16 de out. de 2012

Dar a vocês o que sinto como flor de Clarice Lispector




Escrevo de Lausanne, sentada no parapeito do lago Leman. Perto tem uma orquestra com uma mulher tocando violino, uma marcha meio valsa, meio militar. Junto tem um hotelzinho estreito chamado Hotel du Port. Há montanhas a pique na outra margem do lago. Há uma fontezinha dividida em três ramos sobre uma bacia de pedra. Há uma criança comendo um biscoito. Uma mulher de chapéu branco num barco. Vocês quase que podem adivinhar que é sábado de tarde. O lago é de água doce e tem um cheiro gostoso de água. O lago é enorme e transparente. Junto de mim é esverdeado. Mas do meio para o fim está da cor do céu e a montanha mesmo está da cor do céu. Hoje à noite vai ter uma festa noturna no lago, sobre um barco. No banco está sentada uma mulher com o chapéu preto e fita branca enterrado até os olhos como em 1920 e tanto, lendo jornal. Isso que eu estou sentindo pode-se chamar de felicidade. Só que a natureza se faz tão estranha que o próprio momento de felicidade é de temor, susto e apreensão. É pena que não possa dar o que se sente, porque eu gostaria de dar a vocês o que sinto como flor.
Lausanne, 13 de julho de 1946


15 de out. de 2012

13 de out. de 2012

Lembrar-se de Clarice Lispector

"Escrever é tantas vezes lembrar-se do que nunca existiu. Como conseguirei saber do que nem ao menos sei? assim: como se me lembrasse. Com um esforço de "memória", como se eu nunca tivesse nascido. Nunca nasci, nunca vivi: mas eu me lembro, e a lembrança é em carne viva."
In: "Para não Esquecer". Rocco. p. 24

Beija-flor Albino











12 de out. de 2012

Tipuana - árvore






Nome Científico: Tipuana tipu
Sinonímia: Machaerium fertile, Machaerium tipu, Tipuana speciosa
Nomes Populares: Tipuana, Amendoim-acácia
Família: Fabaceae
Categoria: Árvores, Árvores Ornamentais
Clima: Mediterrâneo, Subtropical,Temperado, Tropical
Origem: América do Sul, Argentina,Bolívia
Altura: 9.0 a 12 metros, acima de 12 metros
Luminosidade: Sol Pleno
Ciclo de Vida: Perene
A tipuana é uma árvore decídua e florífera, de copa ampla e densa, que já foi largamente utilizada na arborização urbana tanto no Brasil como em outros países. Algumas cidades, como São Paulo e Porto Alegre, com certeza teriam uma paisagem bem diferente sem suas tão características tipuanas ladeando as ruas e parques. No entanto, atualmente tem sido preterida em favor de outras espécies devido ao seu porte avantajado, raízes agressivas e à fragilidade de sua madeira, que é mais propícia a quebras e cupins, principalmente nos indivíduos mais velhos e sem manutenção adequada.


Seu tronco apresenta casca cinzenta escura, de superfície rugosa e fissurada, que é excelente para a fixação de plantas epífitas como orquídeas, bromélias e samambaias. As folhas são grandes, opostas, imparipinadas, compostas por numerosos folíolos oblongos e verdes. A floração ocorre no final do inverno e na primavera, despontando inflorescências em rácemos pendentes, axilares ou terminais, com numerosas flores alaranjadas com uma pequena mancha marrom na base, que lembram também as flores do pau-brasil, entre outras fabáceas. Os frutos são do tipo vagem, indeiscentes e alados.


No paisagismo, a tipuana é ideal para cultivar em grandes espaços, por ser uma árvore bela e frondosa. Seu crescimento é considerado rápido e admite podas. É interessante deixar a primeira bifurcação da planta o mais alta possível, evitando assim que os ramos terminais, pendentes, toquem o chão, salvo quando essa característica for desejada. Não convém utilizá-la na arborização de calçadas, estacionamentos, residências e canteiros centrais, devido às características especificadas no primeiro parágrafo. No entanto, é possível e interessante seu plantio em amplos parques e praças, à uma distância segura de construções e pavimentações.


Deve ser cultivada sob sol pleno, preferencialmente em solo fértil, profundo, enriquecido com matéria orgânica e irrigado regularmente no primeiro ano de implantação. Aprecia o calor e a umidade tropicais, mas é capaz de tolerar o frio. Multiplica-se facilmente por sementes, que não necessitam tratamento especial para germinar.


fonte: Jardineiro.net

11 de out. de 2012

Nossa casa de Livia Garcia-Roza



Todos nós precisamos encontrar nossa "casa". Um lugar no afeto do outro.

