22 de fev. de 2014

Criança lendo de Walter Benjamim

                                                                                                                                                                                                  Bruegel


Da biblioteca da escola recebe-se um livro. Nas classes inferiores é feita uma distribuição. Só uma vez e outra ousa-se um desejo. Muitas vezes vêem-se livros cobiçosamente desejados chegar a outras mãos. Por fim, recebia-se o seu. Por uma semana estava-se inteiramente entregue ao enredo do texto, que envolvia branda e secretamente, densa e incessantemente como flocos de neve. Dentro dele se entrava com confiança sem limites. Quietude do livro que seduzia mais e mais! Cujo conteúdo nem era tão importante. Pois a leitura caía ainda no tempo em que se inventavam histórias para si próprio na cama. Seus caminhos semi-encobertos de neve a criança rastreia. Ao ler, ela mantém as orelhas tapadas; seu livro fica sobre a mesa alta demais e uma das mãos fica sempre pousada sobre a folha. Para ela as aventuras do herói são legíveis ainda no redemoinho das letras como figura e mensagem no rodopiar dos flocos. Sua respiração está no ar dos acontecimentos e todas as figuras lhe sopram. Ela está misturada entre as personagens muito mais de perto do que o adulto. É indizivelmente concernida pelo acontecer e pelas palavras trocadas e, quando se levanta, está totalmente coberta pela neve do lido.
BENJAMIN, W. Obras Escolhidas II - Rua de mão única. p.37.

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