe e perto das coisas mais macias; me faça esquecer (depressa) os homens ruins — isto é: os que gostam de cebola crua; me ensine, Rosinha Desossée, tudo o que eu não aprendi: a cortar com a mão direita, a usar anel, a tocar piano, a desenhar uma árvore e valsar; e me lembre do que eu esqueci — raiz quadrada, (as mais ordinárias), frações, latim, geofísica e "Navio Negreiro", de Castro Alves; depois, me dê, pelo bem dos seus filhinhos, aquilo que eu não tenho há quase um ano, carinho — de um jeito que eu não sei dizer como é, mas que há, por aí ou, pelo menos, já houve; destelhe a casa, deixe a noite entrar e, juntos, vamos nos resfriar; espirre de lá, que eu espirro de cá... agora, cada um com a sua bombinha, inalação, inalação; lado a lado, sentemos, os dois de perfil para o ventilador; minhas mãos e as suas não são de ninguém, entendido?; se interesse por mim e pergunte o que eu sei, que eu quero exclamar, no mais puro francês: "oh!"..."comment allez vous"? (...) de um jeito ou de outro, me tire daqui, pra Pérsia, Sibéria, pro Clube da Chave, pra Marte, Inglaterra, sem couvert, sem couvert; está vendo o retrato dos meus 20 anos? de lá para cá, cansaço, pé chato, gordura, calvície fizeram de mim essa coisa ansiosa, insegura e com sono, que pede a você, no auge do manso: você, Desossée, não saia esta noite e fique, ao meu lado, esperando que o sono me tome e me mate, me salve e me leve, por amor ao teu andar, assim seja..."

Antonio Maria , 30-03-1954
Rosinha Desossée, uma prostituta, 

7 de abr. de 2012

Damian Elwes (1960) pintor britânico












Damian Elwes (1960) pintor britânico, residindo atualmente nos Estados Unidos da América.

Dois


Ciranda da Bailarina de Chico Buarque


Antonio Canova (1757–1822) 


Procurando bem

Todo mundo tem pereba

Marca de bexiga ou vacina
E tem piriri, tem lombriga, tem ameba
Só a bailarina que não tem
E não tem coceira
Verruga nem frieira
Nem falta de maneira
Ela não tem

Futucando bem

Todo mundo tem piolho

Ou tem cheiro de creolina
Todo mundo tem um irmão meio zarolho
Só a bailarina que não tem
Nem unha encardida
Nem dente com comida
Nem casca de ferida
Ela não tem

Não livra ninguém

Todo mundo tem remela

Quando acorda às seis da matina
Teve escarlatina
Ou tem febre amarela
Só a bailarina que não tem
Medo de subir, gente
Medo de cair, gente
Medo de vertigem
Quem não tem

Confessando bem

Todo mundo faz pecado

Logo assim que a missa termina
Todo mundo tem um primeiro namorado
Só a bailarina que não tem
Sujo atrás da orelha
Bigode de groselha
Calcinha um pouco velha
Ela não tem

O padre também

Pode até ficar vermelho

Se o vento levanta a batina
Reparando bem, todo mundo tem pentelho
Só a bailarina que não tem
Sala sem mobília
Goteira na vasilha
Problema na família
Quem não tem

Procurando bem

Todo mundo tem...