Artesanato


"O artesanato não quer durar milênios nem está possuído da pressa de morrer prontamente. Transcorre com os dias, flui conosco, se gasta pouco a pouco, não busca a morte ou tampouco a nega, apenas aceita esse destino. Entre o tempo sem tempo do museu e o tempo acelerado da tecnologia, o artesanato tem o ritmo do tempo humano. É um objeto útil que também é belo; um objeto que dura, mas que um dia, porém se acaba e resigna-se a isto; um objeto que não é único como uma obra de arte e pode ser substituído por outro objeto parecido, mas não idêntico. O artesanato nos ensina a morrer, e fazendo isto, nos ensina a viver".
PAZ, Octavio. O Uso e a Contemplação
http://revistaraiz.uol.com.br/portal/index.php?option=com_content&task=view&id=102&Itemid=116

Evelyn De Morgan (30 August 1855 – 2 May 1919) was an English Pre-Raphaelite painter.













10 de out. de 2012

Passeio de Hilda Hilst


(...)
O peito era maior que o céu aberto.
Parávamos. E sabeis
Que o que contenta mais o peito inquieto
É olhar ao redor como quem vê
E silenciar também como quem ama.
(...)

Distanciamento de Livia Garcia Roza


                                                                                                Tarsila do Amaral, Composição, 1930.
Às vezes me distancio para retornar mais próxima


A arte de Perder



A arte de perder não é nenhum mistério;
Tantas coisas contêm em si o acidente
De perdê-las, que perder não é nada sério.

Perca um pouquinho a cada dia. Aceite, austero,
A chave perdida, a hora gasta bestamente.
A arte de perder não é nenhum mistério.

Depois perca mais rápido, com mais critério:
Lugares, nomes, a escala subseqüente
Da viagem não feita. Nada disso é sério.

Perdi o relógio de mamãe. Ah! E nem quero
Lembrar a perda de três casas excelentes.
A arte de perder não é nenhum mistério.

Perdi duas cidades lindas. E um império
Que era meu, dois rios, e mais um continente.
Tenho saudade deles. Mas não é nada sério.

– Mesmo perder você (a voz, o riso etéreo
que eu amo) não muda nada. Pois é evidente
que a arte de perder não chega a ser mistério
por muito que pareça (Escreve!) muito sério. ”


Tradução de Paulo Henriques Britto

9 de out. de 2012

Também este crepúsculo nós perdemos de Pablo Neruda

Também este crepúsculo nós perdemos. Ninguém nos viu hoje à tarde de mãos dadas enquanto a noite azul caía sobre o mundo. Olhei da minha janela a festa do poente nas encostas ao longe. Às vezes como uma moeda acendia-se um pedaço de sol nas minhas mãos. Eu recordava-te com a alma apertada por essa tristeza que tu me conheces. Onde estavas então? Entre que gente? Dizendo que palavras? Porque vem até mim todo o amor de repente quando me sinto triste, e te sinto tão longe? . (Tradução de Fernando Assis Pacheco)

Hemos perdido aun este crepúsculo. Nadie nos vió esta tarde com las manos unidas mientras la noche azul caía sobre el mundo. He visto desde mi ventana la fiesta del poniente en los cerros lejanos. A veces como una moneda se encendía un pedazo de sol, entre mis manos. Yo te recordaba con el alma apretada de esa tristeza que tú me conoces. Entoces dónde estabas? Entre qué gentes? Diciendo qué palabras? Por qué se me vendrá todo el amor de golpe cuando me siento triste, y te siento lejana?

"PABLO NERUDA, in VINTE POEMAS DE AMOR E UMA CANÇÃO DESESPERADA (D. Quixote, 2007)

8 de out. de 2012

Tornar-se diferente de Michel Foucault


"Não considero necessário saber exatamente quem sou. O que constitui o interesse principal da vida e do trabalho é que eles lhe permitem tornar-se diferente do que você era no início. Se, ao começar a escrever um livro, você soubesse o que irá dizer no final, acredita que teria coragem de escrevê-lo? O que vale para a escrita e a relação amorosa vale também para a vida. Só vale a pena na medida em que se ignora como terminará".
 In: Verdade, poder e si mesmo

De volta para o passado de Contardo Calligaris


Adoraria que fosse possível viajar no tempo e voltar para épocas anteriores de minha vida.
Ingenuamente, imagino que, em vários momentos do passado, eu teria me beneficiado de algo que sei só agora. Quem melhor do que eu aos 50 ou 60 anos para aconselhar uma versão mais jovem de mim, a de dez, 20, 30 anos atrás?
Hoje, enfim, meço as consequências de algumas escolhas antigas. Sei (ou imagino) que teria sido melhor me separar logo daquela pessoa e nunca me afastar de outra, que era insubstituível e que eu perdi; sei (ou imagino) que poderia ter evitado riscos inúteis e me exposto a outros dos quais fugi; sei (ou imagino) que deveria ter insistido quando desisti e desistido quando insisti. E, para quem pode viajar no tempo, nunca é tarde para salvar Inês.
Voltar ao passado para nos dar conselhos em momentos cruciais parece ser uma maneira racional de endireitar nossa vida, a única que leve em conta as consequências confirmadas de nossos atos.
Mas um ditado italiano ("del senno di poi son piene le fosse" --da sabedoria do depois as valas estão cheias) sugere que esse saber das consequências, além de chegar atrasado, talvez seja inútil.
Concordo: as escolhas da gente são quase sempre as melhores, se não as únicas possíveis na hora em que tivemos que decidir. E os remorsos são quase sempre fajutos: quando reavaliamos e censuramos nossas decisões passadas à luz de suas consequências presentes, estamos esquecendo as razões que nos fizeram decidir naquele momento e naquelas circunstâncias. Mesmo assim, a vontade é grande de voltar atrás e alterar o passado.
Quando era mais jovem, depois de qualquer crise (embate, briga, acidente), revivia mil vezes o que acabava de acontecer, corrigindo ou aperfeiçoando imaginariamente minha reação (o que eu "deveria ter feito").
Hoje, mais velho, quando volto a lugares do passado, sempre os encontro assombrados, como se minha história ainda estivesse por lá, suspensa, na espera de uma solução alternativa à que se realizou na época.
Me dei conta disso quando, pela primeira vez, morreu alguém que tinha sido minha companheira. O luto foi violento, igual ao que seria se minha história com ela nunca tivesse acabado.
Como podia ser? Se passaram tantos anos sem eu pensar nela... Por que esta dor agora? Era como se, com a morte dela, acabassem as chances de dar àquela história um desfecho outro, como se só com a morte dela o passado se tornasse realmente passado.
Seja como for, por ser um fã das viagens no tempo, não podia perder "Looper - Assassinos do Futuro", de Rian Johnson, que estreou na sexta passada. No filme, daqui a 30 anos, as viagens no tempo serão possíveis e proibidas. A máfia instalará seus assassinos, os "loopers", no passado (ou seja, numa época mais permissiva); e para esses assassinos ela despachará as pessoas que deseja eliminar, para que sejam mortas.
Um dia, um assassino descobre que o condenado, que ele recebe do futuro, é a versão mais velha dele mesmo. Será que o jovem "looper" vai querer poupar sua própria vida? Não é óbvio: afinal, matar a nós mesmos daqui a 30 anos é parecido com fumar e comer toucinho.
Esse cara, 30 anos mais velho do que eu, será que ainda sou eu? E será que alguém aos 20 ou aos 30 escutaria o que sua versão de 60 anos tentasse lhe dizer? Ou será que, para mim aos 20, eu seria hoje apenas mais um velho chato qualquer? Questão antiga: fora nossa identidade jurídica, que permanece igual, será que, ao longo da vida, somos a mesma pessoa?
Nesse fim de semana, no festival de cinema do Rio, assisti a "Camille Outra Vez", de Noémie Lvovsky, título original "Camille Redouble" (não sei quando o filme será distribuído no Brasil, mas conto com o cinema Reserva Cultural, que, em São Paulo, para quem aprecia cinema francês, é uma dádiva).
No filme, Eric e Camille ficaram juntos a vida toda. Mas Eric acaba de deixar Camille por uma mulher mais jovem (e talvez menos beberrona). No Réveillon, Camille desmaia e acorda aos 16 anos. Ela reencontra seus pais, as amigas da escola e, sobretudo, Eric, pois é bem naquela época que eles se encontraram.
Claro, Camille quer mudar o curso de sua vida (não namorar Eric) para evitar a dor futura da separação. Mas o fato é que muitos amores são como a vida: eles valem a dor que seu desfecho triste nos dará eventualmente um dia.
Fonte: FSP 04/10/2012

7 de out. de 2012

Raisa Christina (nasceu em Quixadá, 1987, vive em Fortaleza)


pequeno armário onde ficam imagens e santos
about lovers and sad guitars

 a praia rasa 

até o pedaço mais deserto da rua 

 cavidade entre rochedos

 como o fotógrafo esteve expondo todo o seu negativo

 construção que avança para o mar

  círculo que se forma para certas canções

 depois da crisma, não tive mais notícias de josé

 dias pares para olhar os meninos e dias ímpares para esconderijos

 mas há de haver um momento em que isso tudo muda

 não se permite a previsão do tempo

 oxidação do ferro

 sobre a onda um pássaro

 trégua


 adesão ao personagem
  lado esquerdo de uma embarcação

varanda

 braço navegável de um rio

 de um perigo, de um ferimento, de um abandono, de uma reviravolta

  falou baixo para que as coisas nunca mais aterrizassem

 o que os matemáticos chamam de catástrofe

 para que eu tenha tempo de desaparecer antes de você notar

código de erro de estruturas

http://corposonoro.tumblr.com/archive