6 de abr. de 2012

Dez



Pequenas ternuras de Paulo Mendes de Campos


“Quem coleciona selos para o sobrinho; quem acorda de madrugada e estremece no desgosto de si mesmo ao lembrar que há muitos anos feriu a quem amava; quem chora no cinema ao ver o reencontro de pai e filho; quem segura sem temor uma largatixa e lhe faz com os dedos uma carícia; quem se se detém no caminho para contemplar a flor silvestre; quem se ri das próprias rugas ou de já não agüentar subir uma escada como antigamente; quem decide aplicar-se ao estudo de uma língua morta depois de um fracasso amoroso; quem procura numa cidade os traços da cidade que passou, quando o que é velho era frescor e novidade; quem se deixa tocar pelo símbolo da porta fechada; quem costura roupas para os lázaros; quem envia bonecas às filhas dos lázaros; quem diz a uma visita pouco familiar, já quebrando a cerimônia com um início de sentimento: " Meu pai só gostava de sentar-se nessa cadeira”; quem manda livros para os presidiários; quem ajuda a fundar um asilo de órfãos; quem se comove ao ver passar de cabeça branca aquele ou aquela, mestre ou mestra, que foi a fera do colégio; quem compra na venda verdura fresca para o canário; quem se lembra todos os dias de um amigo morto; quem jamais negligencia os ritos da amizade; quem guarda, se lhe derem de presente, a caneta e o isqueiro que não mais funcionam; quem, não tendo o hábito de beber, liga o telefone internacional no segundo uísque para brincar com amigo ou amiga distante; quem coleciona pedras, garrafas e folhas ressequidas; quem passa mais de quinze minutos a fazer mágicas para as crianças; quem guarda as cartas do noivado com uma fita; quem sabe construir uma boa fogueira; quem entra em ligeiro e misterioso transe diante dos velhos troncos, dos musgos e dos liquens; quem procura decifrar no desenho da madeira o hieróglifo da existência; quem não se envergonha da beleza do pôr-do-sol ou da perfeição de uma concha; quem se desata em riso à visão de uma cascata; quem não se fecha à flor que se abriu de manhã; quem se impressiona com as águas nascentes, com os transatlânticos que passam, com os olhos dos animais ferozes; quem se perturba com o crepúsculo; quem visita sozinho os lugares onde já foi feliz ou infeliz; quem de repente liberta os pássaros do viveiro; quem sente a pena da pessoa amada e não sabe explicar o motivo; quem julga perceber o “pensamento” do boi e do cavalo; todos eles são presidiários da ternura e, mesmo aparentemente livres como os outros, andarão por toda parte acorrentados, atados aos pequenos amores da grande armadilha terrestre”.

Paulo Mendes Campos. “O amor acaba” – crônicas líricas e existenciais. RJ, Civilização Brasileira, 2001.

4 de abr. de 2012

Philippe Halsman, fotógrafo

 Audrey Hepburn, 1955

Brigitte Bardot, 1951

 Grace Kelly, 1959


 Janet Leigh, 1951

 Lena Horne, 1954

 Marilyn Monroe and Philippe Halsman, 1954

                                                                                          Sophia Loren, 1959


                                                                                                 Edward Villela, 1961

Philippe Halsman nasceu na Letonia em 1906, e começou sua carreira fotográfica em Paris no início dos anos 30. Emigrou para Nova York, no outono de 1940. Logo se tornou um dos fotógrafos mais importantes da América. Morreu em 1979.

Da nossa semelhança com os deuses - Fernando Pessoa ( Ricardo Reis )

Por nosso bem tiremos
Julgarmo-nos deidades exiladas
E possuindo a Vida
Por uma autoridade primitiva
E coeva de Jove.
Altivamente donos de nós-mesmos,
Usemos a existência
Como a vila que os deuses nos concedem
Para esquecer o Estio.
Não de outra forma mais apoquentada
Nos vale o esforço usarmos
A existência indecisa e afluente
Fatal do rio escuro.
Como acima dos deuses o Destino
É calmo e inexorável,
Acima de nós-mesmos construamos
Um fado voluntário

Que quando nos oprima nós sejamos
Esse que nos oprime,
E quando entremos pela noite dentro
Por nosso pé entremos.
30-7-1914
Odes de Ricardo Reis . Fernando Pessoa. (Notas de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa: Ática, 1946 (imp.1994).  - 40.

Bela-emília, plumbago, jasmim-azul, dentilária





Nome Científico: Plumbago auriculata
Sinonímia: Plumbago capensis
Nome Popular: Bela-emília, plumbago, jasmim-azul, dentilária
Família: Plumbaginaceae
Divisão: Angiospermae
Origem: África do Sul
Ciclo de Vida: Perene

Planta muito versátil e rústica, a bela-emília é largamente utilizada no paisagismo. Arbustiva e muito ramificada presta-se para cercas-vivas e pode ser tutorada como trepadeira. Suas flores são delicadas em forma de pequenos buquês. É mais comum encontrarmos espécimes de flores azuladas embora exista uma variedade de flores brancas.
Deve ser cultivada sempre a pleno sol; isolada, em conjuntos ou como cerca-viva. Não é muito exigente em fertilidade e pode-se renovar a folhagem e estimular a floração com podas regulares. Multiplica-se por estacas, mergulhia e sementes e é tolerante ao frio.
fonte: http://www.jardineiro.net

3 de abr. de 2012

Olinda de Carlos Pena Filho (1929/1960)

Lucy Passos
De limpeza e claridade
é a paisagem defronte. 
Tão limpa que se dissolve 
A linha do horizonte. 

As paisagens muito claras 
Não são paisagens, são lentes. 
São íris, sol, aguaverde 
Ou claridade somente. 

Olinda é só para os olhos, 
Não se apalpa, é só desejo. 
Ninguém diz: é lá que eu moro 
Diz somente: é lá que eu vejo.